Em 2019, no Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça), o presidente Jair Bolsonaro, ainda desconhecido no planeta, utilizou sua estreia internacional para prometer um “novo Brasil”, com estabilidade econômica, equilíbrio fiscal e privatizações. Falou ainda em compatibilidade entre a preservação do meio ambiente e da biodiversidade com o necessário desenvolvimento econômico. Usou apenas seis dos 30 minutos que lhe foram dados – começou ali a desconfiança dos demais líderes sobre sua capacidade de liderar uma das maiores economias do mundo. Agora, em seu último ano de governo, e sem nada para mostrar, ele é visto por outros líderes dos países mais desenvolvidos como uma ameaça à democracia, ao meio ambiente e aos direitos humanos. Insignificante, Bolsonaro nem sequer participou do encontro, cujo foco foi a guerra na Ucrânia e suas consequências globais na falta de alimentos e na crise gerada pela alta no preço dos combustíveis, o que vem resultando no aumento da inflação em vários países – inclusive no Brasil.

Em seu lugar, o capitão mandou a Davos o ministro Paulo Guedes, que em momento algum mostrou o protagonismo que o Brasil sempre teve em outros fóruns mundiais. Assim como seu chefe, pouca gente no mundo o leva a sério. Afinal, no início do governo prometeu R$ 1 trilhão em privatizações de estatais, mas agora topa tudo para vender ao menos uma dessas empresas antes do apagar das luzes do governo, a Eletrobrás. Enganou-se quem imaginou ver alguma sobriedade no ministro ou mesmo algum constrangimento, depois dos sucessivos fracassos da política econômica brasileira. Num cenário sombrio com risco de recessão e retrocessos econômicos, Guedes demonstrou otimismo e prometeu aos espectadores do seminário um pouco crível crescimento de mais de 2% para este ano.

“Com a ausência do presidente nas reuniões mais importantes, o Brasil perdeu espaço, não relevância” Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos

Não fosse pelo agronegócio, que ainda é relevante no cenário internacional, o Brasil teria passado à margem do encontro. Isso se mantém mesmo com a habitual falta de comprometimento de Bolsonaro. De acordo com um estudo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o agronegócio do Brasil alimenta cerca de 800 milhões de pessoas no planeta, o equivalente a 10% da população mundial, e esse potencial é o que mantém o País em destaque na economia mundial, que assiste à redução das safras e ao aumento desregrado da inflação mundial. “O Brasil perdeu espaço, não relevância”, explicou o ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Rubens Barbosa. “Além de deixar de comparecer a Davos, Bolsonaro, que já não foi a outras várias reuniões internacionais, agora ameaçou não ir à Cúpula das Américas, confirmando presença na última hora. Com a ausência do presidente nas reuniões mais importantes, o Brasil perde, porque a autoridade que vai no lugar dele não tem o mesmo peso do presidente”.

OVACIONADO Zelensky pediu ajuda do mundo aos ucranianos: “Espero que cada um se pergunte ‘o que posso fazer pela Ucrânia hoje?’” (Crédito:Markus Schreiber)

Além de não se fazer presente nos fóruns internacionais e da perda de interlocução com as principais lideranças globais, há ainda uma dissonância entre o que o presidente diz e a posição do Itamaraty. Em 2019, em Davos, Bolsonaro prometeu “compatibilização entre a preservação do meio ambiente e da biodiversidade com o necessário desenvolvimento econômico”, mas a promessa se perdeu em meio à fumaça das queimadas que revelou seu desprezo pelas questões ambientais. Agora, o Itamaraty tenta reinserir o Brasil nesse debate. No caso da guerra na Ucrânia, Bolsonaro se solidarizou com a Rússia, o que significa dizer que ele apoia, por linhas tortas, a invasão da Ucrânia, embora na ONU o Brasil tenha votado contra as ações agressivas da Rússia. O que o presidente fala, portanto, já não é mais levado em consideração pelos outros países.

Mas se o Brasil não tem um rosto para mostrar ao mundo, a Ucrânia tem. O Fórum Econômico Mundial de Davos voltou a ser realizado após dois anos de interrupção em decorrência da pandemia de Covid-19, com foco nas consequências da guerra na Ucrânia e nos temores de uma desaceleração do crescimento global. O presidente russo, Vladimir Putin, foi excluído do evento por causa da invasão à Ucrânia. O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, sabe como poucos aproveitar os espaços, e não foi diferente em Davos. Ele discursou por quase 30 minutos e pediu mais sanções contra a Rússia e envio de mais armas para seu país. Defendeu especificamente o embargo ao petróleo russo e o bloqueio de todos os bancos russos, sugerindo o aumento da pressão dos participantes do fórum sobre governos e empresas de seus países para que adotem sanções contra os russos para tentar evitar o acirramento do conflito, que já dura três meses. “Sou grato ao mundo. Não percam esse sentimento de unidade. Espero que cada um de vocês consiga acordar no dia seguinte se perguntando ‘o que posso fazer pela Ucrânia hoje?’”. Zelensky foi ovacionado por dois minutos por uma plateia lotada. Essa é a diferença de um líder que luta pelo seu país e por outros que se escondem debaixo de sua incompetência.