Os brasileiros sentirão no bolso, já a partir de maio, os efeitos da seca do último verão no Sudeste e Centro-Oeste. As contas de energia elétrica subirão com a entrada em vigor da Fase 1 da bandeira vermelha. Em junho, é possível que a Aneel avance para a Fase 2, gerando outro aumento. Empresários do setor alertam que a situação dos reservatórios é “crítica”. A culpa, evidentemente, não é de São Pedro. O País tem um modelo energético defasado. A isso se somou uma conjunção de fatores negativos: o baixo nível dos reservatórios, os tributos em excesso e os subsídios que incidem sobre as contas, além dos efeitos da pandemia. O resultado recai sobre o consumidor brasileiro, que paga um dos preços mais caros do mundo. Apenas o acionamento das usinas termoelétricas custará R$ 2 bilhões por mês. É mais um peso nas costas do cidadão e do setor produtivo.

“As chuvas no último verão foram de apenas 60% de uma média histórica para a estação” João Sanches, CEO da Trinity (Crédito:Mariana Pekin)

O modelo, além de tudo, não é transparente. “A conta de energia elétrica já vem com uma série de subsídios: o consumidor financia a agricultura, o carvão de Santa Catarina, o diesel da Amazônia”, diz Paulo Pedrosa, presidente-executivo da Abrace. Para ele, o estresse hídrico provocado pela seca de 2020/21 contribuiu para piorar a situação. Mas o executivo destaca a falta de modernização do setor. Um projeto de lei nesse sentido está parado há anos no Senado. Além do custo adicional da geração termoelétrica, o consumidor deverá pagar mais caro pela energia importada da Argentina e pela chamada “Conta Covid”: são os subsídios que o governo federal pagará em compensação às transmissoras e distribuidoras por causa da pandemia, que provocou redução no consumo e inadimplência entre consumidores. Um estudo da consultoria Trinity indica que a bandeira vermelha acrescentará R$ 6,75 a uma conta de luz de uma família brasileira média, em maio. Em junho, a conta pode subir R$ 10,11.

Escassez

A situação é fortemente agravada pela escassez de chuvas. O último período chuvoso, de dezembro de 2020 a março último, foi o de menor volume de chuvas em uma década no Sudeste e no Centro-Oeste, que geram mais de 60% da energia elétrica do País. Em 11 de maio, esses reservatórios estavam com 33,7% da capacidade, nível considerado muito ruim. Normalmente, as represas entram em maio com essa marca acima de 50%, satisfatória para atravessarem o período seco até outubro. O racionamento só acontece se a água cair a menos de 15% nos reservatórios, o que por enquanto é afastado por todos.

Com isso, os operadores se viram forçados a acionar as termoelétricas movidas a gás natural. Daí outro problema se somou à cadeia de preços. Apenas em 1º de maio, o preço do gás natural subiu 39%. Com a demanda em alta e a oferta em baixa e cara, o desfecho é o aumento nas contas. Esta é a perspectiva também para 2022. Uma notícia ruim para a economia, já penalizada pela inflação acima da meta. O IPCA, considerado a inflação oficial, acumula em 12 meses uma alta de 6,76%, maior nível em quase quatro anos e meio. Está mais de três pontos percentuais acima do previsto (3,75%), e se distancia do teto (5,25%). É um péssimo sinal. As termelétricas foram acrescentadas ao sistema elétrico após o apagão de 2001, uma providência que agora se mostra crucial. Mas outro problema permanece crônico no País: a falta de planejamento e o descaso com o consumidor.