Quando janeiro chegou, a realidade bateu: é ano de Olimpíada. Para muitas modalidades, isso é sinônimo de expectativas, que significam anos de resultados que servem como uma espécie de base de dados. No basquete 3×3, não é bem assim que funciona. Ele existe oficialmente como esporte organizado há pouco mais de uma década. Fará parte do programa olímpico pela primeira vez na Olimpíada deste ano. Fazer prognósticos se torna complicado. Muita coisa pode acontecer, inclusive nada. Afinal, para poder falar de planos em Tóquio, é preciso primeiro garantir presença lá. A seleção feminina não tem mais chances. A masculina ainda tem uma: o torneio Pré-Olímpico, que acontece em março, na Índia.

“Não somos favoritos (a conquistar a vaga)”, diz o técnico da seleção, Douglas Lorite. “A expectativa é chegar nas quartas de final. Se estivermos num bom momento, bem condicionados, podemos chegar à semifinal ou até à final. Mas vamos precisar ‘ralar’ muito para chegar lá.”

Em Nova Délhi (Índia) o Brasil disputará três vagas com outras 19 equipes. No final das contas, podem ser quatro, já que um dos países já classificados é a Rússia, recentemente banida de competições por causa de doping. Décima-quarta colocada no ranking da FIBA, a seleção brasileira, que está no grupo A, vai se deparar, logo de cara, com dois adversários mais bem posicionados: – Mongólia (8ª) e Polônia (13ª). Turquia e Espanha completam o grupo A. O técnico Lorite aponta Eslovênia e Estados Unidos como os mais fortes candidatos às vagas olímpicas, mas a disputa pela terceira vaga está em aberto. O jogador Jefferson Socas, um dos seis atletas que estão treinando no Rio de Janeiro em busca de uma vaga no elenco do Pré-Olímpico, concorda com o técnico.

“Sabemos que vai ser difícil. Mas se quiserem ganhar da gente, vai ter que ser dentro de quadra. Não vai ser com o histórico de outros anos. Vão ter que ganhar naquele dia, naquela hora, naquela quadra”, afirma convicto.

Segundos antes, Socas, talvez intuitivamente, explicou em poucas palavras o porquê de outras equipes estarem supostamente à frente do Brasil.

“Eles têm jogadores e equipes que jogam o ano inteiro e vivem disso”, diz.

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 Basquete 3x3

Jefferson Socas busca uma vaga no elenco da seleção brasileira que vai disputar vaga no Pré-Olimpico –  Igor Santos/Agência Brasil

O próprio jogador é um exemplo peculiar disso. Em dezembro passado, Jefferson Socas recebeu do Comitê Olímpico Brasileiro o prêmio de Atleta do Ano no basquete 3×3. Acontece que nem ele pode dizer que o 3×3 é o foco único e indiscutível da carreira. Ele é atleta, mais especificamente ala-armador do Blackstar –  clube de Joinville (SC) -, equipe de basquete, digamos, convencional (a modalidade original 5×5). Em 2020, enquanto Soccas sonha com a Olimpíada na meia quadra, ele também integra o projeto do Blackstar de conquistar uma vaga no NBB. 

“Na hora que eles me contrataram, eu já falei que eu tinha um plano no 3×3. Eu gostaria de viver do 3×3 mas, infelizmente, no Brasil ainda é muito difícil. Eles entendem o meu lado e sabem que estando em alto nível no 5×5 ou no 3×3, participando de mais campeonatos estarei mais bem preparado”, revela.

Procurar a quadra maior foi a forma que Socas encontrou para dar vazão à paixão pelo esporte. Na seleção, existe um exemplo de outro caminho: jogar no exterior. Leandro Lima praticamente não atuou no Brasil, mas acumulou anos de experiência na liga japonesa e, atualmente, jogando na Suíça. Aos olhos dele, a diferença é perceptível.

“É outra organização. Estrutura de primeira linha. Nesse aspecto de profissionalismo, o Brasil ainda está bastante longe”, acredita.

 Basquete 3x3

Leandro Lima, atuamente jogando na Suiça, também acumulou anos de experiência na liga japonesa de basquete 3×3 – Igor Santos/Agência Brasil

Categorias de base trazem sangue novo e boas expectativas

Para alguns, o tom pode parecer um tanto pessimista, mas há avanços acontecendo. O técnico Douglas Lorite, que também é técnico da seleção sub-23 e assistente técnico da sub-18, relata que as categorias de base vêm alcançando um patamar que permite voos maiores. Em 2016, o Brasil foi prata na Copa do Mundo Sub-18. No ano passado, nos Jogos Mundiais de Praia, mais uma prata, desta vez com a seleção sub-23. Até por isso, a classificação ou não para Tóquio deve ser analisada num contexto de evolução dentro do que tem sido apresentado.

Igor Santos sobre Basquete 3x3

Douglas Lorite, técnico da seleção brasileira de basquete 3×3 que vai disputar o Pre-Olímpico em março, na Índia – Igor Santos/Agência Brasil


Dois dos convocados para o período de treinos no Rio estiveram na conquista da equipe sub-23 em 2019: Matheus Parcial e Fabrício Veríssimo. Fabrício também esteve na conquista da prata em 2016, quando foi nada menos que o MVP (jogador mais valioso) da competição. Os dois, com 22 e 21 anos respectivamente, são possíveis pilares para que o Brasil assuma cada vez mais protagonismo no 3×3 mundial. 

“Estamos preparando essa geração para chegar forte em busca da vaga para Paris, em 2024. É o nosso objetivo principal a longo prazo”, revela o técnico Douglas Lorite.

Fabrício admite que ainda tem a meta de ser uma estrela no 5×5. Mas uma vaga olímpica mudaria um pouco o cenário.

“Acredito que participar de uma Olimpíada é o sonho de todo atleta”, opina.

Já Matheus se considera completamente entregue ao 3×3.

“Foi a modalidade que me deu uma oportunidade e hoje em dia eu abraço com tudo”, diz.

 Basquete 3x3

 Matheus Parcial e Fabrício Veríssimo estiveram na conquista da equipe de basquete 3×3 sub-23 em 2019 – Igor Santos/Agência Brasil

Matheus assinou recentemente com o São Paulo DC, atual campeão brasileiro e uma das pouquíssimas equipes que consegue oferecer uma estrutura profissional para um atleta de 3×3 no Brasil. Mas é preciso que mais portas se abram se o objetivo é realmente criar uma cultura vencedora e, consequentemente, fortalecer também a seleção. Atualmente, a quantidade de eventos que um país organiza vale pontos no ranking, então quanto mais campeonatos acontecendo melhor para o país. Em breve, isso vai mudar e o ranking vai se tornar cada vez mais competitivo e baseado em performance. Como ser melhor? Participando do maior número possível de campeonatos. 

Talvez isso se reflita numa projeção mais otimista de classificação à Olimpíada nos próximos ciclos. É o que a nova geração espera. Se não for em 2020, que 2024 seja o ano em que eles possam mostrar que valeu a pena insistir na modalidade.

“Eu e Fabricio saímos de comunidades carentes, ele de Cachoeiras de Macacu e eu da Chatuba, em Mesquita (Baixada Fluminense). Viemos de projetos sociais. Chegar ao nível de jogar uma Olimpíada representaria muito não só para o Brasil, mas para todas essas pessoas que vêm lá de onde fomos criados”, acredita Matheus.


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