A explosão de procedimentos estéticos no País não é surpresa. De acordo com a Sociedade Brasileira de Dermatologia, entre aplicação de botox, preenchimentos, harmonizações faciais, depilação a laser e clareamento dental, a busca aumentou 390% nos últimos anos. A fatia mais crescente abriga os menos cautelosos com cuidados prévios: 80% dos jovens entre 18 e 25 anos realizaram ou sonham fazer processos, contra 40% a partir dos 60 anos.

O descuido dos mais novos, somado à oferta de profissionais desqualificados, gera casos como o do empresário Henrique Chagas, 27 anos, que morreu no início de junho, em São Paulo, durante aplicação de peeling de fenol. Usado no combate a rugas, manchas na pele e cicatrizes, o fenol é uma substância cáustica, corrosiva, de venda controlada, que requer conhecimento de quem aplica. “A demanda explodiu na pandemia”, constata a otorrinolaringologista Ananda Lopes, especialista em estética. “Pessoas que não tinham coragem mergulharam no mundo digital, onde muitos usam filtros para se sentirem bonitos. A vida em casa fez o tempo de recuperação parecer pequeno. Isso criou nova demanda”.

Conheça os riscos de buscar a beleza ideal
Cantor Lucas Lucco fez harmonização facial em 2020, mas detestou o resultado e, no ano seguinte, reverteu “cem por cento” da intervenção. “Me sinto bem melhor agora”, admitiu nas redes sociais (Crédito:Divulgação )

O mercado é aquecido no País. Cerca de 1,5 milhão de cirurgias plásticas são realizadas anualmente, número menor apenas do que o dos EUA. Nos últimos anos, as plásticas, autorizadas apenas para médicos, perderam terreno para procedimentos oferecidos por esteticistas.

Pesquisa feita em 2023 pela Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS), mostra que o espaço delas entre as opções estéticas caiu de 83% para 50%. Apenas médicos podem efetuar práticas estéticas, diagnósticas ou terapêuticas que chegam ao subcutâneo, com injeções, substâncias controladas e cortes.

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(Divulgação)

“Na Europa escondem que realizaram procedimentos estéticos. No Brasil, ter feito um desses tratamentos é orgulho e muito assunto na internet.”
Ananda Lopes, especialista em estética

Qualquer procedimento oferece riscos. “Peeling de fenol é mais arriscado, por ser profundo. Lipoaspiração extensa pode causar embolia, perfuração dos órgãos e irregularidade da pele. E implante de glúteos, infecção e reações adversas ao material. Brazilian Butt Lift, a transferência de gordura do próprio cliente para o glúteo, tem alta taxa de mortalidade por embolia pulmonar e necrose de tecido. Injeções de preenchimento não regulamentadas podem gerar infecção, necrose e cegueira. Tudo isso pode trazer complicações se não for realizado por profissional qualificado”, alerta a esteticista Ana Carolina Ruiz Pedroso, professora da Faculdade Santa Marcelina.

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A influenciadora digital Adriana Muller gastou mais de R$ 1 milhão em procedimentos, mas precisou refazer cirurgia de rinoplastia (Crédito:Divulgação )
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Apesar de ser definida em lei, a divisão de atribuições entre médicos e esteticistas não funciona com rigor na prática. A escolha de profissionais, principalmente entre jovens, costuma se basear em preço e popularidade nas redes sociais. A influenciadora digital Adriana Muller “perdeu as contas” de quantos procedimentos fez desde os 19 anos. Refez alguns. “Gastei mais de R$ 1 milhão. Precisei reparar a rinoplastia. Uma narina tinha ficado maior do que a outra”, conta.

O cantor sertanejo Lucas Lucco fez harmonização facial em 2020, mas detestou o resultado e reverteu “cem por cento” da intervenção no ano seguinte. “Me sinto bem melhor agora”, disse, à época, nas redes sociais.

Permissão a dentistas

Em 2019, dentistas receberam permissão para realizar harmonização facial, aplicação de botox e ácido hialurônico e bichectomia (retirada de gordura das bochechas). Com as aberturas, o número de insucessos cresceu.

Mais da metade das denúncias de irregularidades em saúde feitas na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) envolve estética.

Uma equipe da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu analisou 47 mil ações de preenchimento facial. O total de casos com problema passou de mil. Mais da metade foi feita por pessoa sem formação médica. “Muitos se submetem a profissionais não qualificados pelo preço ou destaque nas redes sociais. Brasileiro é vaidoso, mas não desconfiado”, resume Ananda. “Na Europa escondem que realizaram procedimentos. No Brasil, ter feito é orgulho e assunto para redes sociais”

A busca dos homens por procedimentos estéticos também está em alta. A procura maior envolve procedimentos cirúrgicos, que passaram de 5% para 30% do total nos últimos cinco anos.

Os mais realizados são:
ginecomastia (redução das mamas),
lipoaspiração e rinoplastia (cirurgia do nariz)
e transplante capilar.

“Um em cada quatro pacientes nossos é homem”, revela o cirurgião plástico Helio Ricardo Nogueira Alves. O engenheiro de produção Wálison Silva passou por bichectomia, rinomodelação com ácido hialurônico, botox preventivo e lipo sem corte. “O botox realizo semestralmente e lipo sem corte, anualmente. Sou cauteloso na escolha do profissional”, destaca.

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Wálison Silva, que passou por vários procedimentos, é cauteloso na escolha dos profissionais (Crédito:Milena Cavichi)

Uma armadilha do meio ganhou o nome de “Body Shaming” (vergonha do corpo, em português). A situação acontece principalmente por pressão estética em redes sociais. Quem entra nesse estado sofre não apenas intimidação psicológica, mas privações como frequentar praias, piscinas e praticar esporte. Por tudo isso, todo cuidado é pouco. Primeiro, na escolha do profissional. Depois, com o corpo.