NO SET Hitchcock chegava às filmagens só quando tudo estava organizado. Acima, dirige James Stewart e Grace Kelly em “Janela Indiscreta” (1954); abaixo, dá instruções a Janet Leigh em “Psicose” (1960)

Há ainda pouco a mostrar em relação ao cineasta britânico Alfred Hitchcock (1899-1980), um dos expoentes da cultura pop mundial, autor de 53 clássicos em 45 anos de produtividade. Com a mostra “Hitchcock — Bastidores do Suspense”, o Museu da Imagem e do Som de São Paulo promete revelar segredos da arte do diretor consagrado pela crítica (e por sua assessoria de imprensa) como Mestre do Suspense a partir do sucesso da primeira versão de “O Homem que Sabia Demais”, de 1934.

Para convidar o público a aprender cinema com um de seus gênios, o MIS produziu a exposição a partir do sucesso de eventos que atraíram um milhão de visitantes, como as mostras dedicadas a Stanley Kubrick (2013) e Tim Burton (2016). “O modo de decifrar Hitchcock é jogar o visitante no set de filmagem”, diz André Sturm, curador das mostras, e secretário municipal de Cultura de São Paulo.

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A exposição vai de 13/7 a 21/10, e se distribui em 20 salas. Em dois andares são exibidos centenas de itens como fotos, manuscritos, storyboards, cartazes, projeções de cenas mudas, cenários e elementos cênicos. Parte do acervo vem dos Bison Archives e da coleção de Hitchcock doada pela filha Patricia à biblioteca Margaret Harrick, ambos com sede em Hollywood. Parte vem da coleção do crítico Carlos Primati, com folhetos dos filmes lançados o Brasil, onde, diz, “a recepção foi errática até Hitchcock se mudar para Hollywood em 1939”.

Os 17 filmes mais conhecidos — de “Os 39 Degraus” (1927), do período inglês (1920-1938), até “Frenesi” (1976), seu trabalho final —, ganham salas decoradas exatamente como os cenários em que foram filmados. O evento oferece ainda um festival de 15 filmes e um curso sobre suspense.

O jovem Hitch ficou famoso ao se envolver na produção, do roteiro ao apuro técnico — como câmera, iluminação e montagem — e a direção de atores. Em público, explicou sua obra e promoveu lançamentos. Fazia pontas divertidas em filmes ­— e, entre 1955 e 1965, em séries de televisão. Com tino comercial que vinha da família de feirantes, ampliou o alcance de suas histórias, vendendo jogos e miniaturas, ação hoje rotineira em franquias e séries.

Sangue sutil

Mas a maior de suas façanhas foi ter construído uma obra única, com a qual não só juntou entretenimento e grande arte como também firmou reputação na indústria de Hollywood e no meio acadêmico. Para tanto, forjou um método em que sobrepôs a imagem aos diálogos e a fotografia aos maneirismo do teatro. Para sintetizar sua ideia de puro filme intrigante, trabalhou em duas frentes. Em uma, consolidou o gênero do suspense em roteiros e contos para distingui-lo das histórias de crime. Em outra, criou um método em que cada detalhe se integra às leis do enredo. Na mostra, o set de “Suspeita” (1941) exibe o copo de leite com veneno iluminado que Cary Grant carrega pela escada espiral para matar a mulher. “O copo prova que nada ali é exibicionista”, diz Sturm. “Tudo faz parte da história.”

ANTES DA ESTREIA Storyboard de “Os Pássaros” (1963), cartaz de “Os 39 Degraus” (1935); carta do censor Luigi Luraschi a Hitchcock sugerindo mudanças em “Piscose”

O suspense foi a criação mais notável de Hitchcock. Com ele, superou as histórias de detetive e de terror. Fez isso com tensão, ambivalência e jorros discretos de sangue para fascinar o público em vez de apenas de satisfazer sua curiosidade mórbida.