Debate na ONU sobre desarmamento nuclear desperta poucas ilusões

Debate na ONU sobre desarmamento nuclear desperta poucas ilusões

O desarmamento nuclear está no centro das discussões na ONU nesta sexta-feira (2), com poucas esperanças de progresso nesta questão espinhosa, em que o diálogo parece estagnado entre Estados Unidos e Rússia.

Ambos os países detêm 90% das armas nucleares do mundo.

“Hoje, o risco do uso de armas nucleares – intencionalmente, por acidente, ou por erro de cálculo – é maior do que nunca, desde os dias mais sombrios da Guerra Fria”, alerta a ONU, que lista “a deterioração das relações entre os Estados nucleares, o papel crescente das armas nucleares nas estratégias de segurança nacional, os avanços tecnológicos e a erosão do regime de não proliferação”.

“Infelizmente, o progresso para a eliminação total das armas nucleares está paralisado e corre o risco de ser comprometido”, alertou o secretário-geral da ONU, António Guterres, em discurso antes do início da reunião.

A erosão da arquitetura de controle de armas nucleares, em um contexto de crescentes tensões internacionais, deixa pouco espaço para otimismo.

O Tratado sobre Forças Nucleares de Alcance Intermediário de 1987 – firmado entre Washington e Moscou e que resultou na destruição de cerca de 2.700 mísseis com um alcance entre 500 e 5.500 km – está morto, de fato, desde 2019, para grande desgosto dos europeus.

Desde então, o tratado russo-americano “New Start” concluído em 2010, que expira no início de 2021, é considerado o último acordo nuclear ainda em vigor, limitando os arsenais de ambos os países abaixo de seus picos da Guerra Fria. No entanto, sua extensão permanece altamente incerta.

– Fim do “New Start”? –

“Se o New Start acabar, pela primeira vez não haverá mais perspectiva de redução dos arsenais nucleares”, diz Emmanuelle Maître, especialista em não proliferação nuclear, dissuasão e desarmamento da Fundação para Pesquisa Estratégica.

“Não podemos estar muito otimistas com esse tratado em sua configuração atual”, explica a pesquisadora.

“O governo Trump impôs muitas condições à sua prorrogação, em particular pedindo a participação da China nas discussões”, o que Pequim descartou, acrescentou.

“Quanto à Rússia, não é certo que esteja tão aberta ao diálogo e à negociação como diz”, afirma Maître.

O diálogo bilateral entre as duas principais potências nucleares parece ter estagnado e os defensores do desarmamento apostam no sucesso multilateral de 2017, quando 122 países adotaram um tratado nas Nações Unidas que proíbe as armas nucleares.

O Tratado de Proibição de Armas Nucleares (TPNW) já foi ratificado por 46 Estados, aproximando-se das 50 ratificações necessárias para sua entrada em vigor.

O texto ainda está consideravelmente enfraquecido pela ausência entre os signatários das nove potências nucleares mundiais: Estados Unidos, Rússia, China, França, Reino Unido, Índia, Paquistão, Israel e Coreia do Norte.

“Os atores e países que apoiam o TPNW estão convencidos de que o tratado pode mudar pouco a pouco as mentalidades, no longo prazo, estigmatizando a posse de armas nucleares”, diz Maître.

Por iniciativa da Campanha Internacional pela Abolição das Armas Nucleares (ICAN), cerca de 50 ex-líderes de 20 países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), além do Japão e da Coreia do Sul, publicaram uma carta aberta no final de setembro. Nela, pediam aos seus respectivos países que ratifiquem este tratado, que “pode encerrar décadas de paralisia no campo do desarmamento”.