No tênis, o sucesso no juvenil nem sempre se repete no circuito profissional. E, quando acontece, pode levar anos para se concretizar. Nada disso, porém, se aplica a Cori Gauff. Coco, como é mais conhecida, parece não ter dificuldade em dar esse salto, mesmo com pouca idade. A norte-americana de apenas 15 anos surpreendeu o mundo do tênis nesta temporada e, a julgar pela preparação que realizou para 2020, quer brilhar ainda mais. Em sua pré-temporada, ela teve a companhia da ídola Serena Williams.
Coco despontou para o mundo em Wimbledon. Após furar o qualifying, enfrentou Venus Williams, outra grande referência, em sua estreia na chave principal. E ganhou. Para se ter noção do feito, a veterana de 39 anos já tinha dois troféus de Wimbledon em seu currículo quando Coco nasceu, em 2004. E a adolescente foi além: venceu mais duas partidas e só caiu nas oitavas de final. Foram seis vitórias seguidas, contando os duelos do qualifying. Ao mesmo tempo, a garota de 15 anos estudava e fazia provas a distância para sua escola, localizada na Flórida, onde mora.
Com estes resultados em Londres, tornou-se a mais jovem jogadora a disputar a chave principal de Wimbledon e uma das mais novas a vencer um jogo deste nível. Para efeito de comparação, Serena e Venus ganharam suas primeiras partidas de Grand Slam aos 16 anos. Em seu currículo, Coco tem como juvenil o título de Roland Garros de 2018, aos 14 anos – se tornou número 1 do mundo da categoria em seguida. Em 2017, tornou-se a mais jovem a jogar uma final juvenil do US Open, aos 13.
Para confirmar seu potencial, agora no profissional, Coco conquistou em outubro seu primeiro título de nível WTA na carreira, em Linz, na Áustria. O troféu a transformou na nona jogadora mais jovem campeã do circuito. Em um ano, ela subiu 801 posições no ranking, alcançando o 68º posto. É mais nova do Top 100 e do Top 200. E acumulou premiação US$ 538.103 (cerca de R$ 2,2 milhões) somente em 2019.
“Foi um ano louco”, admite a jovem tenista, que não esconde suas pretensões no circuito. Diz ela em sua descrição no Instagram, onde tem fotos com astros da NBA e com Michelle Obama: “Sou apenas uma criança que tem sonhos muito grandes”. Em entrevista ao jornal The Guardian, a fã de Rihanna, Beyonce e Jaden Smith confirma a ambição de chegar ao topo. “Meu pai sempre me diz: ‘Não se limite e coloque metas o mais alto possível’. Acho que é por isso que acredito tanto em mim e tudo que fiz, até agora, aos 15 anos, vem sendo ótimo.”
O pai de Coco, Corey Gauff, também é o seu treinador. Na juventude, jogou basquete pela Georgia State University e chegou a sonhar que sua filha seguisse o mesmo caminho. A mãe, Candi, foi ginasta antes de se destacar no atletismo universitário, em provas com barreiras e no heptatlo, na Flórida.
Além do apoio da família, Coco conta há alguns anos com o poderoso suporte de Patrick Mouratoglou, consagrado treinador de Serena. A jovem tenista treina durante boa parte do ano na academia dele localizada no sul da França. “Sempre vou lembrar da primeira vez que a vi, em 2014, quando veio à academia para fazer um teste. E me impressionou com sua determinação, força física e espírito de luta”, diz Mouratoglou. “Ela só tinha dez anos, mas já dava para sentir que era extremamente ambiciosa.”
Há dois anos, Coco passou a ser agenciada por Tony Godsick, o influente empresário de Roger Federer. O americano e o tenista suíço são sócios na agência Team8, focada em atletas de alto nível. Logo surgiram os primeiros patrocinadores de peso, como a italiana Barilla, que também apoia Federer.
“Ela sempre contou com uma boa estrutura ao seu redor, principalmente da academia do Mouratoglou. Mas o pai nunca desgrudou dela. Vai com ela a todos os torneios”, diz ao Estado Roberta Burzagli, capitã do Brasil na Fed Cup e treinadora de jovens atletas junto à Federação Internacional de Tênis. Nesta função, ela acompanhou de perto a trajetória de Coco no juvenil.
Dentro de quadra, Roberta diz que a americana sempre exibiu uma postura agressiva. “Ela sempre se posiciona em cima da linha para encurtar o tempo de devolução da adversária. Sempre toma a iniciativa dos pontos, indo à rede”, afirma. “Acho que o segredo dela é que, mesmo quando erra, mantém a mesma tática. Ela também tem o lado mental muito forte.”
A precocidade faz parte da trajetória da americana desde a infância. “Cori desde pequena sempre teve uma atitude muito madura dentro e fora da quadra, sempre foi muito focada. Uma atitude muito adulta para a idade. Mas nunca foi de muita conversa ou interação. Treinava, jogava e seguia em frente”, conta Roberta.
INFLUÊNCIAS – Em dezembro, Coco fez parte de sua pré-temporada na companhia de Mouratoglou e de Serena, que já se derrete pela jovem compatriota. “Acho que ela tem um talento inacreditável”, elogia a dona de 23 títulos de Grand Slam. E não hesita em ver semelhanças com a adolescente, que também é negra, precoce e de origem simples. “Eu a vejo trabalhando duro, treinando com o pai. Isso me lembra o tempo em que eu estava lá treinando com o meu pai.”
Os elogios e a proximidade por si só já são uma consagração para Coco. E não por acaso. Foi vendo Serena jogar e vencer a final do Aberto da Austrália de 2009 que a adolescente começou a se interessar por tênis. Tinha apenas quatro anos na época.
Agora ela pretende, naturalmente, seguir os passos da veterana. Mas garante não ter pressa para chegar ao topo. “Eu ainda não pensei sobre o próximo ano porque simplesmente nesta temporada conquistei coisas que só esperava obter provavelmente daqui a dois anos”, afirma Coco.