O progresso, a riqueza e as inovações estão ligadas ao esforço e à luta pela sobrevivência. “A necessidade é a mãe da invenção”, diz o ditado. É o que reforçam as teorias biológicas, sociais e econômicas mais influentes ao explicar a história a partir de uma abordagem utilitária. Mas elas não parecem captar a ilusão e o prazer como ferramentas de mudança histórica, pois colocam em plano inferior os brinquedos, os jogos, o consumo e a gastronomia. Felizmente, as explicações estão erradas. Pelo menos é o que pensa o historiador de tecnologia americano Steven Johnson, de 49 anos, autor de dez livros, entre eles “Cultura da Interface” (1997), obra pioneira na reflexão sobre a confluência midiática na era digital.

No livro mais recente, “O Poder Inovador da Diversão“, lançado pela editora Zahar, Johnson inverte o ditado clássico e demonstra que o prazer pode ser pai da inovação. Nesse sentido, a história do entretenimento é tão ou mais decisiva que a do trabalho árduo. “Descobertas aparentemente triviais acabaram por gerar mudanças no domínio da História Séria”, afirma. Johnson chama isso de “efeito beija-flor”, “o processo pelo qual uma inovação em um campo põe em movimento transformações em campos aparentemente não relacionados”.

O PODER DE BRINCAR Em seu livro mais recente, o autor americano desvenda o fascínio humano pela diversão

Sonho futuro

Assim, o hábito do café virou moda no século 18 e ajudou a dar origem a espaços culturais públicos e às modernas empresas jornalísticas. As primeiras lojas decoradas, instaladas em Londres para atrair as damas seduzidas pela chita indiana, deflagraram a Revolução Industrial e os shopping centers. O Escritor, autômato de 1772 que espantava as plateias porque escrevia (era movido a corda), prefigurou a Máquina Diferencial e os primeiros robôs. Jogos como o xadrez forneceram o modelo combinatório às tecnologias atuais. Em 1961, dois estudantes do MIT, Dan Edwards e Peter Samson, apossaram-se das regras do xadrez ­— e em ficção científica — para construir o PDP-1 e o Spacewar!, minicomputador e videogame pioneiros. Fundaram a linguagem de programação de softwares e aplicativos.

Como, então, entender por que a simples recreação dispara motivações inconscientes? Para explicar a razão, Johnson cita o historiador francês Jules Michelet, que dizia que cada época prevê a seguinte sob a forma de sonho. A necessidade de surpresa é quase tão importante como a da sobrevivência. Nos anos 1990, os cientistas concluíram que o instinto de surpresa é regulado por um neurotransmissor — a dopamina — responsável pelo “bônus da novidade”.

Os jogos e as diversões, afirma Johnson, não passam de máquinas de produzir novidade e surpresa. As experiências inéditas suscitadas pela diversão não se relacionam aos instintos. “A fome ou a necessidade de ligações sociais podem ser satisfeitas por uma fonte confiável de alimento ou de amigos próximos”, diz Johnson. “Mas a surpresa exige sangue novo: o milagre de uma geração já é notícia velha para a geração seguinte.”

O que faz a humanidade avançar é romper os hábitos por meio do prazer, da expectativa e do sonho.