Como foi o segundo dia de julgamento de Jair Bolsonaro

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O ex-presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira, dia 3 de setembro de 2025 Foto: REUTERS/Diego Herculano

O Supremo Tribunal Federal (STF) prosseguiu, nesta quarta-feira, dia 3, com o julgamento de Jair Bolsonaro e de outros sete réus que formam o núcleo central do grupo acusado de tentar um golpe de Estado após as eleições de 2022.

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O dia foi de sustentação oral das defesas de quatro dos réus:

Jair Bolsonaro, ex-presidente

– General Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)

– General Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa

– General Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e vice na chapa de Bolsonaro em 2022

Na terça-feira, já haviam apresentado suas defesas os advogados dos demais quatro réus: tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; Alexandre Ramagem, ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; e Anderson Torres, ex-ministro da Justiça.

O julgamento será retomado pela Primeira Turma do STF na próxima terça-feira, quando é iniciada a leitura dos votos dos ministros.

Veja o que argumentou a defesa de cada um dos réus na sessão desta quarta-feira:

Jair Bolsonaro

O ex-presidente não compareceu à sessão de julgamento desta quarta-feira. Seu advogado, Celso Vilardi, afirmou que “não há uma única prova” da sua participação na trama golpista e que ele foi “dragado” para os fatos apurados pela Polícia Federal.

Para Vilardi, Mauro Cid, que fez um acordo de colaboração premiada, não é “confiável” e mudou de versão diversas vezes em seus interrogatórios, defendendo que as contradições do tenente-coronel seriam motivos para anulação do acordo.

“Não há uma única prova que atrele o presidente ao Punhal Verde e Amarelo, à Operação Luneta e ao 8 de janeiro. Aliás, nem o delator, que eu sustento que mentiu, chegou a dizer ‘participação em Punhal, em Luneta, em Copa, em 8 de janeiro’. Nem o delator. Não há uma única prova”, disse Vilardi.

Ele afirmou ainda que a defesa não teve tempo suficiente para analisar todas as provas colhidas no processo. “Com 34 anos, é a primeira vez que venho à tribuna, com toda humildade, para dizer o seguinte: não conheço a íntegra desse processo. O conjunto da prova? Eu não conheço. São bilhões de documentos. Numa instrução de menos de 15 dias, seguida de interrogatório. A instrução começou em maio, nós estamos em setembro. Quinze dias de prazo para a defesa“, disse.

Vilardi argumentou também que não seria possível enquadrar Bolsonaro nos crimes de golpe de Estado e de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, por estarem ausentes a ocorrência de violência ou grave ameaça.

“Dizer que o crime de abolição do Estado Democrático de Direito começou numa live [com críticas às urnas, feita em julho de 2021], sem violência, é subverter o próprio Código Penal. É a execução da violência que consuma o delito. Não é possível falar em violência numa live sobre o TSE. Onde está a grave ameaça?”, questionou.

O advogado Paulo da Cunha Bueno, que também atuou na defesa de Bolsonaro, afirmou que a mera discussão sobre a decretação de estado de sítio não configuraria um crime.

“O estado de defesa e o estado de sítio são dos atos mais colegiados da nossa legislação. Não são atos de força unilateral do presidente da República. E é indiscutível que o ex-presidente em momento algum deu início para a decretação dessas medidas constitucionais”, disse.

Augusto Heleno

O advogado Matheus Milanez, que representa Heleno, afirmou que seu cliente havia se distanciado de Bolsonaro e que, no final do seu governo, mal se reunia com o presidente. Por isso, nunca teria conversado com Bolsonaro sobre uma tentativa de golpe.

“Quando o presidente Bolsonaro se aproxima dos partidos do Centrão e tem sua filiação ao PL, inicia-se sim um afastamento da cúpula do poder”, disse Milanez, que citou testemunhos de servidores do GSI segundo os quais “houve uma clara redução da influência do general”.

O advogado afirmou que não foi anexado aos autos do processo nenhum diálogo de Heleno com algum outro interlocutor da trama sobre o planejamento ou execução do golpe.

A maior prova do envolvimento de Heleno, diz, seria uma agenda particular, cujas anotações não eram compartilhadas com ninguém, argumentando que aquelas anotações eram apenas “um suporte da memória do próprio general” e não eram usadas nas reuniões do governo.

Milanez disse ainda que, em uma reunião ministerial, Heleno afirmou ser “necessário fazer alguma coisa antes das eleições”, o que indicaria uma disposição “republicana” do general.

“O que o general Heleno está trazendo aqui são falas até certo ponto republicanas: após as eleições não tem discussão, quem ganha a maioria dos votos leva”, observou o advogado. “Que fique claro: nenhum militar foi procurado pelo general Heleno, nenhum militar foi pressionado [por ele]”, disse.

Paulo Sérgio Nogueira

O advogado do ex-ministro da Defesa, Andrew Fernandes, disse que seu cliente tentou demover Bolsonaro de tentativas de golpe de Estado.

“A delação e o depoimento da principal testemunha de acusação, o comandante da Força Aérea brigadeiro Batista Júnior é contundente, acachapante”, disse Fernandes.

“O general Paulo Sérgio acabou sendo enredado em uma contumélia. Mas a prova dos autos, a instrução judicial demonstrou, de forma inequívoca, a sua inocência”, afirmou.

“Ele assessorou o presidente da República [no sentido] de que nada poderia ser feito diante do resultado das eleições. É o que diz o delator. Se posicionou totalmente contrário a qualquer medida de exceção”, completou.

Segundo Fernandes, membros da organização acusada de orquestrar o golpe atuavam para retirar seu cliente do cargo. “Pera lá. Como é que ele fazia parte da organização criminosa? É a prova dos nove. Se estavam lutando para tirá-lo?”, questionou.

Ao final de sua fala, a ministra Cármen Lúcia perguntou ao advogado ao que ele se referia quando disse que Paulo Sérgio queria demover Bolsonaro. “Demoveu de quê?”, perguntou a ministra. “De qualquer medida de exceção”, respondeu Fernandes.

Walter Braga Netto

O advogado José Luis Mendes de Oliveira Lima, que defende o general Walter Braga Netto, afirmou que seu cliente pode ser condenado a morrer na cadeia com base em uma “delação premiada mentirosa” de Mauro Cid.

“Não há a menor dúvida de que a voluntariedade nesse acordo de colaboração premiada ficou à margem. [Mauro Cid] Foi coagido sim, e quem falou não foi este advogado, quem falou foi ele”, disse.

Segundo o advogado, foram 15 versões diferentes dadas por Cid para os fatos investigados. Numa das acusações mais graves contra o general, o tenente-coronel disse ter recebido uma grande quantia em dinheiro, dentro de uma sacola de vinho, para financiar a execução do golpe.

“É razoável imaginar que um delator demore 15 meses para trazer este fato ao eminente relator, ao Ministério Público, à polícia? É um escândalo!”, disse. “É com essa mentira que meu cliente vai ser condenado por 20 anos, que meu cliente vai morrer na cadeia?”, indagou.

“O Ministério Público instalou um procedimento para que o réu colaborador apresentasse provas e não apresentou. É apenas uma narrativa. Uma narrativa que a Polícia Federal fez e que o Ministério Público abraçou de todas as formas, que é uma narrativa bem colocada, bem escrita, mas absolutamente desprovida de provas”, afirmou Oliveira Lima.

A defesa de Braga Netto argumentou ainda que com o general “não foi apreendida cópia de planos, ninguém o relacionou a qualquer ação ilícita, e ele nem sequer tinha em seu celular o contato dos supostos executores dos planos”.