Por Bernardo Caram

BRASÍLIA (Reuters) -O governo central, composto pelas contas de Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social, registrou em 2023 o segundo pior déficit primário da série histórica iniciada há 26 anos, sob o peso da quitação de precatórios.

No ano passado, o déficit primário chegou a 230,535 bilhões de reais, o que representa um déficit de 2,1% do PIB e marca o retorno das contas federais ao vermelho após um dado positivo pontual de 0,5% do PIB em 2022.

Somente em dezembro, de acordo com os dados divulgados nesta segunda-feira pelo Tesouro, o saldo negativo foi recorde em 116,147 bilhões de reais.

Da série histórica iniciada em 1997 pela pasta, o dado final do ano passado é melhor apenas que o de 2020, quando o governo teve rombo de 940 bilhões de reais em valores corrigidos em meio ao enfrentamento da pandemia de Covid-19.

Os números dizem respeito à diferença entre receitas e despesas do governo, sem contar o gasto com juros da dívida pública.

O dado do ano foi fortemente impactado pela liberação em dezembro de 92 bilhões de reais em precatórios após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir que o teto criado pelo governo do então presidente Jair Bolsonaro para esses pagamentos era inconstitucional, autorizando a quitação do estoque acumulado sem afetar o limite de despesas públicas.

De acordo com o Tesouro, se a regularização das sentenças judiciais não tivesse ocorrido, o resultado de dezembro seria um déficit de 23,8 bilhões de reais, totalizando um saldo negativo de 138,1 bilhões de reais no acumulado do ano, pouco acima de 1% do PIB.

Em entrevista à imprensa, o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, afirmou que o saldo de 2023 “foi satisfatório” em relação aos objetivos traçados, citando grande impacto gerado pelos precatórios e perdas de arrecadação causadas pela queda da inflação.

“São fatores muito relevantes e mesmo assim chegamos muito próximo do resultado que havia sido buscado, do ponto de vista recorrente”, disse.

Ao propor o novo arcabouço para as contas públicas no ano passado, a equipe econômica chegou a afirmar que buscaria um déficit primário de 0,5% do PIB em 2023. O plano mudou diante do atraso na tramitação de medidas arrecadatórias no Congresso, o que levou o Ministério da Fazenda a retomar o plano de buscar um déficit de 1% do PIB no ano.

PERDA DE RECEITA

As despesas totais de 2023 tiveram alta real de 12,5%, a 2,130 trilhões de reais, principalmente motivadas pela regularização de precatórios e o reajuste do programa Bolsa Família.

Já a receita líquida do governo central, que desconta transferências a Estados e municípios, caiu 2,2% em termos reais sobre 2022, a 1,899 trilhão de reais.

No ano passado, houve uma queda de 45% nos ganhos com dividendos na comparação com 2022, um recuo de 41 bilhões de reais, enquanto as receitas com concessões caíram 82%, uma baixa de 40,7 bilhões de reais.

Segundo Ceron, os dados de dividendos e concessões foram impactados pelas receitas extraordinárias de 2022 com a privatização da Eletrobras e leilões de petróleo, ganhos que não se repetiram ano passado.

Apesar das negociações alongadas, o governo conseguiu aprovar uma série de medidas fiscais em 2023, como as taxações de fundos exclusivos, offshore e apostas online, além da limitação de subsídios baseados em incentivos estaduais e da mudança no Conselho Administrativo De Recursos Fiscais (Carf). O Tesouro espera, porém, que os maiores efeitos sejam sentidos a partir deste ano.

“Um processo importante é a recuperação da base de receitas, da base de arrecadação”, afirmou Ceron. “Isso coloca o país em perspectiva muito diferente para 2024.”

(Edição de Camila Moreira e Luana Maria Benedito)