Em plena temporada de férias, enquanto muitas famílias se entregam à magia dos parques temáticos da Disney, na Flórida, é oportuno explorar a crueza do filme Projeto Flórida (2017) – disponível no HBOMax. Dirigido por Sean S. Baker (Tangerina, Red Rocket), esta obra premiada mergulha nas entranhas de uma realidade áspera, a poucos quilômetros do encanto artificial dos parques de diversões.

A trama revela a vida precária de Moonee (Brooklyn Prince), uma criança que encontra efêmera alegria em meio à pobreza extrema, enquanto sua mãe Halley (Bria Vinaite) enfrenta a luta pela sobrevivência em um motel gerenciado por Bobby Hicks (Willem Dafoe). Bobby ocasionalmente sai da sua posição de autoridade, e demonstra complacência à beira da marginalização social. O filme captura a experiência de crianças desfavorecidas que vislumbram os portões da felicidade alheia — mas são mantidas à margem pela desigualdade estrutural.

A desigualdade social é a espinha dorsal da obra, destacando o contraste entre a fantasia da Disney e a dura realidade vivida por essas crianças.

A pobreza não apenas as priva da inocência e da diversão, mas também as coloca em um cenário onde poucos metros separam parques de diversão visitados pela classe média e elite — enquanto as famílias destas crianças enfrentam a falta de oportunidades para escapar da pobreza que as envolve. A película questiona a validade do termo ‘infância’ para aqueles que vivem à margem da sociedade, e não podem aproveitar a pureza dessa fase.

O preconceito arraigado e as diferentes formas de violência que permeiam a vida destas famílias, o descaso das autoridades — especialmente no tratamento dispensado às mulheres que sem alternativas recorrem à prostituição como único meio de subsistência. Isso mostra as falhas da nossa sociedade e o preconceito sistêmico.

O filme também ressalta as dificuldades enfrentadas por muitas mães em situações semelhantes, e lança luz sobre a resiliência necessária para enfrentar tais adversidades — uma dificuldade que independe de fronteiras.

Projeto Flórida transcende a tela, provocando reflexões sobre uma sociedade que permite a coexistência de mundos tão discrepantes – mas que muitos alienados defendem como sendo o “melhor dos mundos” — e questiona o preço que a sociedade está disposta a pagar por ignorar a realidade que persiste além dos portões encantados da fantasia — a falta de empatia por grande parte da sociedade é estarrecedora.

Devemos tentar transformar a proximidade geográfica em proximidade social, proporcionando oportunidades igualitárias para que todas as crianças possam verdadeiramente desfrutar de uma infância plena — independentemente de seu status social. Boas férias!