O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, disse nesta quarta-feira, 22, que 90% da auditoria contratada para abrir a “caixa-preta” do banco em operações com o grupo J&F estavam concluídos quando assumiu a instituição, em julho do ano passado. Como o jornal O Estado de S. Paulo revelou, o banco pagou R$ 48 milhões a um escritório estrangeiro, o Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP, mas a auditoria não apontou nenhuma irregularidade, incluindo evidência de corrupção dos funcionários do banco, nas operações com as empresas JBS, Bertin e Eldorado Celulose, entre 2005 e 2018.

“Não foi esta diretoria que contratou a auditoria. Chegamos em julho no banco e 90% do relatório estava pronto”, afirmou Montezano, em Davos, onde participa do Fórum Econômico Mundial. Ele também disse que é “difícil” julgar a situação em que a então diretoria do banco tomou a decisão, dois anos atrás, ainda no governo do ex-presidente Michel Temer.

O contrato com o escritório Gottlieb Steen & Hamilton foi formalizado em julho de 2015, ainda na primeira gestão do governo Dilma Rousseff, mas o objetivo era genérico: contatar consultoria internacional na área do direito. Em 2018, na gestão Michel Temer, o contrato venceria, mas foi prorrogado por mais 30 meses para abrir a “caixa-preta” do banco.

R$ 48 milhões

“Auditorias são caras mesmo. Dentro desse tipo de escopo não (não chamou atenção), mas é uma grande quantia de dinheiro”, disse o presidente do BNDES sobre o valor desembolsado pelo banco.

Para Montezano, um dos principais problemas é sobre como a população recebeu a informação. “Esta é uma informação relevante que chegou a público. Cabe ao Ministério Público fazer o julgamento, a análise”, disse. “Tenho quase de 20 anos de mercado e pedia para repetirem as explicações, então como a população média vai entender?”, perguntou.

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Até porque, segundo o executivo, a população já havia ouvido que financiamento de jatos não era ilegal, assim como financiamentos para a Odebrecht e a outras empresas que operaram fora do Brasil. “Estávamos satisfeitos com o trabalho que foi feito de explicação em um tema delicado. Agora foi mal interpretado novamente”, lamentou.

Comparação

Montezano avaliou que analogia feita entre o banco e a Petrobras é “perigosa e infeliz”. “Lá, houve provas de crime, pessoas confessaram. O BNDES está na ponta oposta. Nada foi provado contra ninguém”, comparou.

Ele também não quis discorrer muito sobre o pedido do ex-diretor do BNDES, Carlos Thadeu de Freitas, de que a diretoria do Banco fizesse um pedido de desculpas a seus funcionários. “Desculpa por algo que não aconteceu, me parece perigosa essa abordagem.”

Segundo ele, “de forma nenhuma” haverá uma nova auditoria da auditoria. “A nossa função como executivo do banco é trabalhar para que o banco recupere sua reputação, certificar que supervisores tenham acesso à informação e informar a população com informações corretas. Não somos juízes e nem políticos. Nossa abordagem é técnica e executiva para recuperar imagem do banco”, declarou.

A abertura da “caixa-preta” foi uma das missões conferidas pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, a Montezano, que tomou posse em substituição a Joaquim Levy, primeiro nomeado pelo governo para comandar a instituição. Ele se juntou a outros executivos que passaram pelo banco após o fim da gestão Dilma Rousseff e tiveram dificuldades para comprovar irregularidades na concessão dos financiamentos.

No governo Temer, Maria Silvia Bastos Marques evitou o assunto. Paulo Rabello de Castro e Dyogo Oliveira negaram sua existência. “Ou sou um completo idiota ou não existe ‘caixa-preta’ no BNDES”, chegou a dizer Rabello.

Levy falou em “ter clareza sobre operações do passado”, mas não chegou a avançar na busca por operações fraudulentas. A dificuldade foi apontada como um dos motivos para a insatisfação de Bolsonaro com sua gestão – o executivo pediu demissão após o presidente dizer em entrevista que estava “por aqui” com ele.

A “caixa-preta” foi um dos temas dominantes na campanha de Bolsonaro. Para muitos apoiadores do presidente, a sua abertura teria potencial para malfeitos maiores do que os descobertos pela Operação Lava Jato na Petrobras.

Logo após a vitória nas urnas, o presidente eleito se comprometeu a determinar, no início do mandato, “a abertura da ‘caixa-preta’ do BNDES e revelar ao povo brasileiro o que foi feito com seu dinheiro nos últimos anos”.

Na terça-feira, 21, Bolsonaro encerrou uma coletiva de imprensa quando questionado sobre a auditoria que não encontrou nenhuma irregularidade. Ele disse que a “caixa-preta” do BNDES foi aberta ao se revelar as operações que o banco fez para financiar obras no exterior.



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