Em meio a uma série de denúncias de abusos sexuais na Igreja católica espanhola, um dos casos mais estrondosos começou a ser julgado nesta segunda-feira (25) em Barcelona, o de um professor da rede de escolas Marista, igualmente impactada por um escândalo no Chile.

A Audiência de Barcelona iniciou o processo contra Joaquín Benítez, professor de educação física laico que trabalhou durante três décadas em um colégio desta ordem católica em Barcelona.

Ele é acusado de quatro crimes de agressão sexual, dois deles ainda em andamento. No total, foram apresentadas 17 denúncias contra o professor por abusos cometidos entre 1980 e 2010, mas a maioria já prescreveu.

O caso provocou um vendaval de acusações contra professores e funcionários dos Maristas, em sua maioria laicos, e rompeu o silêncio imposto durante anos sobre os crimes de pedofilia na Igreja espanhola.

Embora seu rosto seja público depois de ter aparecido em várias entrevistas reconhecendo seus crimes, Benítez chegou ao tribunal com uma máscara de esqui e, uma vez sentado no banco dos réus, cobriu o rosto com as mãos quando os fotógrafos entraram para tirar fotos.

A Promotoria pede 22 anos de prisão, enquanto a defesa, apesar das confissões públicas de seu cliente, reclama a absolvição.

O julgamento começou com as declarações das vítimas a portas fechadas e com uma tela em torno do réu para evitar contato visual com ele.

Os testemunhos devem ratificar a lista dos abusos que consta da ata de acusação: toques, masturbações, felações e até relações sexuais.

A maioria teria ocorrido em sua sala, para onde Benítez os chamava sob o pretexto de fazer uma massagem se sentissem desconforto após as aulas de educação física.

“Esperamos que a justiça seja feita, embora a justiça não repare os danos que foram causados às vítimas”, disse Manuel Barbero, pai de um dos estudantes que denunciou o caso, antes do julgamento.

Após as revelações referentes a esse caso, 43 queixas foram apresentadas contra uma dúzia de professores, mas apenas Benítez e outro monitor vão responder por seus crimes, porque os demais prescreveram.

“A lei de prescrição é problemática porque as vítimas precisam de mais tempo para amadurecer e apresentar sua queixa. Isso tem que mudar”, lamentou Barbero.

Na Espanha, o prazo de prescrição para esses crimes começa a correr quando a vítima completa 18 anos. O governo quer estendê-lo para 30 anos, embora as associações de vítimas peçam para aumentá-lo para 50.

– Cascata de denúncias contra Maristas

Nesta segunda-feira, também deve testemunhar um responsável pela Fundação Marista, que aparece como parte civil e deverá assumir um pagamento hipotético de indenização, caso Benítez seja condenado e não possa pagar.

As vítimas acusam a rede de colégios de acobertar os abusos de seus funcionários e lamentam que não esteja no banco dos réus.

“Não acobertamos ninguém”, garantiu Raimon Novell, coordenador para a proteção da infância dos Maristas na região da Catalunha, entrevistado dias antes do julgamento.

“Nós não sabíamos o que estava acontecendo naquele momento, porque ninguém nos explicou”, disse ele, ressaltando que, quando a primeira queixa contra Benítez surgiu em 2011, ele mesmo renunciou ao cargo, enquanto a direção do colégio apresentou uma denúncia ao Ministério Público.

Esta congregação católica esteve envolvida em 2017 no escândalo de abusos e suposta ocultação no Chile, com quase 150 casos abertos na Justiça, atingindo várias unidades eclesiásticas.

O caso mergulhou a Igreja do país na pior crise de sua história e forçou a renúncia de 34 bispos chilenos.

O impacto na Espanha foi menor, mas abriu a porta para uma série de revelações que levaram a Igreja espanhola a pedir desculpas em 2018 e a modificar seus protocolos de atuação para estes casos.

No entanto, a Conferência Episcopal rejeitou por enquanto investigar possíveis casos do passado, dizendo que é da responsabilidade das várias dioceses.