Ideais populistas estão ganhando força no Japão, impulsionados por políticos de direita que se manifestam contra o “elitismo”, o “globalismo” e a imigração.
A ascensão ficou evidente nas eleições de domingo para o Senado, quando a coalizão do primeiro-ministro Sigeru Ishiba perdeu a maioria, enquanto o partido Sanseito, fundado há cinco anos com o discurso “Japão Primeiro”, passou de duas para 15 cadeiras.
A agenda do Sanseito parece ser inspirada em movimentos de direita como o “Make America Great Again” (MAGA) do presidente Donald Trump, a Alternativa para a Alemanha (AfD) e o Reform UK do britânico Nigel Farage.
Eles defendem “regras e limites mais rígidos” para imigração e capital estrangeiro, a rejeição do “globalismo” e das políticas de gênero “radicais”, além de mudanças na descarbonização, vacinas e agricultura sem pesticidas.
O Sanseito “devolverá o poder ao povo”, escreveu no Japan Times o líder do partido Sohei Kamiya, um ex-professor e gerente de supermercado de 47 anos.
Pesquisas indicam que a imigração não é uma grande preocupação para os eleitores, que estão muito mais preocupados com a inflação e a economia.
Mas, para o Sanseito, o fluxo de estrangeiros para o Japão – onde a imigração exigida pela economia é muito menor do que a de outros países industrializados – é a causa de inúmeros males, do aumento dos preços dos imóveis até a imprudência ao volante.
“Tudo bem se eles vierem como turistas, mas se você acolher cada vez mais estrangeiros, alegando que são mão de obra barata, os salários japoneses não aumentam”, declarou Kamiya em um comício, acrescentando que “nunca pedimos a expulsão de estrangeiros”.
Muitas plataformas digitais foram inundadas com informações falsas, algumas contestadas por grupos de verificação de fatos ou pelo próprio governo.
Algumas mensagens, por exemplo, afirmam falsamente que estrangeiros deixam quase US$ 3 bilhões (R$ 16,7 bilhões) em contas médicas não pagas a cada ano, ou que o número de residentes chineses que recebem assistência social dobrou em cinco anos.
Em um comício do Sanseito em Tóquio, uma eleitora disse à AFP que finalmente se sentiu ouvida. “Eles dizem o que eu penso, mas não podia dizer há muitos anos”, afirmou a mulher de 44 anos, que trabalha no setor de tecnologia com um contrato de curto prazo.
“Quando estrangeiros vão para a universidade, o governo japonês lhes dá subsídios, mas quando nós vamos para a universidade, ficamos com dívidas enormes”.
Contas de bots russos têm sido responsáveis por “manipulação de informações em larga escala”, segundo Ichiro Yamamoto, do Instituto Japonês de Direito e Sistemas de Informação.
O fenômeno foi impulsionado pela inteligência artificial, que facilita a tradução de materiais para o japonês.
Assim como em outros países, a ascensão do Sanseito e seu sucesso levaram o governo a anunciar novas políticas de imigração.
O partido de Ishiba, o PLD, proclamou a meta de atingir “zero estrangeiros ilegais” e garantiu que o governo fortaleceria o sistema de imigração.
Oito ONGs emitiram uma declaração conjunta na semana passada, endossada por mais de 1.000 grupos, alertando para “a rápida disseminação da xenofobia”. “O argumento de que ‘estrangeiros têm prioridade’ é uma demagogia infundada”, afirma a declaração.
Hidehiro Yamamoto, professor de Política e Sociologia na Universidade de Tsukuba, observou que o populismo não havia se consolidado no Japão anteriormente porque o PLD, que governa quase continuamente desde 1955, atende a todos os segmentos.
“O PLD cuidou dos moradores de classe média baixa nas cidades, dos agricultores no campo e das pequenas e médias empresas”, explicou Yamamoto.
Mas ele diz não ter certeza se o Sanseito sobreviverá, apontando para a ascensão e queda de outros novos partidos no Japão. “Não é possível continuar conquistando apoio com apenas um sentimento público temporário”, observou Yamamoto.
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