O filme “Star Wars: Os Últimos Jedi, que estreia mundialmente em 15/12, pode ser descrito como duas horas e meia de batalhas espaciais combinadas a sessões de lições de ética cristã em cosplay de Buda – ou melhor, de Yoda. O oitavo longa-metragem da série criada por George Lucas, hoje dirigida pelo nerd J. J. Abrams, oferece uma diversão familiar absolutamente inofensiva, como era de se esperar de uma franquia controlada pela Disney. Nesse sentido, o título do filme em português entrega a história. Em inglês, “The Last Jedi” dá a entender que se trata da agonia de Luke Skywalker. (Mark Hamill). Na versão brasileira, o incauto já é informado que são os últimos “jedi” (e não “jedis”, a grafia correta nesta exótica língua chamada de português). Os subtítulos são uma atração Disney: palavrões são limados, ao passo que erros de português abundam, como “há muito tempo atrás (sic), em uma galáxia distante”.

A falta de densidade dramática ou mesmo de reviravoltas dessa continuação deve ser um alívio para o público atual, para o qual até mesmo a ficha técnica da produção configura um spoiler. Na atual cultura do spoiler, o melhor que pode acontecer é nada. E isso o novo filme presenteia  a mancheias. Quando a mocinha vai ser atingida por um golpe de sabre de luz, eis que o amiguinho a salva. Quando os rebeldes estão encurralados, lindos pôneis de cristal indicam a saída para a fuga. Nossos heróis saem ilesos, ainda que desapareçam do mundo físico.

Parece que em 41 anos de “epopeia” nada aconteceu e tudo foi em vão. O Império Intergaláctico continua dominando, os rebeldes seguem perdendo as batalhas e nem mesmo os mortos morreram. Neste novo filme, acontece uma espécie de Juízo Final em que se fazem presentes Princesa Leia (Carrie Fisher), Yoda, Luke Skywalker, Chewbacca e atualizações do app Darth Vader. Senti falta de Obi Wan Kenobi – uma ausência que não chega a preencher uma lacuna.

Chama atenção neste filme é a religião levada a sério, o que não acontecia até então. George Lucas nunca levou a sério as histórias de “Guerra nas Estrelas”, que ele apelidou desde o início de “ópera espacial”. Para criá-la, baseou-se em duas fontes declaradas e uma obscura. As declaradas são os filmes de samurai, em especial “A Fortaleza Escondida” (1958), de Akira Kurosawa, de onde tirou a trama principal – a fuga de uma princesa no campo inimigo na guerra de clãs do Japão do século 16 – e o mecanismo da Jornada do Herói do antropólogo e estudioso de religiões nova-iorquino Joseph Campbell. A obscura é a ópera “Parsifal”, de Richard Wagner, que conta a história de um menino que traz a luz no instante em que ergue a espada sagrada. A trilha de John Williams macaqueia o “festival sacro” de Wagner, com temas cromáticos para os maus e melodias em tom maior para os bons. Com o tempo, porém, aquilo que não passava de um recreio juvenil se transformou em culto, e a galáxia distante de muito tempo atrás tem-se expandido ad nauseam num complexo de filmes, desenhos, quadrinhos, livros e principalmente as miniaturas, disputadíssima no mercado geek. Pior, a “space opera” tem sido assimilada como obra de arte total, talvez pela falta de troca de informações entre gerações.

Em “Os Últimos Jedi”, finalmente evidencia-se o fato de que os jedis formam não uma sociedade secreta, e sim uma verdadeira religião – de cujo gospel Luke se torna o guardião, isolado que está em um fiorde do planeta mais ermo do universo. Ele diz que fugiu para lá “para morrer”, mas essa convicção logo se desfaz quando ele inicia o coaching sagrado para a aspirante a Jedi Rey (Daisy Ridley). O aspecto mais destacado é a atmosfera de abismo místico à Wagner que domina todo o filme. Embora não haja nenhuma cruz, Cristo parece ser o sujeito oculto do filme. Os Jedi são sacerdotes do bem que combatem o mal. Como no cristianismo, eles pregam o triunfo do espírito sobre a matéria, mas é o inverso que sempre acontece.

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