Shabu-shabu é um dos pratos preferidos dos sul-coreanos. Em uma panela com água fervendo são colocados carnes, verduras, legumes, cogumelos, frutos do mar, crustáceos, macarrão e vários tipos de temperos. O nome shabu-shabu vem do barulho da água e o resultado dessa mistura é um sabor ímpar.

Pois a receita do sucesso esportivo na Coreia do Sul é muito semelhante a um shabu-shabu. Desde 1966, o Comitê Olímpico do país resolveu reunir atletas de diversas modalidades em um único centro de treinamento. Se no shabu-shabu o gosto de cada alimento provoca uma explosão de sabores, a vivência em conjunto de diferentes tipos de esportistas transformou o Centro de Treinamento Nacional Taereung em uma fábrica de campeões. Todos os atletas que conquistaram mais de 200 medalhas olímpicas para o país nas últimas cinco décadas foram forjados no local.

Em um terreno de mais de 300 mil metros quadrados nas montanhas que cercam a capital Seul, estão 14 ginásios para a prática de 21 modalidades, além de 13 prédios de alojamento com capacidade para receber 468 pessoas, laboratórios, clínicas e refeitórios. Ali, os atletas têm tudo que precisam para se tornarem campeões olímpicos. Do alimento mais básico aos equipamentos de medicina esportiva mais sofisticados. O quadro de funcionários é composto por 140 pessoas. Uma média de quase três atletas para cada profissional.

Os sul-coreanos criaram em Taereung um sistema de formação que une técnica, estratégia e força. Com métodos de treinamento próprios, rigidez e disciplina, fizeram da troca de experiências entre as modalidades um diferencial.

“Decidimos concentrar todos os atletas em um único centro para que eles compartilhassem as mesmas instalações, equipes médicas e treinadores. Unimos esforços porque entendemos que esse é o caminho para obter bons resultados”, explicou Jong-Sam Choi, responsável pela administração de Taereung.

Quando a reportagem do jornal O Estado de S.Paulo visitou o local na última terça-feira, por exemplo, estavam treinando no mesmo horário, a poucos metros de distância, as equipes de judô, tae kwon do e levantamento de peso. Após a atividade, todos dividiram o mesmo refeitório.

Os números confirmam que os sul-coreanos acertaram em suas escolhas. Nas últimas três edições dos Jogos, o país ficou entre os 10 primeiros colocados no quadro de medalhas, algo que o Brasil nunca conseguiu. Em Londres-2012, os asiáticos surpreenderam e alcançaram a 5.ª posição. Para os Jogos do Rio, a meta é conquistar 10 ouros e terminar novamente entre os 10 melhores.

O sucesso de Taereung, porém, começa longe dos muros do centro de treinamento. A raiz do sistema esportivo está no trabalho de base, com a criação de programas que incentivam crianças a praticar esportes desde cedo.

Esse conceito ganhou impulso após os Jogos de Seul, em 1988. Assim, com maior oferta, ficou mais fácil selecionar futuros campeões. Para não desperdiçar talento e conseguir transformar potencial em resultado, a estratégia adotada foi estimular a concorrência, algo comum em outras áreas da sociedade sul-coreana. “Só os melhores dos melhores entram em Taereung. Nossos métodos de avaliação são bastante rígidos”, contou Choi.

“Já participei de treinamentos no exterior e percebi que há uma diferença enorme nas horas de trabalho em relação a nós. Aqui, treinamos manhã e noite, todos os dias. Mas cada gota de suor vale a pena”, disse Park Jong-Man, chefe da equipe de tae kwon do.

APOSTA – Ninguém no mundo ganhou mais medalhas olímpicas no tae kwon do do que a Coreia do Sul. Os sul-coreanos também têm resultados expressivos em outros esportes como esgrima, judô e tiro com arco. Em um país com uma área territorial semelhante ao Estado de Santa Catarina e 50 milhões de pessoas (25% do número de habitantes do Brasil), foi preciso fazer escolhas. E eles apostaram as suas fichas em esportes cujas disputas são individuais. “Optamos por esportes que custam menos. Modalidades coletivas são mais caras”, admitiu Choi.

A exceção é o handebol, que entre as mulheres já conquistou seis medalhas olímpicas. No Rio, os sul-coreanos também confiam no time feminino de vôlei. “Na última Olimpíada, não subimos no pódio por um fio. Agora, o foco está em conquistar uma medalha”, disse o técnico Lee Jung-Chul.

O bom momento do vôlei passa pela mudança de perfil e, sobretudo, estatura das atletas sul-coreanas. A atual geração é, em média, oito centímetros mais alta do que a anterior. A ponteira Kim Yeon-Koung, capitã da seleção, por exemplo, mede 1,92 metros.

Mas, a força do esporte sul-coreano não está apenas nos músculos ou na altura dos seus atletas. O poder também está na mente. O país possui um centro de pesquisa só para analisar o cérebro dos jogadores. Depois, uma equipe de médicos e psicológicos é responsável por aplicar os resultados desses estudos nos treinamentos realizados em Taereung.

“Concentração e respiração são fundamentais. A fração de 0,001 segundo pode mudar uma disputa. Nada é por acaso”, ensinou Kim Jin Goo, chefe do Centro de Medicina Esportiva da Universidade de Konkuk.