Definitivamente não serão dias de calmaria que aguardam pelo capitão, após a sua mirrada volta dos sabáticos meses na terra do Mickey, com meia dúzia de gatos pingados de apoiadores o aguardando no aeroporto (a maioria já se bandeou das fileiras de adoradores, talvez por finalmente perceber o tamanho da fraude que representa o decantado “mito” fujão). Jair Bolsonaro não apenas retornou com status menor, pequeno mesmo – muitos até já descartam lhe conceder a missão de liderança dos opositores, que estava ali reservada para ele –, como também, despojado da aura de presidente e da imunidade que o posto lhe conferia, terá pela frente grandes pedreiras legais a enfrentar. Pululam ações em tribunais de Primeira Instância, remetidas pelo Supremo, além de investigações de peso, fundamentadas em inúmeras evidências, que podem torná-lo inelegível imediatamente pela Corte eleitoral. Não menos delicado é o rumoroso caso das joias, em episódios sucessivos de lotes de presentes milionários de um sheik árabe, cujas remessas entraram no País sem a devida declaração, descaradamente sonegadas à Receita Federal. A muamba, cujo valor até aqui conhecido supera a casa dos R$ 18 milhões (pode ser mais, muito mais!), era para atravessar a fronteira despercebida dos olhos das autoridades policiais, literalmente por debaixo dos panos, nas bagagens de auxiliares e (vejam só!) com a cumplicidade de um ministro lambe-botas. Mas não teve jeito. Pilhado em flagrante, o ardil foi desbaratado. E o que é pior: o ex-mandatário, ainda no poder, teria feito de tudo, o possível e o impossível, para reaver, na base da carteirada, o tesouro contrabandeado. Foram sucessivas tentativas com o objetivo de incorporá-lo, indevidamente, ao seu acervo pessoal. O crime tem nome. Típico caso de peculato de funcionário público, punido com penas que variam de dois a 12 anos de reclusão. Bolsonaro ainda se imagina amparado por um arsenal de privilégios. Desembarcou reclamando que não tinha carro blindado para conduzi-lo. Gazeteou os primeiros dias de trabalho na sede da legenda PL que o abrigou. Está flanando por aí, ainda crente de que seguirá na vida mole e água fresca, com proventos diversos a receber de fontes federais e partidária. É do que gosta: se esbaldar na mordomia. Mas o cerco se fecha. O preposto/emissário da carga preciosa que incluía desde colar de brilhantes a relógios cravejados de diamantes, o então ministro das Minas e Energia (será que a menção a “minas” teria a ver com a missão que recebeu?) Bento Albuquerque admitiu em depoimento à PF não ter informado aos fiscais do Leão que portava um dos estojos dados pelos tais amigos das mil e uma noites do Oriente Médio. Afirmou que só abriu a caixa no dia seguinte, no Ministério, onde os itens ficaram guardados por nada menos que um ano. Vai ver, não era curioso. Albuquerque passou ileso pela fiscalização alfandegária. Já o auxiliar, que trazia o nababesco colar, não teve a mesma sorte. O braço-direito do Messias, tenente-coronel Mauro Cid, que atuava como ajudante de gabinete, é outro que pode complicar bastante a falsa narrativa do chefe. Ele deve relatar à PF que a ordem para as oito tentativas (ao menos!) de retirar a carga dos porões da alfândega partiu diretamente de Bolsonaro. Ele foi orientado pelo capitão a tomar as medidas necessárias com o intuito de reaver o conjunto. Diligentemente, chegou a colocar no meio da história o personagem Julio César Gomes, na época titular da Receita, para facilitar a tramoia. A generosidade árabe que cerca esse fabuloso enredo ainda traz como ingrediente suspeitas de corrupção após a denúncia de que uma refinaria brasileira teria sido vendida a preço de banana, pela metade do que valia, justamente para o príncipe benevolente que Bolsonaro tanto admira. São contabilizadas mais de 140 viagens de missões do governo do mito àquele País durante seu mandato. Um recorde de visitas nunca antes registrado por delegações oficiais para um único destino em tão curto período. Por que será? Como em um queijo suíço, há muitos furos nessa história e é Bolsonaro quem terá de prestar os maiores esclarecimentos. No cômputo geral, são aproximadamente 160 processos, entre criminais, representações e inquéritos que recaem sobre a sua pessoa. Está mesmo na hora de pagar a conta.