Coreia do Sul profundamente dividida caminha para eleições

Coreia do Sul profundamente dividida caminha para eleições

"CoreiaAbalado pelo impeachment do ex-presidente Yoon Suk Yeol, país escolherá seu próximo líder em junho – polarizado como nunca no consumo de mídia e entre gerações e partidos.A seis semanas da eleição que definirá o novo presidente, em seguida ao traumático afastamento de Yoon Suk Yeol, a sociedade sul-coreana se não mostra sinais de uma eventual união em torno do futuro governo.

Na capital Seul, inúmeros protestos tomaram as ruas, até a decisão de 4 de abril do Tribunal Constitucional que confirmou o impeachment de Yoon por ter decretado brevemente uma lei marcial em dezembro de 2024. As manifestações, tanto contra como a favor do ex-presidente, tiveram que ser separadas por forte presença policial.

Após a remoção de Yoon do cargo e o início de seu julgamento por insurreição, o debate público migrou para quem será o novo presidente. Quatro membros do conservador Partido do Poder Popular, de Yoon, estão competindo pela indicação como candidato. Eles enfrentam um número semelhante de concorrentes de seu rival liberal, o Partido Democrático, embora seu líder, Lee Jae-myung, já tenha se destacado como o principal candidato.

Novas manifestações estão previstas até a eleição de 3 de junho, sendo a expectativa de grande comparecimento dos dois lados do espectro político, profundamente dividido.

Polarização "pior como nunca"

A polarização política da Coreia do Sul é profunda e pode ser atribuída a uma combinação de fatores históricos e institucionais, como décadas de regime autoritário, democratização e mudanças econômicas rápidas e posicionamentos contrastantes em relação à Coreia do Norte, afirma Seong Jae Min, professor de comunicação e estudos de mídia da Pace University, de Nova York.

"Mas atualmente o nível de polarização parece estar pior como nunca. Isso ocorre porque as divisões ideológicas existentes foram exacerbadas dramaticamente desde a declaração da lei marcial."

Embora as ações de Yoon não tenham sido bem recebidas inicialmente entre seus apoiadores conservadores, uma base ativa se uniu em torno da sua figura, com ecossistemas de mídia partidários e lealdades regionais "aumentando essa divisão", explica Min.

E ainda há muitos conservadores linha-dura que apoiam Yoon e podem ser vistos em manifestações do lado de fora do tribunal durante suas audiências, a última das quais na segunda-feira (21/04).

"Acho que isso se deve ao fato de Yoon continuar sendo sua melhor chance de conter a influência 'progressista'", diz Min. "Atualmente, não há uma alternativa clara à direita para unir a força conservadora além de Yoon. Ele agora é como um símbolo, um baluarte conservador contra o que eles percebem como um exagero da esquerda na educação, na mídia, na segurança nacional e em outras questões sociais."

Quanto mais é atacado, mais Yoon vira "um herói" aos olhos dos conservadores de linha-dura, comenta Min. E os grupos que são considerados inimigos dele – estudantes em protesto, sindicatos, feministas e acadêmicos liberais – são exatamente os que muitos conservadores temem ou rejeitam.

Divisão entre esquerda e direita

Lim Eun-jung, professora de estudos internacionais da Universidade Nacional de Kongju, concorda que a nação nunca esteve tão em conflito consigo mesma, com temores econômicos e apreensão pelas ameaças crescentes da Coreia do Norte.

"Parece que o país já está em recessão, e a gente está preocupada com os preços e o alto custo das moradias, particularmente difícil para os jovens, enquanto estamos divididos entre a esquerda e a direita sobre como abordar a situação da Coreia do Norte."

Lim observa que, embora Yoon tenha adotado uma linha dura em relação a Pyongyang e as relações se deteriorado a ponto de os dois lados não se falarem, é provável que um governo de esquerda retome as políticas do presidente Moon Jae-in e procure construir pontes com o país vizinho.

Outro abismo é entre as gerações, aponta Lim: de um lado os mais idosos, com renda e moradia estáveis e tendendo para o conservadorismo político, e do outro as gerações mais jovens "profundamente céticas" sobre o futuro da nação e à procura de mais apoio.

Essas posições seriam acentuadas pelo consumo de mídia: os mais velhos leem jornais e assistem a programas de notícias na televisão, enquanto os mais jovens se orientam pelas redes sociais.

"De certa forma, é semelhante aos EUA. Muita gente é extremamente cética em relação à mídia 'mainstream', não acredita no que lhes dizem, então vai para o YouTube obter notícias."

"Os jovens que são meus alunos não leem nem entendem textos longos. Há toda uma geração que só olha para as mídias sociais e é muito difícil fazê-los ler textos e analisar argumentos."

O professor de comunicação Min concorda: "As mídias sociais se tornaram uma força potente para intensificar as divisões políticas na Coreia. Plataformas como YouTube, KakaoTalk e Facebook hospedam conteúdo com grande carga política que muitas vezes é algoritmicamente adaptado aos preconceitos existentes dos usuários."

"Em particular as comunidades online de direita nas redes sociais criaram câmaras de eco nas quais teorias da conspiração, memes ideológicos e clipes de notícias descontextualizados se tornam virais com pouca verificação de fatos."

O mais idosos e os homens na faixa dos 20 anos, em particular, "geralmente ficam nessas câmaras de eco, só interagindo com quem pensa da mesma forma", reforça Min.

Disputas online vão para o mundo real

A situação piora ainda mais porque o anonimato e a cultura de chamar a atenção a qualquer custo das redes sociais permitem que o público se envolva em discursos extremos e ataques pessoais, que transbordam para disputas no mundo real.

Min não está otimista sobre possibilidade de mudança nesse cenário ou que a divisão política da Coreia do Sul diminua. "A menos que ocorram reformas estruturais e culturais significativas, é provável que a política de confronto persista ou até mesmo se aprofunde. Os incentivos políticos estão desalinhados: esses políticos e partidos são recompensados por mobilizar suas bases, em vez de construir pontes. Eles provavelmente continuarão a fazer isso para obter seus próprios ganhos políticos."

"Mesmo entre os jovens, há muitas divergências em relação a questões sociais, portanto a próxima geração não necessariamente resolverá isso tão cedo", afirma o especialista em meios de comunicação. "Isso faz faz o futuro parecer tenso e dividido – não exatamente 'sombrio', mas certamente instável."