O Legislativo articula o amadurecimento de uma pauta bem diversificada para ser implantada no início do próximo governo, seja ele qual for. A ideia é deixar a “cama arrumada”, com tudo pronto, só para “apertar o play” assim que o rumo das eleições estiver definido. Para tomar as rédeas do cenário político no começo do próximo mandato, o Congresso se inspirou no que ocorreu com a Reforma da Previdência, que foi amplamente discutida na curta administração de Michel Temer e já estava formatada para ser aprovada no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro.

Uma das pautas que estão sendo amadurecidas é a chamada “PEC das agências”, que tira poder dos órgãos reguladores. Os parlamentares também tentam amarrar uma reforma tributária e emplacar a formalização do semipresidencialismo no País. Em entrevista ao Broadcast Político, serviço de informação em tempo real sobre política do Broadcast, o deputado Joaquim Passarinho (PL-RJ) disse que a PEC que reduz as classes de impostos a apenas três poderia ser aprovada até mesmo no fim do ano, após as eleições.

A estratégia dos parlamentares tem sido a de “provocação”. Deputados e senadores têm enviado ao Congresso textos com tons mais radicais, cientes de que dificilmente serão aprovados como foram enviados. A intenção é justamente “fazer barulho” no meio para atrair a atenção para as discussões. Foi isso o que aconteceu com a PEC do Centrão e também com a que propunha a desoneração da folha de pagamentos para todos os setores de atividade tendo como contrapartida a volta da CPMF. “É exatamente o mesmo modus operandi”, explicou uma fonte que acompanha essa tática.

O propósito claro do Congresso é o de não perder o protagonismo, principalmente em relação ao Executivo, como vem registrando o Broadcast desde o começo do ano. Mesmo que haja alguma mudança de composição das Casas na eleição de outubro, a intenção é deixar o Legislativo permanentemente ativo e na liderança para definir a pauta das grandes discussões do País. Na semana passada, o Broadcast publicou que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu fazer uma espécie de “provisionamento” dos recursos justamente para este momento.

Historicamente, é sabido que os temas mais difíceis devem ser levados à votação no primeiro ano de um governo, quando há a chamada lua de mel entre eleitores, os eleitos e entre os Três Poderes. Para alguns parlamentares consultados, é possível até que já haja espaço para avanços mesmo antes da virada do ano, quando o resultado das urnas já for conhecido. É quando há a avaliação de que o “capital político está alto”.

“Hoje essas coisas todas não estão prontas para serem apreciadas”, comentou um parlamentar. “Mas é preciso que os temas sejam levantados agora, discutidos, modificados para que a bola possa ser cortada logo que haja clima para isso”, completou. Outro deputado também disse acreditar que a estratégia possa dar frutos, como ocorreu com a reforma da Previdência. “Alguns projetos podem fazer parecer que o Congresso está querendo muito agora, mas depois baixamos os ânimos e votamos seriamente”, considerou. “Mas isso tem que ser num primeiro ano de governo, com a aquiescência dos deputados, dos governadores”, continuou.

A análise da PEC das agências reguladoras é uma das mais avançadas no momento. Há uma percepção no Congresso de que essas agências se tornaram superpoderosas e que há a necessidade de um desmembramento dessas instituições, que hoje regulam, supervisionam e fiscalizam diferentes setores. A medida esbarraria até na atuação do Banco Central, responsável hoje pela área financeira.

No caso da reforma tributária, há um consenso de que algo precisa ser feito. Não apenas porque a população tem cobrado, mas porque é um dos dispositivos fundamentais para que o Brasil possa integrar a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), processo que foi formalizado na semana passada. A dúvida, neste caso, é sobre se será possível entregar uma reforma abrangente, como muitos querem, ou se haverá necessidade de fatiamento das mudanças.

Mais recentemente, a PEC que começou a engatinhar é a que busca diminuir o poder do Supremo Tribunal Federal (STF). Há uma mobilização intensa na Câmara para que o deputado Domingos Sávio (PL-MG) obtenha as 171 assinaturas necessárias para que o texto comece a tramitar. Ainda que haja um clima de descrença de que a PEC possa avançar em sua íntegra, a busca por adesões leva em conta que ajustes deverão ser feitos.

Outro assunto que está no forno é o do semipresidencialismo. Em março, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criou um grupo de trabalho, liderado pelo deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), para estudar a mudança no sistema de governo do País, mesmo a contragosto da esquerda. Até mesmo um conselho de juristas, com o ex-presidente Michel Temer e o ex-ministro do STF Nelson Jobim, foi criado. A ideia, nesse caso, é deixar uma proposta pronta este ano para ser votada pela próxima Legislatura, ou seja, em 2023. Em princípio, Lira quer que o semipresidencialismo seja implantado a partir de 2030, para evitar acusações de casuísmo. Mesmo assim, a intenção foi criticada publicamente pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que lidera as pesquisas de intenção de voto para o Palácio do Planalto.

Entre os assuntos que estão passando pelo “processo de maturação” neste momento com vistas a se apresentarem para votação no ano que vem está a reforma tributária – que pode ser feita de forma mais abrangente ou conte com mudanças como alterações do ICMS, que acabaram sendo antecipadas agora com a questão da disparada dos preços dos combustíveis, ou mesmo a definição de um IVA, um imposto único de Valor Agregado e que incidiria apenas na ponta final da cadeia de produção.

A intenção de Joaquim Passarinho é incluir a desoneração permanente da folha de pagamento, para todos os setores da economia, na reforma que reduz as classes de impostos a apenas três: renda, consumo e propriedade. Ele avalia que isso pode quebrar as resistências do empresariado à mudança na estrutura tributária do País, já que um dos principais entraves para a reforma são os interesses conflitantes dos diversos setores da economia.