Os mais céticos e invejosos dizem que ela é narcisista, obcecada e louca. Os antenados, admiram cada movimento que ela dá. Todos concordam que loucura e arte nem sempre seguem o mesmo caminho, mas, em alguns casos, essa combinação funciona como combustível para a criatividade.

Ela se chama Yayoi Kusama, tem 91 anos e é uma das artistas plásticas mais importantes do mundo. É também escritora de romances e poesias, em uma trajetória super interessante. Seu trabalho mistura colagens, pinturas, esculturas, arte performática e instalações ambientais. Suas bolinhas viram obsessão e a levaram para o estrelato, junto com sua obra que é fruto de uma mente criativa e descolada. Suas criações expandiram as telas e estão presentes em roupas, vídeos, esculturas e até em corpos nus apresentados com cores psicodélicas.

Yayoi vive há quase 40 anos, por iniciativa própria, em uma instituição psiquiátrica do Japão, onde trata de transtorno obsessivo compulsivo e de alucinações que a acompanham desde a infância. Sai do local apenas para trabalhar no seu ateliê, instalado nas redondezas, e para ir a algumas de suas exposições

Nasceu em 1929 em Matsumoto, uma província rural do Japão e, como era de esperar, sua família não aceitava sua paixão pelo mundo das artes. Relata que a opressão era tanta, que sua mãe chegava a rasgar seus desenhos e a agredi-la. Felizmente, sua arte a ajudou a escapar do suicídio, a canalizar ideias e a ativar sua criatividade. Saiu de uma juventude no Japão que era altamente militarista na época para encontrar em Nova York, aos 28 anos, um ambiente criativo, com artistas como Andy Warhol, Donald Judd e Joseph Cornell. Foi recebida pela pintora americana Georgia O’Keeff, que, apesar de ficar grande parte do tempo na cidade de Santa Fé, tinha um apartamento em Nova York. A Big Apple abriu a cabeça de Yayoi para a arte performática e ela mergulhou de cabeça em criações com bolinhas, artistas nus e instalações com luzes e jogos de espelhos para celebrar o amor livre e a contracultura. Aliás, apenas para registro, ela começou a pintar bolinhas aos dez anos e desde sempre é uma ativista dos homossexuais e da paz, indo contra o movimento antiguerra.

 

PONTILHADO Pintura Infinity Dots, de 2008, da artista japonesa Yayoi Kusama ()

Yayoi é um mix de tudo, com uma arte influenciada pelo modernismo, pelo minimalismo, pela pop art, pelo surrealismo e pelo expressionismo abstrato. Uma retrospectiva de sua obra foi apresentada em Nova York, em 1989, e quatro anos depois, um historiador de arte japonês conseguiu convencer seu governo de que ela deveria ser a primeira artista a representar o Japão na Bienal de Veneza, em 1993. A partir daí, começou a ser conhecida mundialmente. Costuma dizer que sua arte tem origem nas alucinações que apenas ela consegue ver. “Meu trabalho é uma expressão da minha vida e da minha doença mental. Crio mesmo quando não vejo alucinações, mas traduzo as alucinações que tenho em esculturas e pinturas”, diz.

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A artista plástica japonesa concentra toda a sua energia em suas criações. De tanto ser obrigada pela mãe ciumenta a vigiar os movimentos do pai, pegou aversão a sexo ao longo da vida. Ficou solteira e conseguiu fugir de casamentos arranjados. A sensação que se tem é que a esquizofrenia a ajuda a ter uma visão diferente da realidade, cuja mente atormentada enxerga bolas e pontos. As bolas, ou pontos do infinito, viram um TOC. Durante décadas, foram pintadas a guache, aquarela e tinta a óleo. Foram preenchidas em pisos, paredes, telas e objetos. Pessoas também receberam seus pontos coloridos. Representam uma fuga da realidade, um desabafo e, também, um caminho para mostrar a todos sua visão do mundo. Mas isso, pouco importa para o resultado de sua obra, que mobiliza milhões de fãs ao redor do mundo e faz com que marcas, como Louis Vuitton e Marc Jacobs, a contratam para colaborar com suas criações.

Sempre foi revolucionária por natureza e uma mulher à frente do seu tempo. A arte a ajudou a controlar sua doença, a conseguir pagar pelo tratamento psiquiátrico, a inspirar uma verdadeira legião de fãs e a se tornar a artista mulher mais valorizada da atualidade — uma de suas obras foi leiloada pela Christie New York por US$ 5,1 milhões. Apesar do domínio masculino no universo das artes e da chacota que os colegas faziam sobre seu trabalho, seu nome está no topo do mundo das artes. Yayoi Kusama merece todo o reconhecimento e sucesso!

Escreva para sugerir um tema ou para contar algo sobre seu artista preferido. Adoro boas histórias! (Instagram Keka Consiglio).

 


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