A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga a gestão do governo brasileiro durante a pandemia pediu, nesta terça-feira (26), a suspensão do acesso do presidente Jair Bolsonaro às suas contas nas redes sociais, após citar novas informações falsas sobre a covid-19.

O pedido, que será enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao procurador-geral, vem depois que o presidente mencionou informações falsas em uma live, ao associar a vacina anticovid à aids. O vídeo foi posteriormente removido do Facebook, Instagram e YouTube.

A plataforma de vídeo também decidiu suspender o canal do Bolsonaro por uma semana.

O texto, apresentado pelo vice-presidente da CPI, o senador Randolfe Rodrigues, pede “a suspensão cautelar” do acesso de Bolsonaro às suas contas “para evitar a destruição de provas”.

Além disso, pede a quebra do “sigilo” para que o Google, dono do YouTube, Facebook e Twitter, forneça informações sobre as contas do presidente em suas redes, onde tem um total de mais de 40 milhões de seguidores.

Bolsonaro, cético em relação às medidas de distanciamento e vacinas anticovid, mencionou na quinta-feira uma informação falsa de que há relatórios oficiais do governo do Reino Unido que “sugerem” que aqueles que foram totalmente vacinados estão desenvolvendo a doença da aids “muito mais rápido que o previsto”.

A informação foi desmentida pelas autoridades britânicas ao serviço de fact-checking da AFP.

– A sombra de Trump –

O texto também pede que o presidente “se retrate em rede nacional, negando a correlação entre vacinação contra o coronavírus e o desenvolvimento da aids”, sob pena de multa de 50 mil reais para cada dia de não cumprimento.

O cientista político Maurício Santoro, professor do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), considera improvável que o pedido prospere.

“Sou cético com relação a isso. Baseado no caso de [Donald] Trump, teríamos que ver algo muito grave, como a invasão do Capitólio, para que alguma coisa assim ocorresse”, declarou à AFP Santoro, em alusão à decisão de Twitter e Facebook de excluir o ex-presidente americano de suas redes após os distúrbios na sede do Congresso em Washington.

Bolsonaro, que é um grande entusiasta das redes sociais, costuma ser acusado de espalhar notícias falsas. Em agosto, o STF decidiu investigá-lo por crimes de “calúnia” e “incitação ao crime”, entre outras causas relacionadas aos seus questionamentos, sem provas, do sistema de voto eletrônico no país.

– ‘Serial killer’ –

O pedido foi aprovado pouco antes de os membros da CPI votarem o relatório resultante de seis meses de investigação sobre a gestão da pandemia, que já custou 605.000 vidas no Brasil.

Nele, recomenda-se indiciar o presidente por uma dezena de crimes, entre eles “crimes contra a humanidade”, favorecendo uma epidemia que resultou em morte e “charlatanismo”.

Analistas presumem que a maioria dos senadores vai endossar o texto apresentado na semana passada pelo relator, senador Renan Calheiros, que também pede o indiciamento de outras 80 pessoas, incluindo vários ministros e ex-ministros, além de três filhos do presidente e duas empresas.

A responsabilidade pela pandemia “é de muita gente, e tem muitos indiciados, mas ela é, principalmente, desse presidente da República, esse ‘serial killer’ que tem compulsão de morte”, Calheiros declarou à imprensa antes da sessão.

Embora o relatório final da CPI possa ter sérias consequências políticas e judiciais, os analistas concordam que seu impacto a curto prazo será “simbólico”, porque Bolsonaro ainda tem apoio suficiente no Congresso para evitar um ‘impeachment’ e eles consideram improvável que o procurador-geral decida imputá-lo.

O relatório, com depoimentos comoventes e revelações chocantes – como o uso de pacientes como “cobaias humanas” para testar drogas ineficazes contra a covid ou o “atraso deliberado na compra de vacinas” -, será enviado a diferentes órgãos que podem continuar investigando e apresentar queixas, como a Procuradoria-Geral da República ou um tribunal internacional.

Desde o início da emergência sanitária, Bolsonaro minimizou a pandemia e defendeu medicamentos ineficazes, como a hidroxicloroquina. Mais de um ano depois de contrair o vírus, ele garante que não será vacinado.

Sua popularidade está no nível mais baixo desde que assumiu o cargo, em grande parte devido à pandemia, mas também à alta da inflação e ao alto desemprego, e as pesquisas de 2022 o mostram atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.