Em 2017, a vitória do centrista Emmanuel Macron na França foi um alívio para os que temiam a onda de extremismo e polarização no mundo. Ele se elegeu um ano depois do Brexit, que prenunciava o fim da União Europeia, e da eleição de Donald Trump, que ameaçava implodir a bicentenária democracia americana. Na época, vencendo o pessimismo generalizado, o francês derrotou com folga a extremista Marine Le Pen, que pregava o fim do bloco europeu.

Cinco anos depois, Macron volta a enfrentar a radical de direita, mas em condições bem mais difíceis. O extremismo no mundo recuou, mas as dificuldades do presidente são maiores. Não refletem apenas a vulnerabilidade de sua gestão. Elas indicam que os riscos à ordem mundial ainda são enormes e latentes. Ex-banqueiro, levemente liberal e mantendo vínculos com a esquerda intelectual, Macron conseguiu tirar a França da decadência econômica e se transformou no principal líder europeu depois da aposentadoria de Angela Merkel. Mas não conseguiu se conectar verdadeiramente com a França profunda, a população do interior que se ressente da estagnação social e culpa a globalização pela decadência e pela perda de valores ancestrais.

Assim como Viktor Orbán se reelegeu na Hungria, Marine Le Pen pode vencer na França. É um aviso da possibilidade de Bolsonaro surpreender no País

Le Pen, por outro lado, amenizou seu discurso radical, tentou jogar para debaixo do tapete o bilionário financiamento que recebeu de Vladimir Putin e tenta se mostrar uma gaulesa autêntica. Faz promessas populistas, diz que haverá mais dinheiro no bolso se o país se isolar e quer enxotar os estrangeiros que ameaçam a cultura local. Com isso, tem chances reais de assumir o poder da nação que forma o núcleo da União Europeia e é um farol para quem defende os direitos humanos, a igualdade e valores civilizatórios.

O uso de slogans de apelo fácil, as mentiras, a fabricação de inimigos e a apresentação de soluções mágicas para problemas complexos, tudo potencializado pelas redes sociais, continuam sendo ferramentas prolíficas para extremistas, apesar da safra de candidatos a autocrata ter diminuído com a derrota de Trump e o fiasco militar de Putin na Ucrânia. Assim como Viktor Orbán se reelegeu na Hungria, a francesa pode colocar uma cunha no coração das democracias ocidentais. É um lembrete de que Bolsonaro pode também surpreender no Brasil. Apesar de seu governo catastrófico, ele pode garantir sua perpetuação com a ardilosa manipulação das instituições e o enfraquecimento das forças políticas de centro.