O deputado Ricardo Barros, líder do governo na Câmara, lançou hoje a ideia de uma Assembleia Constituinte. Segundo ele, o Brasil deveria promover um plebiscito, como fez o Chile neste fim de semana, e, se a maioria da população topasse, começariam os trabalhos para redigir uma nova Carta. 

Para dar peso à sua proposta, Barros lançou mão da velha crítica que a Constituição de 1988 tornou o Brasil ingovernável. Ele não se alongou no raciocínio, mas a tese é conhecida: a Constituição é intervencionista demais, em particular no domínio econômico, tirando assim dos governantes a capacidade de reagir às mudanças da história e às contingências da vida. 

Quem articulou esse ponto de vista, ainda no calor da hora, foi o sempre arguto Roberto Campos (1917-2001).  Ele mesmo um senador constituinte, Campos combateu o quanto pôde o que considerava irracional e disfuncional no projeto da Carta. Deixou também  uma penca de artigos impagáveis sobre aquela que chamou de Constituição-Espartilho. Eles estão reunidos no livro “A Constituição Contra o Brasil”. 

Com 32 anos de vida, a Constituição ainda tem mais de 100 artigos que precisam de leis complementares para surtir efeito. Ao mesmo tempo, já recebeu mais de 100 emendas. É incompleta e remendada ao mesmo tempo. Campos tinha razão: boas constituições não são desse jeito. 

Mas isso não significa que a ideia da Assembleia Constituinte deve vingar. Pelo contrário, ela precisa ser abortada a todo custo.

Assembleias Constituintes dão carta branca aos seus participantes para redesenhar todas as instituições de um país. Não é à toa que elas acontecem quando há mudanças profundas de ordem política. Quando uma monarquia se transforma em república.  Quando uma ditadura abre espaço para a democracia. 

Então vamos ver: Ricardo Barros acha que a República Democrática do Brasil deveria ser redesenhada em um dos momentos mais polarizados da sua história, quando um presidente de caráter autoritário como Bolsonaro governa apoiado em radicais de direita, militares e oportunistas do Centrão (como o próprio Barros). Simples assim. 

Nem a pau, Juvenal. 

Se a questão é tirar as amarras da economia e tornar a administração pública mais eficiente, não vem ao caso uma Constituinte. Basta usar as ferramentas de emenda à Constituição já existentes. Basta o governo e o Congresso fazerem seu trabalho, aprovando reformas que há tantos anos estão em debate, como a tributária, a do Estado e a política. 

O Brasil não precisa ser refundado. Muito menos à imagem de Jair Bolsonaro e Ricardo Barros.