Em seu primeiro dia de volta à Presidência dos Estados Unidos, Donald Trump assinou uma ordem executiva para retirar o país, que é o segundo maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, do histórico Acordo de Paris.
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A medida une os EUA a um pequeno grupo de países, incluindo Irã e Iêmen, que não fazem parte do pacto internacional que convoca os governos a tomarem ações para limitar o aumento da temperatura global a 2 ºC acima dos níveis pré-industriais e a perseguirem esforços para manter as temperaturas abaixo de 1,5 ºC.
Na prática, a Casa Branca se coloca na contramão da agenda de combate às mudanças climáticas.
“Estou imediatamente me retirando do injusto e unilateral golpe climático de Paris”, disse o novo presidente ao assinar a ordem em Washington, pouco após sua posse. “Os EUA não irão sabotar nossas próprias indústrias enquanto a China polui impunemente”, concluiu.
O ministério das Relações Exteriores da China respondeu imediatamente, expressando preocupação sobre a retirada dos EUA, e afirmou que o país responderá ativamente às mudanças climáticas e promoverá conjuntamente a transição global para uma economia de baixo carbono.
Sozinha, a China é responsável por cerca de um terço das emissões globais de gases de efeito estufa, contribuindo com 32% das emissões. Os americanos emitem 13,6%, seguidos pela União Europeia, segundo o Climate Watch.
Foco em petróleo e gás
Em seu discurso de posse, Trump deixou claro que terá a exploração de petróleo como foco de sua nova gestão. “A América voltará a ser um país industrial. Nós temos algo que nenhuma outra nação tem: a maior reserva de petróleo e gás da Terra. Nós iremos usar esse arsenal e, com isso, diminuir os preços e exportar energia americana para todo o mundo. Seremos, novamente, uma nação rica, e esse ouro líquido que está sob nossos pés será a causa disso”, afirmou.
Uma de suas primeiras ações no mandato foi suspender novas concessões de energia eólica offshore. No passado, Trump se opôs a este tipo de produção de energia – um mercado em rápido crescimento nos EUA – chamando as turbinas de “um desastre econômico e ambiental”.
Espera-se que o novo presidente também se desfaça de algumas ou todas as políticas climáticas implementadas por seu antecessor, Joe Biden, incluindo partes da Lei de Redução da Inflação, que tem o objetivo de aumentar a energia renovável e a geração dos chamados “empregos verdes”.
Os EUA também saíram do Acordo de Paris no primeiro mandato de Trump, mas Biden reverteu essa decisão quando assumiu o cargo, em 2021.
Reversão de tendência
Uma retirada dos EUA do Acordo de Paris removeria a obrigação do país de reduzir suas emissões, alertou Laura Schäfer, da ONG ambiental e de direitos humanos Germanwatch.
“Isso poderia ser um sinal para outros países reduzirem seu compromisso com a mitigação climática. Poderia diminuir a pressão sobre outros grandes emissores como a China. As emissões dos EUA desempenham um papel importante na questão de se conseguiremos manter o aquecimento global abaixo de 2 graus e 1,5 grau”, afirmou.
Cientistas dizem que a janela para manter o aquecimento global abaixo de 1,5 °C está se fechando, com temperaturas médias globais já atingindo este teto. Sob o Acordo de Paris, os países são obrigados a registrar suas emissões e apresentar metas de redução a cada cinco anos, com a próxima rodada prevista para ser apresentada antes do início de fevereiro, em preparação para a conferência climática COP30, que ocorrerá em Belém, no Brasil, em novembro de 2025.
Quem vai liderar os esforços climáticos nos EUA?
Durante o primeiro mandato de Trump, mais de 4 mil governadores, prefeitos e líderes empresariais americanos prometeram manter os compromissos do país sob o Acordo de Paris por meio da coalizão “We Are Still In”.
Com o retorno do republicano à Casa Branca, alguns líderes renovaram seu interesse de continuar com a redução de emissões como parte da US Climate Alliance, que afirma ter como objetivo trabalhar por um futuro de emissões líquidas zero.
Ainda assim, uma análise do veículo especializado britânico Carbon Brief sugere que o mandato de quatro anos de Trump poderia resultar em 4 bilhões de toneladas métricas a mais em emissões de dióxido de carbono lançado na atmosfera até 2030, caso o novo presidente revogue completamente as políticas da área. Isso é equivalente às emissões anuais combinadas da União Europeia e do Japão.
“Isso deixa claro que esperamos muito mais emissões dos EUA em comparação com o que Joe Biden havia planejado”, disse Schäfer.
Haverá um impacto econômico para os EUA?
Reverter as medidas climáticas pode ter um impacto na economia dos EUA, considerando o crescente investimento global em energia verde em comparação com os combustíveis fósseis.
O investimento global em energia em 2024 deve ultrapassar 3 trilhões de dólares (R$ 18 milhões), segundo um relatório da Agência Internacional de Energia, com dois terços desse valor indo para tecnologias limpas como energias renováveis e veículos elétricos, além de outras energias como a nuclear, contra um terço investido em carvão, gás e petróleo.
Li Shuo, especialista em energia no Asia Society Policy Institute, disse que a retirada dos EUA impactaria a capacidade do país de competir com a China nos mercados de energia limpa, como solar e veículos elétricos. “A China tem tudo a ganhar, e os EUA correm o risco de ficar ainda mais para trás”, afirmou.