No mês passado a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) completou 24 anos. Ela foi aprovada no governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Além de definir limites de gasto com pessoal, a LRF determinou a obrigatoriedade de estimativa e compensação da renúncia de receita e da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado. Ou seja, de uma forma simples: aumento de gasto precisa estar acompanhado de fonte de receita.

Justamente com esse argumento, o governo entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir a desoneração da folha de pagamento para empresas e pequenos municípios, conforme lei aprovada pelo Congresso Nacional. Mas o fato é que a LRF só é utilizada quando é conveniente. Citamos, a seguir, alguns exemplos.

O Congresso Nacional aprovou uma lei que define uma fórmula para o reajuste do salário mínimo. A mesma utilizada no governo Dilma Rousseff.

A correção do mínimo se dará pela inflação mais a variação do PIB de dois anos antes. Meritória a ideia de aumentar o valor do salário mínimo. Mas o governo identificou a fonte de receita para fazer isso? Não. O aumento do mínimo de R$ 1.412, em 2024, para R$ 1.502, em 2025, resultará em um impacto de R$ 36 bilhões nas contas públicas. Se houvesse questionamento, qual seria a decisão do STF?

Outro exemplo: o governo Lula também enviou, e o Congresso Nacional aprovou, um projeto de lei que reajusta a faixa de isenção de Imposto de Renda para pessoas físicas. A isenção aumentou de R$ 2.112 para R$ 2.259. O impacto fiscal calculado será de: R$ 3,03 bilhões, em 2024; R$ 3,53 bilhões, em 2025; e R$ 3,77 bilhões, em 2026. Houve identificação da fonte? Não.

A desobediência à LRF, contudo, não é utilizada casuisticamente apenas pelo Executivo. O Legislativo também o faz. A chamada PEC do Quinquênio, apresentada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, prevê o pagamento de uma “parcela compensatória mensal de valorização por tempo de exercício”. O benefício equivale a 5% do subsídio a cada cinco anos de efetivo exercício em atividade jurídica. Impacto: R$ 42 bilhões.

Qual a fonte de receita? Não há. Independentemente do objetivo do gasto, o fato é que temos uma lei que tenta moralizar o gasto público ao estabelecer que, se houver aumento de gastos, é necessário identificar a fonte de recursos. Ponto. No Brasil, porém, não existe apenas a lei “que pega” e a que “não pega”. Existe também a lei que, em determinados momentos, é conveniente e, em outros, não. Simples assim.

Aumento de gastos consistentes, falta de transparência, vinculações exageradas e ausência de coragem política para discutir seriamente a questão das contas públicas nos condenam a um longo período de crescimento econômico medíocre. Fazer concessões de curto prazo traz mais benefícios eleitorais do que pensar no futuro do País.