Caída bem no meio de uma região de mata, uma cruz de madeira com cerca de três metros de altura. O objeto inicialmente parece não ter nada demais, mas uma olhada mais criteriosa vai perceber inscrições nazistas marcadas ao longo do artefato. A imagem foi registrada por um turista às margens do Rio Jari, no Sul do Amapá. As informações são do UOL.

A estrutura conhecida esconde um plano da Alemanha Nazista na Amazônia Brasileira e está em local que foi um cemitério nos anos 1930.

“Fomos conhecer as cachoeiras e paramos no caminho nesse cemitério. A cruz aparece deteriorada pelo tempo. Acredita-se que ela tenha apodrecido após as cheias recentes do Rio Jari, que inundou aquele espaço, que não parece tão abandonado. É um local afastado e por isso não tem manutenção periódica, mas a comunidade limpa de vez em quando”, relatou ao UOL o funcionário público que registrou a imagem. Ele preferiu não se identificar.

Na cruz está escrita a frase em alemão “Joseph Greiner morreu aqui de febre em 2 de janeiro de 1936 a serviço da pesquisa alemã”.

Mas a dúvida que surge é como um alemão nazista foi parar em região de mata do Amapá?

A resposta revelada por pesquisadores é que a homenagem remete à comitiva nazista no Amapá chamada de “Expedição Alemã Amazônia Jari”. Até o presente momento, a justificativa da viagem não é conhecida.

A Expedição

Não é segredo que Adolf Hitler tinha objetivos ambiciosos de expandir o domínio alemão. No entanto, a viagem de 17 meses entre 1935 e 1937, entre o Amapá e a Guiana Francesa, não deixou informações sobre a comitiva nazista, que tinha a autorização do ditador para percorrer a região.

A expedição tinha quatro alemães, os quais desembarcaram no Brasil com um grande estrutura para época. Além da bagagem, os nazistas traziam suprimentos, equipamentos de filmagem e material para coletas de dados científicos. Ao todo, o aparato alemão tinha 11 toneladas.

Reprodução/Livro Rätsel der Urwaldhölle

“Pela primeira vez, a suástica de um avião alemão será vista sobre a foz do Amazonas”, escreveu na manchete de 14 de outubro de 1935 o jornal “Westfäliche Landeszeitung”, da cidade de Dortmund.

Os enviados foram Otto Schulz-Kampfhenkel (zoólogo e o líder do grupo), Gerd Kahle (piloto de avião) e Gerhard Krause (engenheiro e mecânico). Eles foram recebidos por Joseph Greiner, que residia no Rio de Janeiro. Juntou-se ao quinteto 16 brasileiros. O grupo foi dividido em cinco botes e um hidroavião para explorar a região.

De acordo com o historiador português Lucas Maia Saturnino Alves da Silva, que pesquisou sobre a expedição no mestrado, os alemães tinham “objetivos obscuros e dissimulados”.

“Reunir uma coleção zoológica e etnológica, produzir material cartográfico sobre a região, realizar filmes durante a aventura e testar a empregabilidade do hidroavião em um ambiente fluvial e equatorial. Nada indica a presença de outros objetivos obscuros e dissimulados”, diz em sua dissertação.

Por outro lado, Jean Glüsing, autor de dois livros sobre a expedição, disse que a viagem teve uma motivação científica, além da preocupação de reunir informações para uma possível invasão à Guiana Francesa, território francês, inimigo alemão durante o período. A afirmações foi feita pelo escritor em artigo publicado na revista alemã “Spiegel”.

“Não havia menção [em relatos oficiais] ao ‘Projeto Guiana’ porque era secreto”, afirma em seu artigo.

Intermediário

Com o nome marcado na cruz registrada por turista, Joseph Greiner foi o elo que ajudou os alemães a realizar sua expedição. Morador do Rio de Janeiro, ele viajou com a expedição e teria morrido por volta dos 30 anos vítima de febre amarela.

Encontrada às margens do Rio Jari, a cruz foi feita pelo engenheiro Gerhard Krause, o qual teria encontrado Greiner morto, conforme registro no livro “Rätsel der Urwaldhölle” (Enigmas do inferno da selva), escrito pelo zoólogo Otto Schulz-Kampfhenkel após a expedição.

Lado a lado com os indígenas

Apesar de defender a pureza e exaltar a raça ariana, os alemães preferiu se aliar aos indígenas presentes na região. No entanto, o motivo para isso foi um acidente com o hidroavião trazido pelo nazistas. A aeronave sofreu uma colisão, logo no primeiro voo, e ficou com avarias irrecuperáveis.

Dessa forma, os indígenas salvaram os alemães inclusive de naufrágios no Rio Jari. Schulz-Kampfhenkel registrou em imagens a interação com os nativos da tribo Aparaí.

Reprodução/Livro Rätsel der Urwaldhölle

O que os alemães levaram?

Sem a continuação do financiamento do governo nazista, a expedição terminou em 1937. Porém, os nazistas não foram embora de mãos vazias. Na obra de Schulz-Kampfhenkel, ele afirmou que foram levados aproximadamente 1.500 itens de “interesse zoológico”, com crânios de animais, ossadas, espécies conservadas em álcool e ainda dois grupos de animais vivos.

Reprodução/Livro Rätsel der Urwaldhölle

A questão etnográfica também não ficou de fora. Ao todo, os alemães transportaram 1.200 itens feitos pelos povos indígenas Aparaí, Wayana e Oayana. Conforme o historiador Lucas da Silva, outros 2.700 metros de película de filme e 2.500 fotografias foram registrados durante a expedição.

Reprodução/Livro Rätsel der Urwaldhölle

Todo esse material teve como endereço o Museu de Etnologia e o Museu de História Natural, ambos de Berlim.

“Apesar do abrangente e relevante espólio que deixou, Schulz-Kampfhenkel é hoje uma figura esquecida para os estudos zoológicos: não é mencionado por qualquer texto significativo, nunca descobriu uma nova espécie e nada possui batizado em sua homenagem”, finaliza o historiador Lucas da Silva.