Há três meses, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) estava muito longe do protagonismo que assumiu na disputa pela presidência da Câmara dos Deputados. Mesmo que almejasse o cargo, o paraibano não podia bater de frente com Marcos Pereira (Republicanos-SP), presidente de seu partido, que manteve sua candidatura até onde deu, mesmo sem viabilidade.

A virada começou a ser construída por Arthur Lira (Progressistas-AL), que preteriu Elmar Nascimento (União Brasil-BA), um aliado antigo, de primeira ordem e ex-amigo pessoal. A desistência de Lira em apoiar o baiano veio devido à inviabilidade de conquistar o apoio do baixo clero, que tem fortes resistências ao líder do União Brasil.

Não bastasse a traição a Elmar, Lira mergulhou de cabeça na candidatura de Motta. Sentindo sua caneta falhar em alguns momentos, começou a articular a campanha com promessas para conseguir uma grande coalizão de partidos. A ideia era unir o PT de Lula e o PL de Jair Bolsonaro no mesmo grupo para a disputa. Para isso, Arthur Lira e Motta foram ao mercado, sem se preocupar com o preço final da conta.

Oficializado na última terça-feira, 29, Hugo Motta conseguiu o apoio de ao menos 10 partidos em menos de 48 horas. Nas contas básicas, feitas em um pedaço de papel, ele teria 353 votos para garantir a vitória. Para se eleger, são necessários 257 votos dos deputados.

Mesmo com amplo apoio, Motta não se dá por satisfeito e já articula com outros partidos para aumentar a margem. União Brasil (leia mais abaixo) e PDT devem anunciar adesão à candidatura dele na próxima semana. O PSB deve iniciar negociações, enquanto o PSD já pressiona Antônio Brito (PSD-BA) a desistir da corrida (leia mais abaixo).

Conta fechada, mas cara

Para sufocar as candidaturas adversárias, Hugo Motta precisou driblar as pequenas falhas na caneta de Arthur Lira. Parte do baixo clero se mostrou insatisfeita com algumas decisões de Lira, principalmente em relação a pautas ideológicas. O alagoano avançava em pautas bolsonaristas para acenar ao PL e recuava para agradar ao PT, como no caso do PL da Anistia.

Para contornar toda a insatisfação, Motta precisou garantir a tramitação de projetos ideológicos e cargos-chave no comando da Câmara. Para o PL, será necessário oferecer a primeira vice-presidência, além de agilizar a tramitação do PL da Anistia e da PEC das Drogas.

O desafio maior era conquistar o PT. Inicialmente fechado com Motta, o partido recuou após a promessa de Elmar e Brito, que garantiram governabilidade a Lula. Além disso, o PT levaria a primeira vice-presidência e, de quebra, a próxima vaga no Tribunal de Contas da União (TCU).

Paralelamente, a alta cúpula do PT admitia preocupação com um possível blefe de Motta e temia que Lula se tornasse refém do paraibano. No entanto, o apoio ao candidato de Lira foi garantido, graças à pressão do baixo clero da legenda e ao líder do partido na Câmara, Odair Cunha (MG).

O anúncio foi feito na noite de quarta-feira, 30, mas foi necessário abrir o cofre. O PT quer a primeira secretaria, responsável pelas ações na Casa, além da vaga no TCU. Motta também teria garantido a governabilidade, mas o cenário é mais complicado para Lula, visto que o parlamento é mais conservador.

Além dos cargos da Mesa, Hugo Motta terá que balancear as presidências nas comissões. O PL quer manter a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante da Câmara, mas sabe que pode perder a disputa para o União Brasil. Há, internamente, a possibilidade de o partido de Bolsonaro assumir a relatoria do Orçamento de 2026, o que encontra resistência no PT, mas a decisão ainda não foi tomada.

A desistência de Elmar

Até agosto deste ano, Elmar Nascimento era o favorito de Arthur Lira para assumir a presidência da Câmara dos Deputados. No entanto, o cenário mudou completamente após Lira encontrar resistência do baixo clero ao nome do líder do União Brasil.

A traição de Lira revoltou Elmar. Melhores amigos, Elmar e Arthur romperam, e o primeiro prometeu vingança. Ele se alinhou a Antônio Brito para viabilizar a candidatura de um deles e enfrentar Hugo Motta.

Durante semanas, Elmar sinalizou para todos os lados. Sentou-se com membros do PL, conversou com o Centrão e até contrariou o partido ao anunciar apoio a Evandro Leitão na disputa pela Prefeitura de Fortaleza, apenas para acenar ao PT.

A estratégia que parecia certa se revelou uma furada. Hugo Motta avançou e sufocou Elmar Nascimento. Reuniu-se com deputados do União, com a ajuda de ministros, e minou a campanha do adversário. O próprio partido rifou Elmar.

Em uma reunião com a bancada, o baiano foi informado da decisão. Além de rifado, ele foi nomeado como o negociador do apoio a Motta. Além dele, Antônio Rueda e ACM Neto, presidente e vice do partido, também terão essa missão.

A fuga de Brito

O fortalecimento da candidatura de Hugo Motta fez Antônio Brito desaparecer. Mantendo sua candidatura, o baiano já é pressionado a desistir.

Nos últimos dias, Brito se manteve recluso. Nos dias de sessão, permaneceu em sua sala na liderança do PSD, evitando falar com a imprensa e atendendo apenas os aliados e partidos interessados na composição.

Com a robustez da candidatura de Hugo, correligionários do PSD começaram a articular a desistência de Brito. A ideia encontra resistência de seu principal apoiador, o presidente da legenda, Gilberto Kassab.

Antônio Brito e Kassab devem conversar no início da próxima semana. Antes disso, Elmar Nascimento deve ir a São Paulo para dar explicações ao secretário de Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Em uma semana vazia, devido ao evento parlamentar do G20, deputados e partidos devem intensificar as articulações para garantir uma maioria ampla a Hugo Motta. Solidariedade e PSB são outros partidos que podem aderir à candidatura do paraibano.

Apenas PSOL e Novo devem ficar de fora do bloco. Ambos os partidos cogitam lançar candidaturas próprias, mesmo com a derrota iminente. Os candidatos ainda serão definidos.