17/05/2021 - 20:36
Uma das maiores injustiças do mundo da arte é chamar Diego Rivera (1886 – 1957) apenas de marido de Frida Kahlo (leia coluna sobre ela). Sua importância para o México e para a arte internacional é tão grande quanto seu nome: Diego Maria de la Concepcion Juan Nepomuceno Estanislao de la Rivera y Barrientos Acosta y Rodríguez.
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Como pintor e muralista mexicano, ganhou destaque com seu trabalho que refletia a vida da classe trabalhadora e dos povos nativos do México. Como é de conhecimento de todos, o MASP, brilhantemente, montou um dos maiores acervos de arte do mundo, mas poucos se dão conta dos tesouros que temos bem aqui, na Avenida Paulista. Uma das obras dessa coleção é “Os Semeadores” (1947), uma pintura que dá a sensação de ter sido criada a partir de uma única pincelada. Para mim, esse quadro resume perfeitamente o que era Rivera: um talentoso artista, corajoso e capaz de fazer o que bem entendesse.
Diego Rivera desde sempre quis ser pintor e todos percebiam ter talento para isso. Com apenas dez anos, ele começou a desenhar e ingressou na Academia de Belas Artes de San Carlos (Cidade do México). Aprendeu pintura tradicional e escultura com professores extremamente conservadores e teve colegas de classe revolucionários como Gerardo Murillo, com quem mais tarde criou o Movimento Mural Mexicano. Em 1907, depois do ensino clássico, ganhou uma bolsa do governo mexicano e teve a oportunidade de viajar para o exterior. Em Madrid (Espanha), estudou com o pintor realista Eduardo Chicharro Aguera na Real Academia de San Fernando. Lá, Rivera criou pinturas como “Cena noturna em Ávila”, uma obra que contém elementos do realismo e do impressionismo. No Museu do Prado, conheceu as obras dos mestres espanhóis El Greco, Francisco Goya e Diego Velázquez. Nesta época, começou a trabalhar num ateliê em Madrid.
Beneficiado pela bolsa de estudos, viajou para a França justamente no período que paradigmas estavam sendo quebrados com pintores como Paul Gaugin, Henri Matisse, Pablo Picasso, artistas que influenciaram seu trabalho. Paris foi eleita uma das cidades de seu coração, onde viveu intermitentemente durante vários anos. É dessa época o retrato realista “Cabeça de uma Mulher Bretã” e a obra “House Over the Bridge”, que evidenciam um foco impressionista no poder transformador da luz.
Seu estilo sofreu uma mudança significativa em direção ao cubismo, que estava vivendo seu apogeu na Europa da época, retratando dimensões múltiplas com uso de formas geométricas, ou com planos sobrepostos. Sob a influência de Pablo Picasso e Paul Cézanne, suas pinturas ficaram mais abstratas. Então, podemos afirmar que ele se envolveu com o cubismo e que depois aderiu ao pós-impressionismo, mas seu estilo permaneceu único, sendo facilmente reconhecido em toda a sua trajetória profissional. O problema de Rivera era que ele tinha uma vida turbulenta e sempre se envolvia em confusão, principalmente quando o assunto era política. Como um marxista declarado, ingressou no Partido Comunista do México e chegou até a hospedar, em sua casa da Cidade do México, o russo Leon Trotsky que estava exilado com sua esposa.
Tornou-se um símbolo contra a cultura do século XX e começou a chamar a atenção de todos com suas pinturas da classe trabalhadora, combinadas com elementos de sua herança mexicana. Foi em uma viagem pela Itália na década de 1920 que ficou maravilhado pelos afrescos renascentistas e começou a dar forma em seu trabalho como muralista, retratando a sociedade mexicana e o passado revolucionário de seu país. Ganhou destaque na Cidade do México, por exemplo, com a obra “Balada da Revolução Proletária” e seus 5.200 metros quadrados.
Com cerca de 30 anos, já tinha conquistado o reconhecimento mundial por seu trabalho, conseguindo a dedicar parte de seu tempo para sindicatos de artistas e grupos comunistas do México. Nessa época, Rivera iniciou a produção de um mural para a Escola Nacional de Agricultura de Chapingo (México), chamado “A Terra Libertada com Forças Naturais Controladas pelo Homem”. Encomendas nos Estados Unidos começaram a ser feitas, exposições foram organizadas e sua fama cresceu em importantes cidades como Nova York e São Francisco, que o receberam de braços abertos junto com seus grandes murais como “A Alegoria da Califórnia”.
Mas a fama trouxe também problemas. Foi contratado para pintar um grande mural no Rockefeller Center, (Nova York) e colocou no centro do painel uma figura de Lenin. Obviamente, recebeu severas críticas da família Rockefeller, que era a contratante da obra e responsável pelo espaço onde seria exibida a obra. Rivera bateu o pé e disse que não iria retirar a imagem e os Rockfellers destruíram o mural. Mais tarde, o painel foi recriado em menor escala, a partir de fotos preliminares da obra americana, e foi instalado no Palácio de Belas Artes da Cidade do México.
Foi casado quatro vezes. A sua primeira esposa foi a pintora russa Angelina Beloff, com quem teve um menino. Fica viúvo e casa-se com Guadalupe Marín, com quem teve duas filhas. Sua esposa mais famosa foi famosa Frida Kahlo, com quem ficou casado por décadas, em um dos relacionamentos mais conturbados do mundo da arte. Frida e Diego tinham 21 anos de diferença e eram conhecidos pela família e pelos amigos como “o elefante e a pomba”, pela grande diferença de tamanho entre os dois. Nos 25 anos que permaneceram juntos, casaram-se duas vezes, se divorciaram uma e tiveram diversos relacionamentos extraconjugais, inclusive triângulos amorosos.
Depois da morte de Kahlo em 1954, casou-se com Emma Hurtado, sua agente, com quem ficou até 1957, ano de seu falecimento. Essa quantidade de casamentos e os inúmeros casos extraconjugais mostram que Diego Rivera não conseguia ficar sozinho, mas mal saberia ele que em pleno século XXI seu trabalho continuaria em grande destaque, independentemente da confusão que era sua vida pessoal. Se tiver uma boa história para compartilhar, por favor lembrem de mim. Aguardo sugestões pelo Instagram Keka Consiglio, Facebook ou pelo Twitter.