22/11/2024 - 16:31
Medidas de combate a incêndios florestais evitaram centenas de mortes e milhares de hospitalizações na Amazônia associadas ao fogo e à fumaça, apontam cientistas brasileiros e alemães.As florestas costumam ser descritas como pulmões da Terra, por seu papel importante em remover do meio ambiente poluentes como o dióxido de carbono. Um estudo conjunto da Universidade Federal de Minas Gerais e da Universidade de Bonn reforça uma outra função das árvores, além da ecológica: a de nos manter saudáveis.
Ao analisarem o impacto de medidas conservacionistas na Amazônia sobre a saúde das populações locais, os pesquisadores descobriram que a redução das queimadas levava a uma queda proporcional no número de hospitalizações e mortes por problemas respiratórios.
O combate aos incêndios florestais acarretou a redução da fumaça e, portanto, da concentração de micropartículas no ar, uma das principais causas de problemas pulmonares. "É bem direta a relação entre a deflagração de um incêndio, o trânsito da fumaça e os problemas de saúde de quem a inala ", confirma o autor principal, Yannic Damm, de Bonn.
O fogo na Amazônia é um tópico constante da agenda ambiental da América do Sul. Em 2024, o Brasil registrou os piores incêndios florestais em 14 anos. Na Bolívia, queimadas destruíram um recorde de 10 milhões de hectares.
18 mil hospitalizações, 680 mortes a menos
Para a análise, os pesquisadores de Minas Gerais e Bonn primeiro calcularam se os incêndios e a poluição diminuíram em decorrência das medidas introduzidas em 2007 e 2009 para impedir que os comerciantes comprassem produtos bovinos e de soja originários de áreas desmatadas. Foi considerada uma zona de 100 quilômetros em torno do bioma amazônico, nos estados do Maranhão, Tocantins, Pará, Mato Grosso e Rondônia.
Nos anos seguintes às medidas, observou-se uma diminuição do número de incêndios e, consequentemente, emissões bem menores de gases poluentes como monóxido de carbono e dióxidos de enxofre e de nitrogênio. Em seguida, os cientistas cotejaram esses dados com as hospitalizações por moléstias associadas à poluição atmosférica.
Na região amazônica, a preservação ecológica proporcionou cerca de 18 mil hospitalizações a menos por ano, assim como menos 680 mortes por problemas relacionados a fumaça e fogo. Para verificar suas estimativas, os pesquisadores compararam esses números com os de infecções sexualmente transmitidas (em princípio, sem relação com a incidência de incêndios) no mesmo período, as quais permaneceram estáveis.
Fumaça não é o único perigo das queimadas
Em áreas florestais desmatadas, criam-se condições mais quentes e secas, que as tornam mais propensas ao fogo por causas naturais ou humanas. Além de um coquetel de gases tóxicos, a fumaça contém micropartículas de diversas dimensões. As denominadas PM2,5 têm 2,5 micrômetros ou menos, sendo menores que muitas bactérias.
Em comparação, as células vermelhas do sangue humano medem cerca de 7 micrômetros. Assim, as PM2,5 são facilmente absorvíveis pela corrente sanguínea através dos pulmões, tendo o potencial de causar problemas de saúde no curto ou longo prazo. A exposição prolongada à fumaça agrava doenças como a asma e reduz a função pulmonar, podendo também causar problemas cardíacos e respiratórios crônicos.
Contudo, a fumaça não é o único fator de morbidade associado ao desmatamento: a própria derrubada de árvores pode aumentar a probabilidade de moléstias transmissíveis já que, ao reduzir o habitat da fauna nativa, acaba empurrando-a para mais perto dos humanos.
Quando os animais são portadores de vírus, bactérias ou parasitas, pode ocorrer o que a ecologista Nicole Lynn Gottdenker, da Universidade de Geórgia, EUA, denomina "um transbordamento de patógenos da vida selvagem para os seres humanos e animais domésticos". No caso de transmissão entre animais e humanos, fala-se de transbordamento zoonótico.
Diversos estudos indicaram uma correlação entre a transmissão da malária na Amazônia e o desmatamento. Em um deles, 1% de aumento da derrubada mensal provocou um acréscimo de 6,3% dos casos dessa enfermidade infecciosa transmitida por mosquitos.
O próprio impacto da perda das florestas sobre a vida dos habitantes é um fator de risco para a saúde humana: "Muitas vezes a população é desalojada e marginalizada, tornando-se mais vulnerável aos patógenos responsáveis por doenças infecciosas", explica Gottdenker.
Alguns estudos constataram que medidas para coibir o desmatamento e a perda de habitat reduziram a probabilidade de eventos de transbordamento zoonótico. Exemplos recentes desse fenômeno foram o coronavírus Sars-Cov-2, causador da covid-19, e o vírus da mpox.