Mais de 7 milhões de pessoas aptas a votar na Alemanha são imigrantes ou possuem origem migratória. Muitos nesse grupo demográfico se sentem negligenciados e perderam a fé nos partidos políticos tradicionais.Os partidos políticos alemães têm menos de um mês para convencer os eleitores a apoiar suas plataformas na eleições gerais de fevereiro. Há um grupo de eleitores, em particular, que pode oferecer aos partidos uma oportunidade de sair à frente: as pessoas que imigraram para a Alemanha, ou cujos pais o fizeram.
Estima-se que 7,1 milhões de eleitores aptos a votar nas próximas eleições – ou seja, um em cada oito eleitores alemães – se encaixem nessa descrição.
Esse grupo demográfico tende a votar com menos frequência do que as pessoas que não têm experiência pessoal de imigração ou que são da segunda geração, sendo filhos de pais que imigraram. A socióloga Friederike Römer diz que esses eleitores também estão menos comprometidos em apoiar um partido em especial do que costumavam estar.
Römer é especialista no Centro Alemão de Pesquisa de Integração e Migração (DeZIM) e coautora de um estudo que analisa as preocupações cotidianas e preferências partidárias de cidadãos que imigraram para a Alemanha ou cujos pais o fizeram.
"Entre todos os grupos pesquisados, a legenda com o maior potencial [para receber os votos dos imigrantes] é o Partido Social-Democrata (SPD)", diz a socióloga.
"Cerca de 20% dos eleitores de origem migratória poderiam se ver votando na [ultradireitista] Alternativa para a Alemanha (AfD). Mas, quando perguntamos aos eleitores imigrantes qual partido eles acreditam ter mais competência para resolver os problemas atuais, eles respondem 'nenhum' com frequência maior do que pessoas sem histórico de imigração."
Outra tendência observada por ela é que o recém-formado partido populista de esquerda Aliança Sahra Wagenknecht (BSW) e a legenda tradicional A Esquerda geralmente têm índices de aprovação mais altos entre esse grupo demográfico, enquanto o Partido Verde não se sai tão bem.
Quais questões atraem eleitores imigrantes?
Para os eleitores com histórico de imigração, a inflação e a economia estão no topo de suas preocupações.
"Quando se trata de questões materiais, problemas com seus planos de aposentadoria ou com sua situação de vida, as pessoas de origem migratória geralmente relatam preocupações maiores do que as pessoas sem histórico de migração", disse Römer.
"Também vemos que as pessoas de origem migratória geralmente estão mais preocupadas em se tornarem vítimas de crimes."
Preocupações como essas alimentam a AfD, que utiliza em suas campanhas uma plataforma xenófoba com pesadas críticas aos migrantes, ao mesmo tempo em que realiza esforços visíveis para alcançar novos eleitores. Para Römer, essa estratégia pode ser bem-sucedida também entre os eleitores imigrantes.
"[A AfD] é muito boa em abordar certas subpopulações com raízes imigrantes e convencê-las de suas políticas. Para os imigrantes que vivem na Alemanha há muito tempo, especialmente os oriundos do Oriente Médio, Norte da África ou da Turquia, eles vendem a ideia de que 'você não é o problema. Os novos são o problema.' Isso tem sido muito cativante, especialmente nas redes sociais."
Eleitores turco-alemães tendem a não votar
Segundo Yunus Ulusoy, diretor de pesquisas do Centro de Estudos sobre a Turquia e Pesquisa de Integração (ZfTI) da Universidade de Duisburg-Essen, os grupos que a estratégia da AfD pode atrair são as pessoas de origem turca, críticos do islamismo, imigrantes com nível de assimilação razoavelmente alto e histórico de imigração que remonta a décadas, ou aqueles que veem os recém-chegados como concorrentes.
Contudo, esses grupos, de acordo com o pesquisador, "são bastante marginais. Quando ouço o que a AfD diz atualmente sobre migração e islamismo, não consigo imaginar que o partido seja particularmente bem recebido na comunidade de raízes turcas."
No passado, cidadãos com raízes turcas naturalizados alemães frequentemente apoiavam os social-democratas. Embora o SPD – o partido do chanceler federal Olaf Scholz – ainda seja popular entre esse grupo demográfico, sua influência vem perdendo cada vez mais força.
Em vez disso, cada vez mais eleitores turco-alemães tendem se abster da votação completamente, em um país onde o voto é facultativo. Em comparação a outros grupos com histórico de imigração, esse subgrupo tem uma baixa participação eleitoral.
"Há um grande grupo de jovens que sofreram discriminação e ostracismo, e isso lhes deu a impressão de que eles realmente não pertencem [à sociedade]", disse o pesquisador. "Esse sentimento é doloroso, e essa mágoa pode fazer com que os jovens se afastem completamente da política e nem se incomodem em votar."
Ulusoy também criticou os políticos que se preocupam demais em apontar supostos déficits e problemas dentro da comunidade turca, em vez de destacar desenvolvimentos positivos e transmitir um sentimento de aceitação.
"Repatriados tardios" têm afinidade com a AfD
Outro grande subgrupo entre as pessoas com origem migratória são os reassentados étnicos alemães da antiga União Soviética, comumente chamados de "repatriados tardios".
Eles também compartilham amplamente o sentimento de não pertencimento. Quando a Rússia deu início a sua invasão em grande escala da Ucrânia, em fevereiro de 2022, os cidadãos russo-alemães se sentiram particularmente deslocados, explicou o historiador Jannis Panagiotidis do Centro de Pesquisa para a História das Transformações (Recet) da Universidade de Viena.
A AfD lucrou com esse sentimento e estava ansiosa para capturar esse grupo demográfico desde o início, disse o historiador à DW. A legenda ultradireitista é "a mais aberta sobre tentar se colocar como o partido dos alemães russos", observou.
Panagiotidis explicou que o partido fez isso principalmente através de promessas autoritárias, ao se comprometer com políticas de lei e ordem e adotar uma postura crítica em relação à migração. Isso, ele disse, era muito importante para uma parte desse grupo, especialmente para os que se sentiam inseguros e, portanto, se opunham à imigração de outros, principalmente de países muçulmanos.
Estudos indicam que migrantes da ex-União Soviética classificam o tema da imigração como sendo algo particularmente importante. À medida que o ceticismo em relação às políticas migratórias da ex-chanceler federal alemã Angela Merkel aumentou, o apoio ao seu partido, a União Democrata Cristã (CDU), de centro-direita, começou a desaparecer. Tradicionalmente, esse grupo demográfico era um grande apoiador da CDU.
Enquanto a CDU e seu partido coirmão na Baviera, a União Social Cristã (CSU), começam a cortejar esses eleitores com políticas de previdência social – atraentes para o grupo demográfico envelhecido de repatriados tardios – Panagiotidis acredita que a AfD e em particular a BSW devem lucrar com os desenvolvimentos políticos recentes.
"Muitos na comunidade pós-soviética costumavam votar no partido A Esquerda", disse o pesquisador. "Vários desses eleitores se voltaram agora para a Aliança Sahra Wagenknecht." Ele acrescentou que, se o partido continuar a existir, terá potencial para se sair bem não apenas com os eleitores imigrantes pós-soviéticos.
O BSW "não se posiciona como de extrema direita, o que poderia assustar os eleitores imigrantes", observou Panagiotidis.