A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de permitir a desistência de devoluções de concessões deve alcançar Estados e municípios. O acórdão julgado e publicado pelo tribunal na quarta-feira (02) tem impacto inicial sobre ativos federais, mas o entendimento pode ser usado nos outros âmbitos.

O processo teve origem com uma consulta feita pelos ministérios de Portos e Aeroportos e Transportes ao TCU. A principal questão girava em torno da concessão do Galeão, pois a Changi, responsável pela operação, sinalizou que pode voltar atrás na decisão de devolver a concessão.

A decisão autoriza a desistência desde que sejam observados 15 critérios. “Será preciso percorrer um longo trabalho de justificativa e ajuste contratual para enquadrar as desistências nas condicionantes fixadas”, destaca o advogado Fernando Gallacci, sócio da área de Infraestrutura, Regulatório e Negócios Governamentais da Souza Okawa.

Entre ativos federais, dados públicos indicam haver cinco concessões de rodovias, duas de aeroportos e uma de ferrovia em processo de devolução em que esse mecanismo pode vir a ser usado. A estimativa do governo é de que a medida tem potencial de destravar R$ 85 bilhões.

Decisão deve atrair desistências

Especialistas ouvidos dizem que é provável que novas concessionárias comecem a manifestar interesse em manter ativos. Para o advogado Eduardo Schiefler, a decisão traz segurança jurídica sobre o que deve ser feito para as desistências de relicitações, o que é um atrativo para animar concessionários a seguirem esse caminho.

“Por ser um entendimento inédito e amplo, é provável que o posicionamento cause no futuro um efeito cascata nas demais esferas de governo. Assim, deve ser utilizado como diretriz em empreendimentos estaduais e municipais que estejam nesta mesma condição”, considera Schiefler.

O advogado Carlos Magno de Abreu Neiva, da Porto Lauand Advogados, chama a atenção para as várias possíveis excepcionalidades de cada caso. “Um eventual alto nível de inadimplência da concessionária antes da manifestação pela devolução, ou um desequilíbrio do contrato podem dificultar muito a negociação”, exemplifica.

Em detalhe

A consulta ao TCU foi dividida em duas perguntas. A primeira é se haveria alguma objeção do TCU ao entendimento de que o caráter irrevogável da relicitação se restringe à iniciativa da empresa responsável pela concessão.

O segundo questionamento do governo é quais seriam as balizas técnicas que o gestor deve apontar na sua motivação para o encerramento do processo de licitação em caso da iniciativa ser do poder concedente.

Pela decisão do órgão fiscalizador, o processo de relicitação pode ser encerrado caso haja consenso entre governo e concessionária.

Entre as 15 condicionantes está o não descumprimento dos termos de ajustamento e a formalização de interesse em permanecer sendo prestador, respeitando o critério de continuidade da prestação do serviço público.

O Executivo terá de avaliar o interesse público em desistir da relicitação a partir de critérios como a garantia de viabilidade econômico-financeira e operacional da continuidade do serviço e a partir da elaboração de estudos técnicos que demonstrem a vantajosidade da operação.

Ainda de acordo com as condicionantes fixadas, o TCU irá acompanhar todos os processos de renegociação contratual, de modo semelhante ao que acompanha os processos de relicitação. Logo, ainda será preciso esperar a atuação da Corte para destravar os projetos hoje em discussão.