A insatisfação de policiais de São Paulo com o reajuste salarial promovido pelo governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) para o funcionalismo público extrapolou as entidades da categoria e chegou à base do governador no Legislativo.
À IstoÉ, o deputado estadual Delegado Olim (PP) afirmou que a política do mandatário em relação aos oficiais de segurança é do “tipo PSDB“, em alusão ao partido que comandou o estado de 1995 a 2022, à exceção de breves interrupções.
“O governo prometeu que a polícia [paulista] seria a mais bem paga, e não cumpre. Houve um reajuste linear para o funcionalismo público, o que, no caso dos policiais civis e militares, significa um aumento de R$ 240,00 no holerite. Faço parte da base do governador, mas esse valor é ridículo para um estado tão rico”, afirmou.
O deputado federal Delegado Palumbo (MDB-SP), aliado do grupo que inclui Tarcísio e o secretário estadual da Segurança Pública, Guilherme Derrite — responsável pelas tropas do estado –, chamou o reajuste de “merreca”. “Entra governo, sai governo, e continuamos enganados”, disse.
Na mira
O reajuste anunciado pelo Palácio dos Bandeirantes foi de 5% nos vencimentos todos os setores do funcionalismo público estadual, o que inclui as polícias. Em nota, o Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo) classificou o percentual como “insuficiente para recompor a inflação acumulada nos últimos dois anos, em torno de 10%: 4,62%, em 2023, e 4,83%, em 2024”.
O último reajuste efetivo dos agentes ocorreu em 2023, primeiro ano da gestão Tarcísio — de 14% a 24,64% para policiais civis e de 26,0% a 34,2% para militares, provocando críticas e acusação de favorecimento à PM. Para 2025, o governo anunciou um aumento de 6,5% no orçamento da Segurança Pública, mas reduziu a verba para a formação de policiais. A arrecadação paulista em 2024 foi de R$ 275 bilhões, uma alta real de 8,8% em relação ao ano anterior.
Conforme um levantamento do Sindpesp, São Paulo ocupa a 24ª posição na média de remuneração para delegados — com R$ 15.037,99 mensais –, à frente de Minas Gerais, Bahia e Paraíba.
Para Rafael Alcadipani, professor da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas) e pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o governo promove um “sucateamento das duas forças [as polícias civil e militar]“. “Dadas as condições financeiras do estado, o governador e o secretário [Derrite] promovem um investimento pífio diante da urgência dos problemas. O foco na segurança é mais um discurso do que uma prática”, afirmou à IstoÉ.
Em nota, a SSP afirmou ter “compromisso com a valorização policial” e relembrou o “reajuste salarial inédito” de 2023. “A SSP também está comprometida em reduzir o déficit na Polícia Civil e realizou a maior contratação de policiais em 14 anos, com mais de 9,1 mil novos agentes, sendo mais de 3,4 mil para a Polícia Civil, que foram distribuídos pelo estado. A Polícia Civil também está realizando concursos para preencher 3,1 mil vagas”, concluiu a pasta.
Na terça-feira, 6, o governo anunciou um edital para contratar 2,2 mil policiais militares da reserva para cargos administrativos na corporação. “A medida permitirá que os policiais da ativa, que atualmente exercem funções internas nas unidades da PM, possam reforçar o policiamento nas ruas”, disse a Secretaria de Comunicação.

Tarcísio de Freitas ao lado do secretário Guilherme Derrite: os homens à frente das polícias de São Paulo
História antiga
O diálogo entre Polícia Civil e Bandeirantes é pouco amistoso desde que Guilherme Derrite assumiu a SSP, tornando-se o primeiro policial militar a chefiar as forças do estado. Oficial da reserva, o secretário comandou um pelotão da Rota (Rotas Ostensivas Tobias Aguiar) e deixou a tropa de choque por excesso de violência — ele foi investigado por dezesseis homicídios, conforme revelou a revista Piauí.
Além do entendimento de que deu reajustes superiores e poder de investigação à PM, o secretário foi associado à falta de diálogo na discussão para regulamentar a Lei Orgânica das Polícias Civis e criticado pela onda de episódios de violência de autoria dos agentes da corporação — entre janeiro e setembro de 2024, oficiais de segurança do estado mataram 496 pessoas, maior número para o período desde 2020.
Para Guaracy Mingardi, ex-investigador da Polícia Civil e atual pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a corporação tem sido deixada de lado pelo governo estadual. “Está ficando envelhecida, burocratizada, e sofre com a falta de pessoal, recurso e equipamentos — mesmo no Departamento de Homicídios, talvez o mais funcional da Segurança Pública paulista”, disse.
Mesmo sob pressão da oposição e de instituições ligadas aos direitos humanos e à segurança pública, Tarcísio endossou o comandado e decidiu mantê-lo no cargo. Recentemente, Derrite fechou um acordo para trocar o PL pelo PP e ocupar uma das vagas da direita na disputa pelo Senado em 2026 — nas últimas duas eleições, o ex-comandante da Rota foi eleito deputado federal.