O Flamengo está colhendo o que plantou. De fora para dentro do campo. A boa campanha no Campeonato Brasileiro e a perspectiva real de conquistar títulos, após anos de campanhas ruins em que chegou até a flertar com o rebaixamento, está diretamente ligada ao processo de saneamento financeiro do clube. O time rubro-negro ainda tem dívida alta, mas que está sendo honrada. E vem obtendo receitas que permitem a montagem de uma equipe competitiva.

Clube de maior torcida do futebol brasileiro, até 2012 o Flamengo convivia com a desagradável fama de caloteiro. Atrasa salários, não honrava contratos com jogadores e funcionários – era alvo de pilhas de processos trabalhistas -, não pagava impostos, tributos, dava calote em bancos. Praticava sonegação, apropriação indébita…

O quadro começou a mudar em 2013, quando Eduardo Bandeira de Mello, administrador de empresas que fez carreira no BNDES, assumiu a presidência. Foi eleito prometendo modernizar métodos e a gestão do clube, com o objetivo principal de promover um saneamento financeiro.

Apesar das críticas da torcedores pela falta de times competitivos, arregaçou as mangas, negociou dívidas trabalhistas e bancárias, aderiu ao Profut, o programa do governo federal de refinanciamento de dívidas fiscais e tributárias do clubes. Com isso, começou a reduzir o endividamento – em 2015 era de R$ 481 milhões contra R$ 751 milhões cinco anos antes.

“Temos uma dívida administrável e que no final do ano deve ficar abaixo dos R$ 400 milhões”, disse Eduardo Bandeira de Mello, tijucano de 63 anos. “O importante é que o perfil da dívida mudou também. Antigamente você tinha uma dívida basicamente tributária, extremamente onerosa. Depois do Profut, foi diluída em 20 anos, de forma bastante confortável”.

Além disso, diz o dirigente, a dívida trabalhista “praticamente acabou” e a bancária está sendo reduzida. “Trabalha-se para que nos próximos anos a nossa dívida seja composta basicamente pelo Profut, que está escalonada”.

Bandeira não fala em valores, mas sabe-se que em março de 2015 o Flamengo fechou acordo com Romário, pelo qual pagou R$ 4,2 milhões no ato ao ex-jogador e comprometeu a depositar parcelas mensais de R$ 160 mil até 2022. O presidente acredita até que um acordo possa encerrar essa dívida antes. Com Ronaldinho Gaúcho, os R$ 40 milhões devidos foram reduzidos para R$ 17 milhões em um acordo feito em fevereiro.

PRESTÍGIO – A consequência da política de saneamento financeiro foi que o Flamengo tem hoje mais de 30 patrocinadores de todos os tamanhos – a Caixa destina R$ 25 milhões/ano e a iFood, que retoma o convênio neste domingo, pagou R$ 500 mil em junho e julho. E pelo segundo ano seguido tem a marca mais valorizada do futebol brasileiro, o que representa mais chance de negócios e de obtenção de patrocínio, de acordo com estudo da BDO.

“O Flamengo conseguiu passar a arrebentação”, comparou o consultor da BDO Pedro Daniel. “Hoje passa credibilidade aos investidores. O valor da marca é consequência das ações tomadas, que tornam o Flamengo propício a negócios”.

Para a torcida, o lado bom também se já se vê em campo. Recentemente, o clube conseguiu contratar o meia Diego e o atacante Leandro Damião, com os quais gasta cerca de R$ 900 mil mensalmente. Sem sofrer. “O dinheiro (para pagar os dois) vem das receitas ordinárias do Flamengo. É tudo planejado. Se contratamos é porque podemos”, disse o presidente.

Hoje, o Flamengo, que não atrasa pagamento de salários desde 2013, tem folha estimada em R$ 7,5 milhões mensais. Com encargos, a folha pode atingir R$ 120 milhões este ano. Bandeira de Mello, no entanto, diz não haver segredo no processo de aprimoramento da gestão. “É só você respeitar o orçamento, só gastar o que arrecada e cumprir a previsão de fluxo de caixa. Enfim, cumprir as obrigações. Não tem nada estratosférico. É uma questão mais de princípios e de valores”, ensinou.