COP30: obras para coleta de esgoto alcançam 3% da população de Belém

Belém
Belém Foto: Divulgação

O governo do Pará anunciou projetos de saneamento que pretendem beneficiar 500 mil pessoas em Belém. Com a proximidade da COP30 (30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), em 2 de novembro, no entanto, a coleta de esgoto foi ampliada para apenas 40 mil pessoas.

No bairro Tapanã, zona norte da cidade, corre a bacia hidrográfica que tem o mesmo nome, e trata-se de um esgoto a céu aberto. O odor é sentido ao longo de quadras. Naquela região, o que vem da COP30 é terra retirada de outras obras. Moradores locais afirmam que pilhas são vendidas ou doadas, a depender do dia, como material para aterro.

Ao jornal “Folha de S.Paulo”, Amanda Quaresma, consultora ambiental que integra o Comitê Gestor do Sistema Estadual sobre Mudanças Climáticas, informou que “o Mata Fome é uma prioridade sempre esquecida , mas uma obra lá seria o legítimo legado da COP30”.

A capital Belém está entre as piores cidade do Brasil em coleta e tratamento de esgoto. Ao anunciar os projetos, o governo do Pará afirmou que, em especial, as pessoas da periferia seriam beneficiadas, mas apenas o equivalente a 3% dessa população foi contemplada.

De acordo com a presidente do Instituto Trata Brasil, Luana Pretto, o termo saneamento básico possui quatro vertentes: acesso à água tratada; coleta e tratamento de esgoto; coleta do lixo e sua destinação adequada e o manejo da água da chuva; dividido em macrodrenagem, que atua no fluxo dos veios d’água; e a microdrenagem, que abarca as tubulações.

O grande número contabilizado pelo governo estadual contabiliza obras de desvio pluvial e urbanização das ruas no entorno do bairro Tapanã, incluindo paisagismo, quadras de esporte, praças, playground e academia ao ar livre, em 13 canais das bacias dos rios Tucunduba, Murutucu, Una e Tamandaré.

Há também grandes intervenções para dissuadir enchentes e organizar o trânsito nessas áreas. A capital Belém se urbanizou aterrando trechos de várzeas e igarapés, e a população sofre com alagamentos recorrentes.

O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) financiou 12 canais, enquanto Itaipu Binacional financia um. O investimento somou R$ 1 bilhão.

Ainda na questão das obras de esgoto, houve uma concessão parcial dos serviços da Cosanpa (Companhia de Saneamento do Pará), que preveem metas de população atendida por esgotos atuais passe de 15,32% para 90% até 2033. Para isso, será preciso incorporar 1 milhão de pessoas à rede de coleta e tratamento de esgoto —um esforço anual que representa o triplo alcançado para a COP30.

Segundo o secretário de Infraestrutura e Logística do estado do Pará, Adler Silveira, as obras de saneamento serão feitas em etapas. Para a conferência, como primeira fase, a proposta foi para desafogar os canais maiores, visto que estão interligados com os menores, e a seleção dos locais exige critérios técnicos.

“Considerando a densidade populacional e o potencial de integração entre os bairros, uma vez que a proposta é melhorar não apenas o saneamento, mas trazer uma reorganização para o escoamento do trânsito, porque conta com novas vias”, acrescentou.

Igarapé São Joaquim

Outro local que merece atenção é o miolo em que ficam os barracos junto ao igarapé São Joaquim. Os emaranhado de vielas fétidas, as casas que misturam alvenaria e madeira foram construídas sobre uma água lamacenta, feita da mistura de restos de várzeas.

Um dos riachos mais contaminados passa pela casa da família de Nilza Nordeste de Souza, de 50 anos. Em maio, oito, incluindo quatro crianças e uma grávida, ficaram cobertas de bolhas com pus. No posto de saúde, o diagnóstico foi escabiose, mais conhecido como sarna, que prolifera em ambientes insalubres.

O que dizem os especialistas

Especialistas locais concordam com o senso popular. “Os maiores projetos da COP30 são reformas de canais degradadas por falta de manutenção, que beneficiam muito mais áreas que já contam com infraestrutura”, afirmou a arquiteta e urbanista Pamplona Ximenes Ponte, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFPA (Universidade Federal do Pará).

Ximenes ressaltou que um dos poucos projetos que incluem tratamento do esgoto é o do canal da Nova Doca. “Ali já tem infraestrutura. No entorno estão bairros como Umarizal, que tem o metrô quadrado mais caro de Belém, e não está longe do Porto Futuro, onde vão ficar os hotéis para receber visitantes da COP”, completou.

O local escolhido gerou polêmica, pois o prédio da elevatória (tipo de atividade que separa fezes e urina) fica colado à Vila da Barca, uma comunidade pobre.

“É isso que sobrou para nós nessa COP30: queremos que a gente fique com o coco dos ricos”, disse Inês Medeiros, professora e líder comunitário.

Com a palavra, o governo do Pará

O secretário de Infraestrutura e Logística do Pará afirmou que o governo estadual atende diferentes segmentos da população. “Para todos esses canais, havia uma demanda por reestruturação do saneamento.”

A respeito da obra na Vila da Barca, ele disse que que as famílias locais não serão prejudicadas. Algo reforçado por Tereza Campello, diretora socioambiental do BNDES. Ela ressaltou que os 12 canais financiados pelo banco em Belém representam um dos maiores investimentos em infraestrutura da história e devem mudar a realidade dos moradores dessas áreas.

“Como diz o nome, são obras de macrodrenagem e urbanização, não de esgoto ou fornecidas de água, e são necessárias para que as pessoas não fiquem mais debaixo d’água”, afirmou.

Sobre a Nova Doca, Itaipu informou por meio de nota que participa da obra como apoiadora financeira, mediante solicitação formal do governo federal.

“A Itaipu atua no acompanhamento da aplicação dos recursos, com foco na transparência e na boa governança, sem posse de gestão sobre os procedimentos públicos”, finalizou.