A Polícia Civil do Rio de Janeiro investiga se parte do dinheiro arrecadado pelos influenciadores digitais que foram alvo de uma operação nesta semana estaria sendo direcionada às facções criminosas Comando Vermelho e PCC (Primeiro Comando da Capital).
Segundo os policiais, na estrutura criada para ocultar os recursos obtidos com a exploração ilegal de jogos de azar, como o ‘jogo do tigrinho’, há pessoas vinculadas às organizações criminosas. A reportagem tenta contato com a defesa dos citados.
Como funciona a relação
A Operação Desfortuna cumpriu mandados de busca e apreensão contra 15 conhecidos influenciadores digitais do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais que, juntos, somam mais de 30 milhões de seguidores. Eles são suspeitos de atuação em um esquema de publicidade enganosa, estelionato e lavagem de dinheiro que movimentou mais de R$ 4 bilhões nos últimos anos.
De acordo com o delegado Renan Mello, da Delegacia de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado e à Lavagem de Dinheiro, as apurações podem levar à deflagração de novas fases da operação.
“Nessa exploração de jogos online, de publicidade enganosa e de cassinos online pelos influenciadores, eles movimentam o recurso dessa atividade por meio de uma rede financeira, composta por intermediadoras de pagamentos, como as fintechs. Nesses canais de transferência, identificamos a presença de pessoas que têm vinculação direta com o crime organizado. São pessoas vinculadas a organizações criminosas, como o Comando Vermelho e PCC”, disse ao jornal O Estado de S. Paulo.
O delegado afirmou que a possível relação dos influenciadores com o crime organizado ainda está em investigação. O material apreendido durante as buscas autorizadas pela justiça começa a ser analisado.
“Não há apontamento de que os influenciadores ou as empresas estejam negociando diretamente com elementos de organizações criminosas, mas existe uma proximidade entre eles nas transações, com a utilização de mesmas empresas e pessoas que chamou a atenção. Vamos nos debruçar sobre isso agora”.
A investigação apontou nove empresas de intermediação de pagamentos usadas pelo esquema e que agora são investigadas. Além disso, segundo o delegado, alguns influenciadores criaram empresas de fachada para gerir suas carreiras, mas elas movimentam valores oriundos tanto de contratos publicitários válidos, como de contratos relacionados a jogos de azar. “Há uma mescla de valores lícitos e ilícitos obtidos por esse influenciadores.”
Ele lembra que as apostas online já são um problema regulatório no Brasil há alguns anos e os instrumentos de regulação vêm sendo aprimorados. “Temos consolidadas as apostas de tarifa certa, que são as apostas esportivas (bets) e algum avanço na possibilidade de regular os cassinos online. Só que têm muitas regras que as casas não obedecem. Quando os influenciadores fazem propaganda dessas apostas, eles sugerem que o jogo impacta o estilo de vida do apostador e que as apostas possam gerar um estilo de vida semelhante à que eles levam, e isso é vedado.”
Segundo o delegado, além da exibição de carrões esportivos e mansões, supostamente adquiridos com o dinheiro de apostas como as do ‘tigrinho’, os influenciadores exibem em seus perfis uma vida glamorosa, com festas e viagens internacionais. “A gente tem vídeos deles de ganhos simulados que pagariam um jantar em país estrangeiro naquela noite. ‘Olha, joguei tanto e meu jantar em Paris já está pago'”.
Seguindo o dinheiro
Conforme a investigação, os investigados recebiam até R$ 250 mil por três meses de divulgação. Os mais famosos chegavam a ficar com metade do valor perdido pelos apostadores que se cadastrassem no link divulgado pelo influenciador. Apenas uma influenciadora movimentou R$ 4 milhões em um ano.
“São ganhos astronômicos. Os contratos que remuneram esses influenciadores têm valores que estão muito além da realidade de pagamento dessa pessoas.” Para o delegado, as ações ilícitas ficaram muito claras na investigação. “Ainda que um influenciador ou outro seja garoto propaganda de casas de apostas, a própria atividade nesse ponto já constitui uma violação.”
O delegado não descartou a possibilidade de, com o avanço da investigação, pedir a prisão dos investigados. “Existe uma questão jurídica que com a prisão que é o prazo para concluir a investigação. Em virtude da magnitude e da robustez dos dados que existem, precisamos aprofundar as investigações. Como eles não representam risco de fuga e à incolumidade pública, a princípio, a gente preferiu pedir mandados diversos dos de prisão.”