31/10/2024 - 9:07
O primeiro dia de julgamento dos ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, na quarta-feira, 30, no 4° Tribunal do Júri da Capital do Rio de Janeiro, contou com os depoimentos dos familiares da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, assassinados a tiros no dia 14 de março de 2018.
Os réus participaram do júri por meio de videoconferência diretamente das unidades onde encontram-se presos. Lessa está na Penitenciária de Tremembé, no interior de São Paulo, e Queiroz, no Centro de Inclusão e Reabilitação, em Brasília.
Segundo o TJRJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), nove testemunhas foram ouvidas no primeiro dia de julgamento, sendo sete indicadas pelo MPRJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) e duas pela defesa de Ronnie Lessa. A perita criminal Carolina Rodrigues Linhares era uma das testemunhas arroladas e não compareceu, mas foi mostrado o seu depoimento anterior em vídeo.
A primeira a depor foi a assessora parlamentar Fernanda Chaves, considerada uma das principais testemunhas do caso, pois é a vítima sobrevivente do ataque. A ex-assessora de Marielle relembrou o dia do crime e relatou que precisou alterar sua rotina e mudar de cidade.
“Eu ouvi uma rajada em nossa direção. Eu percebi que era uma rajada em direção ao carro. Em um reflexo, eu me abaixei. Eu estava atrás do Anderson e do lado da Marielle. Eu me enfiei atrás do banco do Anderson. Eu percebi que o carro foi atingido, mas seguia em movimento. O Anderson esboçou dor, falou ‘ai’, mas foi um suspiro. Eu lembro que o carro estava andando, mas lembro dos braços dele caindo. Marielle estava imóvel e o corpo dela caiu em cima de mim”, disse.
Depois foi a vez de Marinete, mãe de Marielle Franco, que chorou ao ouvir áudios enviados pela vereadora antes do crime e pediu justiça pelo assassinato da filha: “Só quero uma condenação justa”.
“Não estou para falar da minha filha como parlamentar. Estou como mãe. Ela lutou muito: estudou e chegou onde chegou. Aquilo foi uma barbárie. Nenhuma mãe merece perder a filha desse jeito. Quero pedir justiça por Marielle e Anderson”, completou.
A viúva de Marielle, Mônica Benício, também foi ouvida e afirmou que a confirmação sobre a execução da vereadora chegou com um certo “requinte de crueldade da surpresa, da dúvida”.
“O assassinato da Marielle, a notícia da morte dela, quando vem com a confirmação de que era uma execução, e não uma tentativa de assalto ou alguma coisa assim, ela tinha também em si esse requinte de crueldade da surpresa, da dúvida, de porquê a Marielle”, disse.
Em seguida, a advogada Ágatha Arnaus, viúva de Anderson Gomes, relembrou como foi o último dia de vida dele. Ela contou que o motorista se preparava para uma vaga de mecânico de aviação e o sonho dele de ser pai.
“Eu nunca tinha feito nada sem o Anderson, sempre tive ele ao meu lado. Eu tinha 27 anos e não consegui processar tudo. Eram várias coisas para equilibrar, não sabia se voltava a estudar, queria fazer algo para mim. Eu lembro de uma frase que meu pai me disse: ‘Tudo que eu fizesse a partir dali seria a primeira vez sem o Anderson’”, afirmou.
Ela ainda relatou as dificuldades de criar um filho autista sem a presença do pai. “Eu espero que as pessoas que me tiraram o Anderson, que tiraram o pai do Arthur, que elas paguem pelo que elas fizeram”, disse.
“No mesmo ano em que o Anderson morreu, eu tive de levar o Arthur sozinha para operar uma obstrução intestinal. Os médicos chegaram a falar que ele não aguentaria e que eu tinha de ficar preparada. Naquele momento, já sem o Anderson, achei que a minha família, a que eu criei, tinha acabado. Eu achei que ia enlouquecer naquele dia. Eu repeti várias vezes que o Arthur era a última coisa que tinha me restado do Anderson”, contou Agatha.
Os réus foram interrogados no fim da noite. Ronnie Lessa foi o primeiro a ser ouvido e contou que, em 2016, recebeu uma proposta para executar o ex-deputado federal Marcelo Freixo, mas não concordou. No ano seguinte, voltou a ser procurado, mas, dessa vez, o “alvo” era Marielle Franco.
Ele afirmou que convidou Élcio de Queiroz para dirigir o veículo utilizado no crime e destacou que os mandantes só exigiram que a execução não ocorresse em frente à Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
Já Queiroz voltou a afirmar que só descobriu que participaria de um homicídio quando o veículo estava estacionado próximo à Casa das Pretas, na Lapa, onde Marielle participava de um evento.
O ex-policial militar disse que convenceu Lessa de não assassinar a vereadora no local do evento e que, após o carro da parlamentar sair, conseguiu persegui-lo e emparelhá-lo, dando assim condições para que Ronnie atirasse.