O presidente tunisiano, Kais Saied, que acaba de decretar o fechamento temporário do Parlamento, usou seus poderes excepcionais para lançar uma cruzada anticorrupção, responsabilizando 460 empresários que lucraram durante a era do ditador Zine El Abidine Ben Ali.

Três dias depois de ter suspendido a atividade parlamentar por um mês e ter assumido a totalidade do Poder Executivo, o chefe de Estado criticou as “más decisões econômicas” adotadas nos últimos anos na Tunísia, durante um encontro com o presidente da associação patronal (UTICA) na noite de quarta-feira(28).

Saied, que ainda não nomeou um novo primeiro-ministro, condenou “aqueles que roubam dinheiro público”.

São “460” homens de negócios e empresários, que devem “13,5 bilhões” de dinares (4 bilhões de euros, 24,09 bilhões de reais) ao Estado, lembrou ele, citando um antigo relatório elaborado por uma comissão de inquérito sobre corrupção e peculato do regime de Ben Ali.

“Esse dinheiro deve voltar para o povo tunisiano”, destacou o presidente. Para isso, pretende oferecer acordos judiciais aos empresários suspeitos: que paguem as quantias necessárias – que iriam para as regiões menos desenvolvidas da Tunísia – em troca da não abertura de processos contra eles.

Após meses de crise política, o presidente, cujas prerrogativas muitas vezes se limitam à diplomacia e segurança, assumiu o poder no domingo, alegando agir de acordo com a Constituição.

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Uma decisão denunciada como um “golpe” por seu principal rival, o partido Ennahdha, de inspiração islâmica.

– Investigações anticorrupção –

Pouco antes de seu discurso, o gabinete do procurador-geral da Tunísia, sob as ordens diretas do presidente no novo estado excepcional, anunciou uma investigação contra o Ennahdha, seu partido aliado, Qalb Tounes, e a formação Aich Tounsi, por suposto financiamento com recursos estrangeiros de suas respectivas campanhas eleitorais em 2019.

O Ennahdha é o principal partido no Parlamento, o Qalb Tounes foi fundado pelo empresário Nabil Karoui e o Aich Tounsi é uma pequena formação criada por Olfa Terras Rambourg, eleita deputada em 2019.

No início de outubro de 2019, o Tribunal de Contas e um partido da oposição, Corrente Democrática, apresentaram queixas contra Karoui, Terras e Ennahdha à promotoria.

Nessas denúncias, essas formações foram acusadas de se beneficiarem de financiamentos externos ou de origem desconhecida, proibidos pela legislação tunisiana.

Saied também anunciou uma comissão de crise para controlar a pandemia de covid-19, sob supervisão militar.

A Tunísia enfrenta um colapso de seu sistema de saúde diante do novo pico da pandemia. Com 12 milhões de habitantes, o país registrou 19 mil mortes relacionadas ao novo coronavírus, uma das piores taxas de mortalidade do mundo.

País com recursos naturais escassos, uma de suas fontes de divisas são os fosfatos. Mas a produção entrou em colapso após a revolução de 2011, devido à falta de investimento e repetidas greves.

Saied manifestou o desejo de que “os fosfatos voltem à sua atividade do passado” e aludiu indiretamente às suspeitas de corrupção, de “parlamentares que se protegem com imunidade” das acusações.



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