Concerto de regente pró-Putin gera polêmica na Itália

ROMA, 15 JUL (ANSA) – Um convite feito para o maestro russo Valery Gergiev se apresentar em um festival de música perto de Nápoles, no final de julho, gerou polêmica na Itália.   

Isto porque o artista tem sido alvo de boicotes por várias orquestras ocidentais por não ter denunciado a invasão de larga escala de Moscou à Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022. Gergiev, de 72 anos, é próximo ao presidente Vladimir Putin e alvo de críticas no Ocidente por nunca ter se manifestado contra a guerra. O convite, no entanto, deve colocar fim efetivamente à restrição imposta a ele.   

O festival “Un’Estate da Re”, organizado no palácio de Caserta, antiga residência real dos Bourbons de Nápoles, convidou Gergiev para comandar um concerto na noite do próximo dia 27 de julho, no qual também participarão solistas do teatro Mariinsky de São Petersburgo, que ele dirige desde 1996.   

Entretanto, a decisão gerou diversas críticas, incluindo do ministro da Cultura da Itália, Alessandro Giuli, que afirmou que “a arte é livre e não pode ser censurada”, mas “propaganda, mesmo feita com talento, é outra coisa”.   

“É por isso que o concerto do amigo e conselheiro de Putin, Valery Gergiev, que o governo regional da Campânia queria, organizou e pagou, na Reggia di Caserta, que é independente na escolha dos eventos a sediar, como todos os institutos autônomos do Ministério da Cultura, corre o risco de transmitir a mensagem errada”, alertou.   

Segundo o ministro italiano, “a Ucrânia é uma nação invadida, e o concerto de Gergiev poderia transformar um evento musical de alto nível, mas objetivamente controverso e divisivo, em uma caixa de ressonância para a propaganda russa”. “Isso, na minha opinião, seria deplorável”.   

A crítica é feita logo após o jornal “La Repubblica” publicar uma entrevista com Yulia Navalnaya, viúva de Alexei Navalny, principal opositor de Putin que morreu em uma prisão siberiana em fevereiro do ano passado, sobre a polêmica gerada pela presença do maestro pró-Putin no evento cultural.   

De acordo com ela, Gergiev não é apenas um grande amigo e apoiador de Putin, mas também um promotor das políticas criminosas do líder do Kremlin e um cúmplice.   

Na entrevista, Yulia pediu para que as autoridades impeçam o músico de participar da apresentação. “Quero apelar aos italianos: sejam coerentes. Por muitos anos, o maestro apoiou as políticas de Putin com um fervor digno das causas mais nobres”, disse a esposa do dissidente russo, listando como Gergiev apoiou ou conspirou com as políticas de Putin.   

Yulia explicou ainda que, em 2022, a Fundação Anticorrupção fundada por seu marido “publicou uma investigação intitulada ‘O Condutor de Guerra de Putin'”, na qual detalhou “como, por vários anos, Gergiev usou os fundos substanciais de uma fundação de caridade que leva seu nome para ganho pessoal”.   

“Esses recursos, essencialmente de propriedade do Estado russo e destinados a apoiar teatros e jovens talentos, foram usados para garantir sua vida confortável. Valery Gergiev não é apenas um companheiro de viagem do regime ditatorial: ele se tornou parte integrante dele”, acrescentou a viúva, enfatizando que é “justamente por isso que ele nunca condenou Putin pela invasão da Ucrânia”.   

Já a eurodeputada do Partido Democrático (PD), de centro-esquerda, Pina Picierno, pediu a Vincenzo de Luca, colega de partido e governador da região da Campânia ? uma das instituições que financiam o festival ? que interviesse.   

Por sua vez, De Luca disse que já demonstrou solidariedade e milhares de cidadãos ucranianos foram acolhidos em seu território. Portanto, não pretende “aceitar uma lógica de exclusão ou interrupção do diálogo, porque isso não contribui para a paz”.   

Por fim, o político italiano enfatizou que isso “serve apenas para alimentar os rios de ódio e nos distanciar da paz” e reforçou que “somos os únicos que lutamos por um cessar-fogo há anos, em silêncio”.   

“Obviamente, os menos autorizados a falar são aqueles que se calam sobre o genocídio de crianças em Gaza e fingem estar preocupados com outros assuntos e outras figuras que fazem parte do mundo da cultura e da arte e que não têm decisões políticas em suas mãos”, concluiu De Luca. (ANSA).