Como são feitas as estimativas de público em atos e manifestações

Manifestação no Rio de Janeiro teve dissipação de pessoas após falar de Bolsonaro

A quantidade de manifestantes presentes no ato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) realizado na orla de Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), neste domingo, 16, gerou polêmica após a Polícia Militar divulgar que o público da manifestação foi de 400 mil pessoas, enquanto institutos como o Datafolha e o Monitor do Debate Político do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) estimaram que o evento atraiu 30 mil e 18,3 mil indivíduos, respectivamente.

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A Polícia Militar publicou no X (antigo Twitter) o cálculo que 400 mil pessoas estavam presentes no ato “Anistia Já”, convocado pelo ex-presidente e pelo pastor Silas Malafaia, mas não divulgou a metodologia utilizada na contagem. A divulgação repercutiu com usuários da rede social pedindo explicações para as autoridades, já que a corporação afirmava em postagens antigas não fazer estimativas de público.

Na segunda-feira, 17, a deputada estadual Renata Souza (PSOL) acionou o MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) para investigar se houve interferência do governador Cláudio Castro (PL) na estimativa divulgada pela PM. Yuri Moura (PSOL), também parlamentar da Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro), exigiu que a metodologia usada na contagem seja publicada pelas autoridades.

A reportagem solicitou o método para realização das estimativas de público em atos e manifestações via assessoria de imprensa da PMERJ, mas não recebeu retorno.

De acordo com Márcio Moretto, coordenador do Monitor do Debate Político do Cebrap, tradicionalmente, as estimativas de público eram feitas pelos próprios organizadores de eventos, que “claramente têm um viés”, e pela Polícia Militar, que tem interesse em organizar seu contingente para fazer a segurança do evento.

Em 2024, a SSP-SP (Secretaria da Segurança Pública de São Paulo) afirmou que para estimar a quantidade de público em um ato, é estabelecido um índice de concentração de pessoas por meio de imagens aéreas e agentes em solo que posteriormente é lançado em um software chamado “Copom Online”, responsável por fazer o cálculo das áreas ocupadas automaticamente. A reportagem questionou se a metodologia ainda é a mesma, mas não obteve retorno até o momento de publicação.

Para o coordenador do Monitor do Debate Político, as projeções de público inflaram a partir das manifestações que ocorreram no Brasil em 2013. “A minha sensação é que isso mudou o patamar e todo mundo que está organizando um ato quer dizer que conseguiu mobilizar aquele tanto de gente de novo, o que nunca mais aconteceu”, explica Moretto.

O pesquisador sugere que se estabeleceu no senso comum números maiores do que são na realidade. “Isso tanto em atos de direita quanto de esquerda. Quando fizemos a contagem da parada LGBT, nosso número foi da ordem de 75 mil manifestantes e se falava na época em um milhão de pessoas. Os números são bem discrepantes”, comenta.

Monitor do Debate Político

O Monitor do Debate Político surge como um projeto da USP (Universidade de São Paulo) em 2016 com foco em estudar a polarização do debate político nas redes sociais e em manifestações. Segundo o pesquisador, as estimativas de público do instituto começaram a ser feitas a partir de 2022 com fotos aéreas captadas por drones e o uso de uma inteligência artificial para a contagem de cabeças no horário de pico de um ato.

Na manifestação do domingo, foram analisadas seis imagens tiradas às 12h, e a estimativa do Monitor do Debate Político foi que 18,3 mil pessoas estavam presentes no pico da manifestação, um número 20 vezes menor do que o divulgado pela Polícia Militar. O mesmo método contou 64,6 mil manifestantes em 7 de setembro de 2022 durante um ato também realizado em Copacabana.

De acordo com o Monitor do Debate Político, a metodologia possui uma precisão de 72,9% e uma acurácia de 69,5% na identificação de pessoas. Conforme Moretto, o software tem uma margem de erro de 12%, já que eventualmente pode confundir objetos com cabeças ou não identificar pessoas. “Com isso a gente consegue números que ao meu ver são bem mais precisos do que avaliações subjetivas”, contempla o coordenador do projeto, acrescentando que todo método tem alguma limitação.

Metodologia do Datafolha

De acordo com o Datafolha, 30 mil pessoas estiveram presentes no ato do ex-presidente durante toda a passeata, equivalente a 3% do público esperado por Bolsonaro, que era de um milhão. Segundo o instituto, se o espaço ocupado pelos manifestantes estivesse lotado na capacidade máxima, caberiam 175 mil indivíduos.

O Datafolha afirmou que, para fazer a estimativa de público, foram utilizadas imagens aéreas do evento. Manifestantes estiveram na pista da Avenida Atlântica entre as ruas Constante Ramos e Xavier Silveira, além da faixa de areia próxima ao carro de som da manifestação no cruzamento com a rua Bolívar. No total, o espaço ocupado foi de 25 mil metros quadrados.

Durante a análise, os metros quadrados foram classificados em tipos de densidade alta, densidade média e dispersão. A partir do cálculo das densidades que variam de uma a quatro pessoas por metro quadrado, foi alcançado o número de 30 mil manifestantes.

Em protestos anteriores, ao invés de utilizarem imagens aéreas do evento, pesquisadores do Datafolha caminhavam ao longo da manifestação anotando a quantidade média de pessoas por metro quadrado a cada uma hora, um método que é mais caro, segundo Moretto.

*Com informações do Estadão

**Estagiário sob supervisão