As recentes mortes de Pelé e Roberto Dinamite, ídolos do futebol brasileiro, emocionaram torcedores de Santos, Vasco e de diversos clubes do País. O velório do Rei do Futebol recebeu mais de 200 mil pessoas na última semana. Além desse fenômeno, a morte dos jogadores levanta uma questão: como os ídolos dos clubes, em especial os brasileiros, são homenageados, em vida ou de forma póstuma?

O prefeito do Rio de Janeiro, por exemplo, anunciou que a avenida em frente ao Maracanã passaria a se chamar Rei Pelé, enquanto o trecho em frente ao estádio São Januário, do Vasco, recebeu o nome de Avenida Roberto Dinamite. Eduardo Paes, que é torcedor do Vasco, também esteve presente no velório de Dinamite, realizado nesta semana.

No esporte, há algumas formas de os clubes homenagearem seus ídolos. Estátuas, bustos, jogos de despedida e aposentar os números das camisas são alguns dos gestos mais comuns escolhidos para as cerimônias.

No caso de Pelé, o Santos já havia anunciado, antes mesmo de sua morte, que o escudo da equipe passaria a carregar, ao lado das estrelas em alusão ao bicampeonato mundial, uma coroa, em referência ao título de Rei do Futebol. Andrés Rueda, presidente do clube, também cogitou aposentar a camisa 10 do ídolo, mas desistiu, respeitando um desejo do próprio jogador. “É melhor deixar o número 10 (para ser usado) porque assim o pessoal nunca vai esquecer”, disse Pelé, em entrevista ao canal Desimpedidos, em 2017.

Pelé também contou, ainda em vida, com uma estátua em sua homenagem em Três Corações, sua cidade natal. O monumento fica localizado na rodovia Fernão Dias e se tornou ponto turístico na região do Sul de Minas Gerais. Assim como ele, Roberto Dinamite também recebeu a homenagem em vida em São Januário, no último ano.

“Quero agradecer a torcida do Vasco em todo o Brasil, a diretoria, aos meus companheiros, adversários. O Vasco foi e continua sendo importante na minha vida. Estou feliz e emocionado. O meu desejo é ver novamente o Vasco forte, campeão”, afirmou Dinamite. O evento contou com a presença de Zico, ídolo do Flamengo e rival dentro de campo.

ESTÁTUAS DE ÍDOLOS DO FUTEBOL

A construção de estátuas, em nome dos ídolos, é o gesto mais comum por parte dos clubes brasileiros. Zico, na Gávea, no Ninho do Urubu e no Maracanã; Zagallo, em frente ao Engenhão; Ademir da Guia, na sede do Palmeiras; Bellini, no Maracanã; e Renato Gaúcho, na Arena do Grêmio, são alguns dos ídolos brasileiros que receberam as homenagens ainda em vida.

Mário Bittencourt, presidente do Fluminense, chegou a cogitar a construção de um busto em homenagem ao atacante Fred após sua aposentadoria, em junho de 2022. Ele afirmou que o ideal seria uma ação colaborativa dos torcedores, assim como ocorreu para a construção das estátuas do ex-goleiro Carlos Castilho e dos ex-atacantes Washington e Assis.

Sócrates, do Corinthians, Garrincha, pelo Botafogo, e Fernandão, capitão do Internacional no Mundial de 2005, também tiveram estátuas construídas em suas homenagens, mas somente após a morte. O alvinegro paulista conta no Parque São Jorge, sua sede do clube social em São Paulo, com inúmeros bustos de outros ídolos da equipe, como Basílio, Ronaldo Giovanelli, Neco, entre outros.

Os torcedores que compareceram ao velório do Pelé também puderam presenciar a homenagem que o Santos já havia construído na Vila Belmiro. Em 2017, o clube inaugurou, em frente ao portão 6 do estádio, a escultura erguida em homenagem a José Ely de Miranda, o Zito, bicampeão mundial pelo Santos, em 1962 e 1963, e pela seleção brasileira, em 1958 e 1962.

Romário, atacante que teve passagens por Fluminense, Flamengo e Vasco, recebeu uma homenagem do cruzmaltino no início dos anos 2000. Inaugurada em 2007 pelo então presidente Eurico Miranda, a estátua, localizada em São Januário, homenageia o atleta pela marca do milésimo gol da carreira.

Em 2012, o ídolo se envolveu em polêmicas com seu ex-clube e Roberto Dinamite, então presidente, após seu filho Romarinho ter sido dispensado pela categoria de base do Vasco. Dinamite admitiu, inclusive, a possibilidade de retirar sua estátua de São Januário.

“Não é uma decisão do Roberto (retirar a estátua), mas vou pensar quanto a isso. O clube é maior do que tudo isso. Ele (Vasco) tem de ser respeitado. Os atletas que passaram por ali devem ser respeitados. Vou agir dentro daquilo que eu achar que é o respeito da instituição. Vocês vão estar sabendo o que eu vou fazer”, garantiu Roberto Dinamite em entrevista à Rádio Globo à época.

JOGOS DE DESPEDIDA

Outra ação comum dos clubes brasileiros é de realizar um jogo de despedida para seus principais jogadores. Rogério Ceni, em 2015, reuniu os campeões mundiais com o São Paulo em um amistoso no Morumbi para encerrar sua carreira. Marcos, ídolo do Palmeiras, já havia recebido a mesma homenagem de seu clube em 2012, em partida realizada no Pacaembu.

Léo, lateral do Santos durante os títulos brasileiros de 2002 e 2004 e da Copa Libertadores de 2011, também se despediu dos gramados com homenagem do clube em que iniciou sua carreira.

Em 2011, após decidir pela aposentadoria aos 34 anos, Ronaldo fez um discurso emocionado no CT do Corinthians e teve uma despedida do futebol profissional pela seleção brasileira. Em amistoso contra a Romênia, no Pacaembu, o Fenômeno jogou apenas 15 minutos – entre os 30 e 45 da primeira etapa – e teve três chances claras para marcar seu último gol, sem sucesso.

PELÉ

Pelé foi um dos atletas que mais teve “despedidas” ao longo de sua carreira: pelo Santos, seleção brasileira e New York Cosmos, clube que defendeu durante sua passagem pelos Estados Unidos. Em 1971, mais precisamente no dia 18 de julho, o Rei entrou em campo pela última vez em amistoso contra a Iugoslávia, diante de um Maracanã lotado, com 138.575 pessoas.

Pelo Santos, Pelé fez seu último jogo na Vila Belmiro em 1974, contra a Ponte Preta, no dia 2 de outubro daquele ano. O jogador saiu de campo antes do apito final, substituído aos 21 minutos do primeiro tempo e dando a volta olímpica emocionado, com os olhos cheios de lágrimas. Além disso, sua despedida da Vila criou uma lenda: ao final da partida, o Rei teria deixado um objeto guardado em seu armário no vestiário e o trancou com chave. Desde então, nunca mais teria sido aberto e o Santos decidiu que não revelaria o que há em seu interior mesmo após sua morte.

Sua despedida como jogador profissional, após desistir da aposentadoria para jogar pelo New York Cosmos, aconteceu em 1977. Mais de 75 mil espectadores acompanharam a vitória sobre o Santos por 2 a 1, em amistoso realizado no Giants Stadium, em Nova York.

CAMISAS APOSENTADAS

O ato de aposentar os números das camisas é algo comum nas franquias dos esportes americanos, como a NBA, NFL, MLB e NHL. Os irmãos Manning, Eli e Peyton, quarterbacks, tiveram seus números 10 e 18, respectivamente, aposentados pelo New York Giants e Indianapolis Colts. Michael Jordan, que conquistou seis títulos da NBA pelo Chicago Bulls, tem seu número 23 aposentado na franquia.

No futebol, essa prática não é tão comum, em especial por conta da mística que alguns números têm. A “camisa 10 de Pelé”, por exemplo, foi um pedido do próprio Rei para que não fosse aposentada.

Em 2012, o Palmeiras chegou a aposentar o número 12 de seu elenco, em alusão ao goleiro Marcos. A prática permaneceu em vigor até 2017, quando Borja assumiu o número deixado pelo ídolo. Atualmente, o lateral-direito Mayke joga com a camisa em questão.

O mesmo aconteceu com Romário, que teve sua camisa 11 aposentada pelo Vasco em 2002. Por conta de desentendimentos, o atleta deixou o clube no mesmo, mas retornou a São Januário em 2005. Neste período, o número ficou inutilizado por qualquer jogador do elenco cruzmaltino

Diferentemente de Palmeiras e Vasco, o Avaí aposentou a camisa 88, em homenagem a Cléber Santana, falecido no acidente do voo da Chapecoense em 2016. A ação permanece em vigor até hoje – o clube tem atletas com os números 87 e 89 em seu plantel.

O mesmo acontece com o São Paulo. Rogério Ceni, um dos maiores ídolos do clube, utilizou por boa parte de sua carreira o número 01 em seu uniforme. Desde que se aposentou, a camisa é aposentada pelo tricolor paulista.

NOMES DE ESTÁDIOS

Outra forma de tornar eterno o legado dos ídolos é nomeando estádios e centros de treinamentos em sua homenagem. Um destes casos é o do estádio Mané Garrincha, reconstruído para a Copa do Mundo de 2014, que leva o nome do camisa 7 do Botafogo e da seleção brasileira. Em Maceió, o estádio Rei Pelé é o único no País que homenageia o Rei do Futebol.

No Rio, a casa do Botafogo homenageia um ídolo do clube. O Engenhão, oficialmente chamado e estádio Nilton Santos, homenageia o lateral que marcou três décadas com a camisa da estrela solitária. Bicampeão mundial com a seleção brasileira em 1958 e 1962, recebeu o apelido de “Enciclopédia do Futebol” ao longo de sua carreira, devido a seus conhecimentos no esporte.

Em Santos, a Vila Belmiro leva o nome de outro jogador e treinador que marcou época no clube. Urbano Caldeira, zagueiro entre os anos 1913 e 1918, é considerado como um dos patronos do clube, fundado em 1912. Em 1917, chegou ao cargo de vice-presidente do clube e apresentou o terreno para a construção do estádio do clube.

Após seu falecimento, em 1933, a diretoria santista decidiu que a Vila Belmiro fosse nomeada em homenagem a um dos primeiros ídolos do clube.