Ataques recentes perpetrados por imigrantes com problemas psiquiátricos deixaram oito mortos no país. Agora, há debate sobre como identificar possíveis infratores a tempo. Ajuda médica disponível não dá conta da demanda.O periscópio é uma necessidade absoluta para submarinos ou tanques. Com ele, o perigo pode ser reconhecido a tempo. Por isso, não é coincidência que a polícia do estado alemão da Renânia do Norte-Vestfália tenha batizado seu projeto de prevenção de atos graves de violência com o mesmo nome: PeRiskoP, que é também uma abreviação do alemão para "pessoas com potencial de risco".
"Não se trata de pessoas que representam uma ameaça por causa de suas opiniões religiosas, políticas ou ideológicas", ressalta o investigador criminal Marc Pawleta, que trabalha no PeRiskoP. "Trata-se de pessoas que podem ter uma doença psíquica ou ódio a pessoas, e que por isso querem matar ou prejudicar alguém. Em outras palavras, pessoas que poderiam realizar um ato de violência grave e direcionado, como um assassinato em massa ou um atentado."
Após os ataques em Magdeburg e Aschaffenburg, que deixaram um total de oito mortos, a Alemanha discute como tais atos puderam acontecer – e como evitá-los. Em ambos os casos, os suspeitos eram imigrantes com problemas psiquiátricos.
A participação de pessoas com problemas psiquiátricos em crimes como assassinato ou homicídio doloso no país tem aumentado continuamente nos últimos anos. Em 2022, eles respondiam por 16% dos registros.
Cooperação mais estreita com as autoridades
Projetos como o PeRiskoP, que visam identificar criminosos em potencial em um estágio inicial, querem prevenir esse tipo de criminalidade por meio de uma maior cooperação com autoridades de saúde, escolas, hospitais estaduais e prisões. E um catálogo de critérios que a polícia usa para avaliar o risco representado por pessoas com transtornos mentais e possivelmente violentas.
"A chance de evitar crimes como os de Magdeburg e Aschaffenburg seria pelo menos aumentada por projetos como o PeRiskoP. Mas também temos que entender que não pode haver 100% de segurança em um Estado constitucional", frisa Pawleta.
O projeto está em prática há três anos em todas as 47 autoridades policiais distritais da Renânia do Norte-Vestfália. "O que torna o PeRiskoP especial, a meu ver, é o fato de analisarmos o comportamento das pessoas e seu ambiente com ajuda psicológica, para tomarmos as medidas certas. Mas é claro que só podemos usar as informações que temos de fato à disposição."
Ajuda disponível não dá conta da demanda
O policial descreve um caso típico do projeto: um jovem internado em uma instituição psiquiátrica e que ameaçava promover uma matança na sua escola foi estabilizado por meio de medidas psicoterápicas após um intercâmbio com as autoridades de assistência social para jovens, a escola e a clínica.
Para Pawleta, esse episódio mostra que, além de proteger contra atos de violência, o PeRiskoP também protege pessoas com transtornos mentais e evita a estigmatização.
"A polícia não pode ser a única instituição a prevenir delitos, como assassinatos em massa ou atentados, essa é uma tarefa da sociedade como um todo. Na minha opinião, há falta de vagas para terapia em atendimento ambulatorial, especialmente para jovens com problemas de comportamento, mas também para meninas e mulheres que cometeram crimes. Acho que nosso sistema não está bem equipado para atender à demanda real que existe", alerta.
Aumento de transtornos esquizofrênicos
Christian Oberbauer é médico-chefe e diretor do Centro Psiquiátrico de Nordbaden, em Wiesloch. A maior clínica forense do estado de Baden-Württemberg, no sudoeste da Alemanha, atende 370 pacientes internados e 160 em regime ambulatorial. É uma das 78 instalações na Alemanha que atendem infratores com transtornos mentais, deficiências intelectuais ou vícios.
"Os refugiados não são registrados estatisticamente em Wiesloch, mas a proporção de pessoas com histórico de migração aumentou apenas ligeiramente nos últimos anos", diz Oberbauer.
De acordo com uma sondagem, duas em cada três clínicas psiquiátricas que atendem infratores reclamam de superlotação significativa. "Nos últimos cinco anos, desde 2018 e 2019, houve um aumento significativo nas admissões, o que nos colocou diante de desafios consideráveis", afirma Oberbauer.
O médico-chefe afirma que a proporção de pacientes com esquizofrenia, em particular, aumentou acentuadamente, de cerca de 50% para quase 80%.
"Eles geralmente presumem que não têm uma doença porque estão convencidos da realidade de suas ideias delirantes ou alucinações", diz. Ele explica que essas pessoas altamente desconfiadas viviam em seu próprio mundo e acreditavam que estavam sendo observadas ou ouvidas; ouviam vozes, estavam convencidas de que seu parceiro estava possuído pelo demônio, e temiam por suas vidas.
Terapia medicamentosa bem-sucedida
Mas Oberbauer ressalta que as doenças esquizofrênicas geralmente podem ser bem tratadas, mediante psicoterapia e uso dos chamados antipsicóticos, "muito eficazes" em mais de 80% das pessoas afetadas e capazes de prevenir ou ao menos reduzir a ocorrência de novos surtos.
O médico, contudo, faz questão de enfatizar um aspecto: "As pessoas com transtornos mentais, em geral, não cometem mais crimes do que a média da população. No entanto, há um pequeno subgrupo de pessoas com esquizofrenia que têm maior probabilidade de cometer crimes violentos contra outras pessoas, a parcela é de 3% a 5%."
Médico defende mais prevenção
Após o ataque ao mercado de Natal de Magdeburg, o secretário-geral do partido conservador União Democrata Cristã (CDU), Carsten Linnemann, propôs que autores de crimes violentos com problemas mentais sejam registrados na Alemanha – e foi muito criticado por isso.
Oberbauer também não é favorável a essa proposta. Por um lado, por causa do sigilo médico e, por outro, por causa da estigmatização: uma em cada três pessoas sofre de transtornos mentais em algum momento da vida.
Ele acha que deveria haver mais projetos como o PeRiskoP ou conceitos semelhantes aos da Baviera. Lá, o foco está nos chamados ambulatórios de prevenção. "O projeto de prevenção tem como objetivo abordar pessoas gravemente adoecidas que foram identificadas como potenciais candidatos a risco de comportamento agressivo contra outras pessoas e motivá-las a buscar tratamento."
Oberbauer enfatiza: "Precisamos prestar mais atenção ao pequeno número de pacientes que provavelmente desenvolverão comportamento agressivo ou violento, ou que têm maior probabilidade de fazê-lo."