Acaba de ser nomeado como curador de uma das mais importantes mostras de arte do mundo. O brasileiro Adriano Pedrosa vai comandar a Bienal de Veneza.

De fato, Pedrosa vem desenvolvendo um trabalho primordial na curadoria do Museu de Arte de São Paulo.

Vale frisar que, na qualidade de admirador da arte e paulistano da gema, sou assíduo frequentador de exposições no Brasil e no mundo.

Um dos fatores que mais me encantam no Masp é sua arquitetura e forma expositiva disruptiva.

A caixa de concreto suspensa, brutalista, com paredes em vidro ladeando a Avenida Paulista por si só; já é um desbunde.

Para deixá-las livres, Lina Bo concebeu cavaletes também em concreto e vidro, deixando as fachadas do Museu Livre e valorizando obras que flutuam em meio ao espaço.

Cavaletes em concreto e vidro fazem obras flutuar em meio ao espaço do Masp
Cavaletes em concreto e vidro fazem obras flutuar em meio ao espaço do Masp

É uma viagem visitar o Masp; e seu conceito expositivo. Adoro ver o “verso “das obras, o chassi que tem registrado toda a sua história e exposições da qual fez parte.

Esse conceito havia sido desconsiderado pela curadoria anterior. E aí Adriano Pedrosa já mostrou a que veio; quando nomeado Curador Visual do Masp, em 2016, resgatando a conexão entre o partido arquitetônico e o expositivo.

Há diversas formas de pensar uma curadoria. Por muitas vezes observamos a ordem Artista e Cronologia.

Adriano Pedrosa vem mostrando curadoria ímpar, que abrange uma perspectiva muito maior que a exposição de arte de respectivo artista.

Primeiramente através do resgate de obras históricas pertencentes ao acervo do Masp

Como foi o caso da mostra de Degas. O rico acervo de 76 telas foi novamente exposto ao grande público, contextualizando-o, no entanto, através de rica explanação sobre quem eram as famosas bailarinas.

Como é o caso como a de Marie van Goethem, filha de sapateiro e lavadeira, e que dançava no Museu Opera, onde Degas a conheceu.

Ou ainda a interessante retrospectiva de Volpi, na qual pude observar todo processo do artista registrando casas coloniais, seus telhados até chegar nas ‘famosas” composições de bandeirinhas.

Adriano Pedrosa traz ainda à tona um papel fundamental da curadoria de Arte a inserção de minorias que fazem parte de nossa cultura brasileira.

Foi assim na incrível exposição de Luiz Zerbini, artista convidado para desenvolver telas inéditas para uma exposição cujo tema era a revisão de cenas históricas que eram conhecidas por seu registro com viés ideológico.

Cenas como a Guerra de Canudos, o Garimpo Ilegal e o Massacre de Haximu foram reinterpretadas de forma artística e atual.

Exposição no Masp
Exposição no Masp (Crédito:Fotos Pedro Franco)

Ao mesmo tempo o artista indígena Joseca Yanomami tinha registrado desenhos que representavam o quotidiano de seu mágico (e sofrido) território; e ainda a exposição do jovem artista Dalton Paula (1982) que fazendo um paralelo a tradição ocidental, no qual as elites tinham o seu retrato como forma de registro. Suas obras em contraponto davam voz resgatando e dando cara a pessoas negras e indígenas, as quais se conhecem as histórias, mas não tiveram o privilégio de ter registrado a sua imagem.

Resgates necessários, exacerbando uma necessária reflexão sobre o passado que remonta ao presente brasileiro.

No atual momento em que muitas vezes, em feiras comerciais a arte é apresentada como puro entretenimento e discurso vazio o trabalho ímpar de uma curadoria se faz fundamental.

Não por acaso a arte é considerada política pública em países desenvolvidos.

Como ocorrido em meados dos anos 80 na França ou nos dias atuais da Coréia do Sul.

Não por acaso, tais países representam transformações notórias inclusive como potência econômica mundial.

“La Biennale di Venezia” é uma das mais conceituadas mostras de arte do mundo. Ocorre continuamente desde 1895, e Pedrosa é o primeiro curador do hemisfério Sul a ter a honraria de ser curador do evento.

Abaixo insiro algumas linhas da justificativa do Comitê da Fundação para efetivação do convite:

“O olhar para a arte contemporânea, não para fornecer um catálogo do existente, mas para dar forma às contradições, diálogos e parentescos sem os quais a arte permaneceria um enclave desprovido de seiva vital.”

Vale realçar que em tempos nos quais temos uma overdose de imagens inseridas nos meios digitais e no qual vivemos num verdadeiro Fast Food imagético é de vital importância que boas mãos nos conduzam sobre a verdadeira valia e sentido da arte; tal qual um bom maestro ressignifica suas músicas e tira o melhor de sua orquestra.

Nos dias atuais, fortes discussões ocorrem no mundo da arte. Há poucos meses o americano Jason Allen, um designer de jogos, venceu o concurso de Belas Artes do Colorado State Fair; na categoria Digital Arts, porém pós tornar-se vencedor, declarou que a mesma foi gerada por um simples e acessível programa disponível online, no qual a IA cria imagens a partir de um texto.

Outro caso recente foi a obra do artista urbano Banksy (aquele que ninguém jamais viu pessoalmente). O inquieto artista ao ver sua Tela “A menina com balão “ser arrematada em um leilão da  Southeby`s por 1,5 milhões de liras, ativou remotamente um dispositivo que fragmentou a tela.

O nobre leitor percebe a complexidade de tal entendimento.

Se faz necessário novos olhares que nos conduzam para o entendimento sobre a Arte de forma mais holística, humanística e transformadora.

Três vivas para Adriano Pedrosa, o novo curador del “La Biennale di Arte di Venezia” 2024.