O ex-presidente Fernando Collor não se emenda. Não bastasse repetir erros do passado, sofistica seus crimes. Em 1992, o então presidente era acusado de ter um Fiat Elba, avaliado em R$ 5 mil, pago com cheque fantasma do ex-tesoureiro PC Farias. Teve que deixar o governo sobre uma saraivada de denúncias de corrupção. Agora, quase três décadas depois, está sendo denunciado no Supremo Tribunal Federal (STF) pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa por suspeita de ter recebido R$ 29 milhões em propinas da BR Distribuidora, empresa da Petrobras, no período de 2010 a 2014. Com esse dinheirão, ele comprou imóveis e vários carros de luxo, como Lamborghini, Ferrari, Bentley e Range Rover. Os veículos chegaram a ser apreendidos, mas foram devolvidos em seguida para que ele faça a manutenção dos automóveis. Uma grande evolução para quem caiu pela primeira vez por causa de um carro que hoje seria uma carroça. A única coisa semelhante em sua trajetória é que agora ele também pode perder o cargo, mas o de senador. E, desta vez, pode até ser condenado à prisão.

Malas de dinheiro

O segundo ato de sua carreira de malfeitos começou a ser encenado na última terça-feira 22, quando a Segunda Turma do STF decidiu, por unanimidade, aceitar a denúncia formulada contra ele pela Procuradoria-Geral da República (PGR), numa ação penal em que virou réu. Além dele, viraram réus outros dois auxiliares do senador, os amigos Pedro Paulo Bergamaschi Leoni Ramos e Luis Eduardo Amorim, seu braço direito na TV Gazeta de Alagoas, retransmissora da Rede Globo. Collor passou a ser o quarto senador no exercício do mandato a responder a ações penais no STF por corrupção. Completa o time Renan Calheiros (PMDB-AL), Gleisi Hofmann (PT-PR) e Valdir Raupp (PMDB-RO).

As investigações contra Collor começaram em fevereiro de 2015, depois que o doleiro Alberto Youssef disse, em delação premiada, que entregou diversas malas de dinheiro ao senador em sua casa em Maceió. De acordo com as investigações, o ex-presidente recebeu propinas de R$ 29 milhões envolvendo negócios da BR Distribuidora e a empresa Derivados do Brasil, na troca de bandeira de postos de gasolina e também em subornos resultantes de quatro contratos de construção de bases de distribuição de combustíveis realizados entre a BR Distribuidora e a UTC Engenharia. Em julho de 2015, a PF fez a operação Politeia, como parte da Lava Jato no STF, e apreendeu vários carros de luxo na Casa da Dinda, a mansão de Collor em Brasília. Em agosto, ele foi denunciado pelo procurador-geral Rodrigo Janot, mas o processo ficou sob sigilo. Só em outubro do ano passado a denúncia foi tornada pública.

Ao aceitar a denúncia de Janot, os cinco ministros da Segunda Turma do STF disseram que as acusações não estão amparadas apenas em depoimentos de delações premiadas, como alegam os advogados do ex-presidente. “Há inúmeros outros indícios que reforçam as declarações prestadas pelos colaboradores, tais como dados bancários, depoimentos, informações policiais e documentos, o que bastam neste momento, em que não se exige juízo de certeza acerta de culpa”, explicou o ministro Edson Fachi, relator do processo. A decisão de Fachin foi acompanhada pelos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Celso de Mello. No escândalo em 1992, Collor ficou inelegível por oito anos e depois voltou à política. Não se corrigiu.

A primeira vez ninguém esquece

> Em março de 1992, o então presidente da República, Fernando Collor, foi denunciado por vários crimes, alguns deles relatados por seu irmão Pedro Collor, já falecido

> O Congresso abriu uma CPI contra ele em maio desse ano. O dinheiro de seu tesoureiro PC Farias financiou contas do então presidente, como reformas na sua mansão, a Casa da Dinda, em Brasília

> Em entrevista à ISTOÉ, o motorista Eriberto França disse que contas pessoais de Collor eram pagas por empresas fantasmas de PC Farias

> A CPI comprovou que US$ 6,5 milhões de PC pagaram despesas pessoais de Collor

> Mas o que derrubou o ex-presidente mesmo foi o fat

o do dinheiro sujo de PC ter pago um Fiat Elba, em nome de Collor. O carro valia R$ 5 mil (hoje, atualizado, valeria R$ 16 mil)

> Para não ser cassado pelo Senado, Collor renunciou em 29 de dezembro de 1992. Teve os direitos políticos suspensos por oito anos