Com passos rápidos e firmes, Ayelen Torres percorre as ruas de La Matanza, onde, junto com sua amiga Sabrina Sosa, coleta papelão e plásticos que habilmente empilha e compacta em um carrinho. Esses resíduos são o tesouro com o qual elas alimentam seus filhos.

A pobreza afeta 40% dos argentinos e é um tema central na campanha para as eleições presidenciais de domingo em um dos países mais ricos do mundo há um século, que hoje sofre com uma inflação anual de quase 140%.

“Eu me sinto como uma heroína. É preciso ter força e coragem para se dedicar a isso”, afirma Ayelen, de 25 anos e mãe de duas meninas, que sempre viveu em La Matanza, um dos centros de votação mais cobiçados da Argentina, com um milhão de eleitores.

Sobre as eleições – disputadas no primeiro turno entre o libertário de extrema-direita Javier Milei, o ministro da Economia peronista Sergio Massa e a conservadora Patricia Bullrich – ela não tem grandes expectativas.

“Seja lá quem vença, ainda vou ter que me levantar às seis da manhã para catar papelão”, diz.

Em algumas horas, as duas mulheres vestidas com camisetas ou coletes azul-marinho que as identificam como parte da cooperativa coletaram 76 quilos de materiais que agora serão classificados no centro de reciclagem de La Matanza.

Em um bom dia, podem dobrar essa quantidade, assim como o pagamento que as ajuda a enfrentar a grave crise econômica da Argentina.

“O papelão é nosso pão de cada dia”, diz Sabrina, de 29 anos, mãe de um menino de 7 que ela cria sozinha. Está grávida de três meses e pretende continuar trabalhando na cooperativa Construyendo, da qual faz parte há quase três anos.

Anteriormente, trabalhou em uma pizzaria, como vendedora em uma feira e também como babá. Nunca teve um contrato formal.

– “Trabalho digno” –

Cerca de 120 pessoas trabalham em turnos na organização, que também possui uma creche infantil a poucas quadras dali.

Ayelen e Sabrina vão à planta cinco dias por semana para classificar e embalar. Recebem um pagamento equivalente à metade do salário mínimo através de um auxílio do Ministério do Desenvolvimento Social. A cooperativa fornece a elas os equipamentos.

“Este trabalho estabilizou minha renda. É a primeira vez que tenho um trabalho reconhecido. É um trabalho digno”, explica Ayelen, que era vendedora ambulante e agora se sente feliz por ser um exemplo para suas filhas.

O material reciclável que coletam nas ruas mais movimentadas de La Matanza é vendido à própria cooperativa por peso.

Os “cartoneros”, como são conhecidos os catadores de materiais recicláveis na Argentina, surgiram em 2001, quando o país enfrentou a pior crise econômica, social e política de sua história recente.

Depois, em 2020 e 2021, durante a pandemia, muitos mais se juntaram a eles. “Muitos que tinham empregos garantidos perderam tudo, perderam direitos e muitas coisas”, lembra Santiago Brítez, catador desde o início dos anos 2000 e agora responsável pelo centro de reciclagem de La Matanza.

Em todo o país, eles são mais de 150 mil, de acordo com a Federação de Catadores, Carroceiros e Recicladores.

Jackie Flores, subsecretária de Meio Ambiente da província de Buenos Aires, reconhece que naquele momento “apareceram famílias inteiras nos lixões a céu aberto, crianças em busca de comida”. “É um desafio enorme”, diz.

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