10/08/2020 - 19:09
Como pode um pintor produzir centenas de quadros, muitos deles sobre o mesmo tema e todos sensacionais? Claude Monet era assim, surpreendente em todas pinceladas. Ele nasceu em Paris em 1840 e começou sua carreira fazendo caricaturas. Incentivado por Eugène Boudin, teve contato com a produção ao ar livre. Copiou muitos quadros famosos, como era costume na época, para treinar técnicas de pintura, mas detestou o estilo tradicional, também conhecido como acadêmico. Em 1862, criou o Impressionismo, movimento que retrata o efeito das luzes de uma maneira única, com rápidas pinceladas, de diferentes tons. A iniciativa de Monet teve apoio de dois pintores amigos, Camille Pissarro e Gustave Courbet, além de conquistar depois uma infinidade de seguidores.
A trajetória artística de Monet é incrível. Sempre surpreendeu com novas ideias, cores e mix de tons. Em tempos de quarentena, que muitos buscam se aproximar da natureza, seus quadros são perfeitos para resgatar uma imensa paz interior.
Nascer do Sol – Em 1872, Monet pintou “Impressão – Nascer do sol”. A obra é repleta de tons claros e escuros, além de muitas pinceladas soltas e sobrepostas para mostrar uma paisagem de Havre. A sobreposição de cores originais, cruas e sem misturas, acabou se tornando precursora do movimento impressionista. Mas a obra foi um fracasso, quando exibida pela primeira vez em 1874. A crítica do jornal Le Charivari usou a expressão “impressionista” de forma irônica e pejorativa, mas Monet e outros artistas incorporaram o termo em obras que estavam em produção. Para nossa sorte, o estilo não foi abandonado por eles, que deram atenção aos espectadores mais liberais, apoiadores de pinturas disruptivas e dispostos a romper com as regras seguidas por outros artistas daqueles tempos (neo-classicismo, realismo e romantismo). Demorou, mas o Impressionismo causou uma profunda revolução social, impactando também a música e a literatura.
Os artistas do movimento acreditavam que a “impressão” era uma experiência importante a ser valorizada. O “ver” tinha um sentido mais amplo para eles, no qual a representação do que se via estava no centro das obras, com cenas pintadas sob o ponto de vista da observação do próprio pintor. O retrato de objetos e de paisagens surge a partir de contrastes ou de negligências de cores, com pinceladas que criam um jogo de luzes e sombras na tela.
Fugindo para interior – Em 1883, Monet fez algo comum nos tempos de hoje. Mudou-se para o interior. Foi para uma Giverny, uma cidadezinha francesa muito charmosa, localizada na Normandia. O lago de sua propriedade, a ponte japonesa, as plantas aquáticas Nenúfares (em francês: Nymphéas) e o jardim de flores inspirou mais de 250 pinturas a óleo, produzidas durante décadas. O local foi transformado na Fundação Monet e está aberto para visitação. Hoje, as obras produzidas nesse período estão em coleções particulares e nos mais importantes museus do mundo. As telas de maior dimensão estão no Musée de L’Orangerie, um dos museus mais minimalistas e impressionantes de Paris. O local abriga uma exposição permanente de Monet com cerca de 200 metros quadrados e com oito telas que chegam a até 17 metros de comprimento. A sensação é que as quatro estações do ano podem ser vistas juntas, bastando um piscar de olhos.
Paciência – Ninguém pode dizer que Monet não tinha paciência. O artista trocou correspondências por um ano com Alice Hoschédé e, após a morte de seu marido (o magnata da arte Ernest Hoschedé), casou-se com ela. Na década após o seu casamento, pacientemente produziu trinta telas retratando a Catedral de Rouen (noroeste da França), em diferentes dias e horários, explorando na plenitude sua paleta de cores para mostrar o sol, a névoa, o amanhecer e o entardecer. Ele dizia que diariamente sempre se surpreendia com algo novo e que ainda não tinha conseguido ver. Antes de iniciar o conjunto de obras, estudou a construção e os efeitos da luz sobre a igreja. Sem dúvida, as pinturas da catedral instigam para uma nova forma de olhar a vida, de sentir a energia do dia e notar a evolução da natureza a cada novo dia. Gerações de artistas estudaram essa série e milhões de pessoas mudaram suas concepções sobre a vida após verem as obras.
Sentindo a natureza – Monet dizia que a pintura deveria mostrar o reflexo da luz em um determinado momento, sempre lembrando que as cores da natureza mudam todos os dias, conforme a incidência do sol. Seus quadros são como fotos veiculadas em mídias sociais, com o uso diferentes filtros e cores, fazendo com que cada resultado seja completamente diferente dos anteriores. Ele mostrava paisagens e objetos sem fazer contornos, com sombras luminosas e coloridas, gerando uma impressão visual muito impactante. O preto não existia nessas pinturas, enquanto um amarelo próximo a um violeta criava um efeito mais real do que um claro-escuro muito utilizado pelos pintores acadêmicos da época. Ele não misturava tons. Usava cores puras e conseguia diferentes tonalidades com pequenas pinceladas e sobreposição.
Olhar para seus quadros é como sentir a natureza na plenitude, sendo que cada detalhe faz a diferença. Essa conexão permitiu que continuasse pintando mesmo depois de ter catarata no final de sua vida. A jornada de pintura ao ar livre, com excesso de sol, fez com que sua vista apresentasse problemas e as operações na época não eram tão fáceis e seguras como as de hoje em dia. Mesmo com doença e com uma cirurgia com os recursos da época, Monet não parou de pintar, mas nota-se esse período pelo uso de cores mais fortes como o vermelho. Morreu vítima de um câncer de pulmão. Agradeço todos os dias pela alegria de despertar olhando sempre para uma reprodução de um de seus quadros. Desejo que suas obras preencham a vida de todos, nesse período desafiador de COVID-19 no qual vivemos.
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