A situação interna de Israel segue tumultuada, com nova troca de primeiro-ministro e a quinta eleição em quatro anos convocada para 1º de novembro. A improvável coalizão de partidos de esquerda e direita havia garantido Naftail Bennet como primeiro-ministro desde junho de 2021. Ultranacionalista do setor de tecnologia, o milionário se compôs com Yair Lapid, líder da oposição, para interromper 12 anos seguidos de mandato de Benjamin Netanyahu, o Bibi, acusado por muitos crimes de corrupção. Mas Bennet mal chegou a um ano no cargo: no último dia 20, dissolvido o Parlamento, passou o bastão para Lapid, que governará até o pleito. Com a atual coalizão inviabilizada, é Netanyahu que tem boas chances de voltar ao poder. E ele é favorável à expansão das colônias israelenses na Cisjordânia.

DE VOLTA? Benjamin Netanyahu pode assumir o cargo de premiê pela terceira vez, em novembro (Crédito:Yonatan Sindel/Pool )

A instabilidade na política interna permanece, mas o país avança internacionalmente. Relações comerciais e alianças altamente improváveis tomam corpo, a ponto de haver a perspectiva de um acordo de paz oficial com a Arábia Saudita. Certamente seria um marco, com adversários históricos se aliando por interesses econômicos e ainda oficializando a troca de informações sobre segurança para fazer frente a um inimigo comum: o Irã.

Israel teme o desenvolvimento de armas nucleares por parte dos iranianos — que seguem reafirmando o caráter pacífico de seu programa – e a Arábia Saudita mantém disputas regionais acirradas por diferenças religiosas, resumidas na luta pela hegemonia de poder na região e contra a influência iraniana nos confrontos da Síria, Iêmen e Líbano. Mas, destacados os contornos políticos e diplomáticos, negócios são fechados. São empresários israelenses com vistos especiais que entram na Arábia Saudita (as visitas se tornaram possíveis depois de cancelada a proibição por parte dos árabes), principalmente representantes de empresas de tecnologia que viajam à capital Riad, centro econômico do país, ou mesmo a Neom, cidade futurista de meio bilhão de dólares à beira do Mar Vermelho.

“Israel é um aliado em potencial, com muitos interesses que podemos buscar juntos”  Mohammed bin Salman, príncipe herdeiro da Arábia Saudita

Novos laços

Transações milionárias já estão asseguradas, por exemplo, no setor de agricultura no deserto — um deles envolvendo hidrotecnologia israelense e outras tecnologias para o campo, que ajudam os sauditas a alcançar segurança alimentar. Um avião particular seguiu em voo direto de Tel Aviv para Riad em 31 de maio levando empresários judeus americanos. Pelo lado saudita, fundos de investimentos e investidores independentes mostram interesse em Israel, por meio de intermediários (que incluem aliados de Donald Trump), principalmente no campo de segurança e inteligência, importante para israelenses tanto quanto para sauditas, como defesa contra o Irã. Encontros entre interessados dos dois lados também se realizam em Dubai e Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, e em Manama, capital do Bahrein.

As primeiras alianças — secretas pelo menos até 2015 — resultaram nos chamados Acordos de Abrahão, que multiplicaram por cinco as relações comerciais entre Israel, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Bahrein, e que em 2021 chegaram perto de US$ 1 bilhão (R$ 5,4 bilhões). O tratado de paz com os Emirados foi assinado em 2020 (o terceiro na região, depois do Egito em 1979 e da Jordânia em 1994), quando os israelenses aceitaram suspender planos de anexação da Cisjordânia e a Arábia Saudita abriu seu espaço aéreo para voos diretos entre os Emirados e Israel. Seguiram-se outros dois acordos fechados pelos israelenses com Bahrein e Marrocos, mediados pelos EUA, e um com o Sudão, de 2021, a ser finalizado (o Catar abriu canais com os israelenses, parcialmente, ainda em 1996).

Israel é grande aliado de Abdel Fatah al-Sisi, presidente do Egito, que trabalha pelo acordo de paz pan-árabico — é dele a denominação “Acordo do Século” —, encampado pelo príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman, o MbS, de 31 anos, que tenta mudar sua imagem de ditador sanguinário para líder competente, solidário a Israel – e refratário a grupos islâmicos como o Hamas. A resistência é do rei Salman, de 86 anos, contra a paz com Israel até sua retirada de territórios ocupados e aceitação do Estado Palestino. Mas um sinal da oficialização da aliança é a viagem a partir da próxima quarta-feira, 13, do presidente americano Joe Biden à Arábia Saudita — país que ele já chamou de “pária”. Os EUA têm interesse na normalização de relações e trabalham mesmo pela conclusão da transferência das ilhas de Tiran e Sanafir, no Mar Vermelho, para os sauditas. Estes vão aproveitar para colocar na mesa uma pauta “energética”, pedindo mais produção de petróleo.