Diferentemente do informado na versão anterior deste texto, 184 mortes foram cometidas por PMs em serviço na cidade de São Paulo em 2024 e outras 92 em 2023. Os números informados anteriormente dizem respeito às ocorrências com envolvimento de policiais de batalhões da capital, mas os casos podem ter ocorrido também em outras cidades, conforme esclarecido posteriormente pela Secretaria da Segurança Pública. Segue texto corrigido:
As mortes cometidas por agentes da Polícia Militar em serviço dobraram no último ano na cidade de São Paulo, segundo os microdados da Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSP). Foram 184 ocorrências de janeiro a dezembro de 2024, ante 82 casos em 2023. Já os óbitos envolvendo a ação de policiais civis da capital paulista diminuíram.
O ano de 2024 foi marcado por casos de violência cometidos por PMs. Em novembro, um estudante de Medicina foi morto em abordagem na Vila Mariana, zona sul da capital. Dias depois, um homem foi arremessado do alto de uma ponte, também na zona sul. O agente envolvido foi preso preventivamente. A vítima, um manobrista, sobreviveu.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que “não compactua com desvios de conduta e pune exemplarmente aqueles que infringem a lei e desobedecem aos protocolos das polícias paulistas”. A gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) acrescentou que, desde 2023, foram presos 465 policiais e outros 310, demitidos ou expulsos (mais informações abaixo).
O aumento da letalidade policial na gestão Tarcísio interrompeu a curva de redução de mortes pela PM que havia sido registrada a partir de 2021, com a adoção das câmeras corporais nos uniformes dos agentes. Em 2022, o total de óbitos do tipo foi o menor da série histórica, iniciada em 2001.
Para especialistas, falta prioridade do governo para o fortalecimento das bodycams. O governador chegou a colocar em xeque a efetividade dos equipamentos, mas depois disse que manteria o programa. Ainda segundo analistas, os casos reforçam a necessidade de preparar melhor as polícias – sobretudo para ocorrências cotidianas, como brigas -, reforçar mecanismos de controle sobre as tropas e investir em armas não letais.
A alta de mortes cometidas por policiais em serviço foi maior na capital paulista, mas também houve crescimento expressivo, de 84,14%, nas ocorrências desse tipo em todo o Estado. Foram 650 notificações no último ano, ante 353 no ano passado.
Além da capital, os casos na Baixada Santista também chamam atenção. Nos dois últimos anos, a região recebeu operações como a Escudo e a Verão após as mortes de dois policiais militares das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota), batalhão de elite da PM.
A região também é alvo de operações frequentes por ser apontada como ponto estratégico para o Primeiro Comando da Capital (PCC) enviar remessas de cocaína para continentes como África e Europa, devido à proximidade com o Porto de Santos, o maior do País.
Moradores e entidades dos Direitos Humanos têm denunciado, porém, atuação irregular de agentes das forças de segurança em alguns casos. E especialistas destacam que letalidade policial maior não necessariamente melhora o combate ao crime organizado.
No fim de novembro, o Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP) tornou réus dois agentes da Rota pela morte de um homem de 36 anos em fevereiro de 2024 em Santos. Conforme a denúncia, eles teriam forjado um confronto e dificultado a captação de imagens pelas câmeras corporais que usavam após matar o roupeiro Allan de Morais Santos.
Em outro caso de repercussão, uma criança de 4 anos morreu ao ser atingida por uma bala perdida durante um confronto, em novembro do ano passado, entre a PM e suspeitos no Morro São Bento, em Santos. Ryan Santos brincava na rua quando foi alvejado por um tiro na barriga. O pai dele havia morrido no início do mesmo ano em outra operação policial.
Conforme dados divulgados na última sexta-feira, 31, só no último trimestre deste ano, foram 176 mortes por intervenção de PMs no Estado. Já os casos envolvendo policiais civis tiveram queda de 12,9%: de 31, em 2023, para 27, no último ano. As ocorrências envolvendo agentes da Polícia Civil com atuação na capital caíram pela metade: de 18 para 9.
A maior preocupação está justamente nos casos envolvendo PMs em serviço. No último dia 20 de novembro, o estudante de Medicina Marco Aurélio Cardenas Acosta, de 22 anos, morreu após ser alvejado na barriga em ocorrência na porta de um hotel na zona sul.
Como mostram imagens de câmeras de segurança, Marco Aurélio deu um tapa no retrovisor de uma viatura da PM parada em um semáforo próximo ao hotel. Os dois policiais que estavam no carro saíram imediatamente do carro e tentaram abordar o jovem na recepção de onde ele estava hospedado. O estudante, então, resistiu à prisão e foi atingido quando estava caído no chão. As câmeras corporais dos agentes captaram o momento.
A sucessão de casos, como vem mostrando o Estadão, tem colocado em xeque a atuação da Polícia Militar sob a gestão Tarcísio de Freitas. Ainda no fim do ano passado, o governador reconheceu que o discurso adotado pelo governo tem influência na atuação de PMs, mas afirmou que não iria demitir o atual secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite.
A pasta da Segurança afirmou, em nota, que, “para reduzir a letalidade policial, a atual gestão investe em formação contínua do efetivo, capacitações práticas e teóricas, e na aquisição de equipamentos de menor potencial ofensivo, como armas de incapacitação neuromuscular”.
“Além disso, comissões realizam a análise das ocorrências para os ajustes dos procedimentos operacionais, sempre que necessário, bem como à orientação da tropa durante as instruções e treinamentos promovidos regularmente nas unidades policiais em todo o Estado”, acrescentou.
Segundo a Secretaria da Segurança Pública, “todas as ocorrências de morte decorrente de intervenção policial são rigorosamente investigadas pelas polícias Civil e Militar, com o acompanhamento das respectivas corregedorias, do Ministério Público e do Poder Judiciário”.