Daparte encerra 2024 com novo show e músicos refletem sobre papel do rock no Brasil

Banda do filho de Samuel Rosa, ex-Skank, fala sobre como o dinheiro pode mudar a indústria musical

Rafaela Urbanin
Integrantes da banda Daparte Foto: Rafaela Urbanin

Após se consolidar no estilo lírico com o lançamento do álbum “Baterias de Emergência”, a banda Daparte encerrou 2024 com um grande projeto de shows, levando suas canções para mais perto dos fãs.

Comemorando a nova fase, a banda mineira formada pelos músicos Juliano Rosa – que é filho de Samuel Rosa (ex-Skank), João Ferreira, Daniel Crase, Túlio Lima e Bernardo Cipriano, levou para o palco arranjos vocais ricos. O projeto mais recente, inclusive, foi inteiramente escrito e produzido pela banda e representa uma revolução sonora em seu catálogo.

Em entrevista ao site IstoÉ Gente, os integrantes do quinteto falaram sobre a nova fase da banda e refletiram sobre o papel atual do rock no Brasil.

“Esse é um disco que a gente já imaginou para o palco desde antes dele existir. Então, ver ele se materializar agora nos ensaios e, em breve, no ao vivo, acho que é a coisa que mais está nos deixando ansiosos”, contou João Ferreira.

“As mensagens sobre o disco têm sido superlegais também, e a confiança que a gente está criando em cima dele só aumenta. Acho que poder juntar as músicas novas com as já conhecidas da galera vai resultar em um show muito suado e muito contundente”, completa o artista.

Outra novidade que colaborou para as mudanças da banda em 2024 foi produzir música à distância. Isso porque João se mudou para São Paulo, fazendo com que todos tivessem que se adaptar à nova rotina de gravações.

“A banda continua morando em Belo Horizonte e a gente foi desenvolvendo essas formas de conseguir trabalhar e fazer música à distância, produzindo coisa em casa e usando da tecnologia para transitar de lá para cá e de cá para lá. Então essa foi uma das ferramentas que a gente achou para poder driblar à distância”, explicou João.

Daparte encerra 2024 com novo show e músicos refletem sobre papel do rock no Brasil

Integrantes da banda Daparte em ensaio fotográfico para lançamento de novo disco

“Acho que esse foi o primeiro passo que começou a dar uma nova cara para esse nosso novo trabalho, que é um trabalho que tem sons mais experimentais, sons eletrônicos, de efeitos, de batidas, de sonoridade de baixo, teclado. E na medida desse processo foram surgindo novas ideias, a gente foi fazendo músicas novas”, destacou Juliano, que junto dos amigos entendeu a necessidade de mudar a forma de levar música aos fãs.

“Quisemos falar mais sobre as nossas vidas também, ter um diálogo com o público um pouco menos romântico, falando menos de romances e mais das nossas próprias vidas, mais do que aflige a gente. Têm músicas que falam um pouco sobre ansiedade, tem músicas que falam um pouco sobre tédio, algumas também te levam para um lado um pouco mais feliz, assim, de falar também de amor, de falar de dança, de falar de sexo. E também de falar da noite, de horas que a gente também se sente mais em um momento de libertação da nossa alma”, completou.

Ao serem questionados sobre o ônus de produzir música no Brasil nos dias de hoje, os músicos apontaram uma desvalorização da cultura local.

“O Brasil é um país que valoriza pouco a cultura que produz. É um país que reduz muitas coisas. Tem tanta gente fazendo tanto tipo de música diferente, tantos estilos, tantas histórias sendo contadas, e a gente, às vezes, só foca em um tipo de música que aparece. Se pegarmos a parcela de estilos que é tocada na rádio, por exemplo, é bem menor do que as que são produzidas nesse país”, afirmou João.

“E não só isso também, a quantidade de eventos culturais e a dificuldade que é você ser um músico no Brasil. Qualquer artista no Brasil sofre para conseguir ganhar uma grana e viver dessa arte, se manter através disso e manter esse sonho possível, além de tudo”, lamentou.

“O Brasil precisa da cultura para se manter um povo. Para a gente querer ser brasileiro, a gente precisa da nossa cultura cada vez mais renovada. A gente precisa se reconhecer no que é produzido aqui” – declarou João.

“Acho que muita gente não gosta mais de se sentir brasileiro hoje, porque não vê no país as coisas que estão sendo feitas. Fica ou olhando para fora ou olhando só para o que é massificado. Não nada contra o que é massificado, mas a pluralidade de pessoas que existe no nosso Brasil também podia se encontrar com a pluralidade de arte que é feita aqui. Não ficar tentando botar dentro de uma garrafa um negócio que era para caber em uma piscina, sabe?”, justificou o roqueiro.

Juliano Rosa, por sua vez, criticou a forma como a música é divulgada no Brasil atualmente. Segundo ele, o país lida com o rock como algo que já existiu, no passado, e não como um estilo que avança ao longo dos anos.

“A gente vive uma época difícil, nós do pop rock. Se a gente olhar para o passado do país, a gente vê que as bandas que faziam isso nos anos 1980 e 1990 tinham um sucesso legal. É claro que a gente fica querendo ter uma MTV [emissora de TV musical extinta no Brasil] para divulgar melhor o nosso som. A gente queria ter revistas e jornais com críticos que hoje não existem mais”, disparou ele, comparando o sucesso da ex-banda de seu pai ao sucesso que a Departe e tantas outras fazem hoje.

“Principalmente na minha casa, da minha família que já viveu essa época gloriosa da música brasileira, fica um papo de que o passado foi a época de ouro da música. Acho que hoje tem muita coisa boa no Brasil acontecendo também”, defendeu ele, atribuindo as mudanças históricas da música ao capitalismo destinado a um único estilo musical: o sertanejo.

“Acho que não só o público, mas os meios de comunicação também, a mídia e onde está o dinheiro hoje [transformam o jeito de consumir música]. Eu vejo que o mundo do sertanejo dominou a indústria musical. Isso é uma coisa que tem sido pauta direto. O sertanejo tirou muita gente de espaços de um monte de gênero que vinha de outros cantos, de outras formas. Eu não sei se é culpa deles também ou não [risos], mas é um fator que me intriga. Já vi em outras épocas essa coisa mais equilibrada, de poder ter mais festivais de rock, de axé, de samba, de rap, de outros gêneros musicais também”, enfatizou.

Daparte encerra 2024 com novo show e músicos refletem sobre papel do rock no Brasil

Banda Daparte