ROMA, 28 JUL (ANSA) – Uma camiseta bordô com a escrita “Cinema America Trastevere”. Essa simples peça de roupa, símbolo da mobilização de jovens em defesa da cultura e da luta contra a degradação urbana, virou motivo de ataques de neofascistas na Itália.   

A camiseta é usada pelos membros da associação “Piccolo America”, que faz sessões gratuitas de cinema ao ar livre em Trastevere, tradicional bairro boêmio de Roma, mas também em outras áreas da capital, como o distrito litorâneo de Ostia, que sofre com a criminalidade organizada.   

No último mês de junho, no entanto, quatro integrantes da entidade foram espancados nas ruas de Roma por militantes de extrema direita, que acusam o projeto de ser “antifascista”. A violência voltou a se repetir no último sábado (27), quando um pesquisador de 33 anos, Francesco, foi agredido por usar a camisa do “Cinema America” em Frosinone, cidade situada a 90 quilômetros de Roma.   

O crime ocorreu durante um show beneficente, e Francesco teve sua camiseta rasgada. “Deixei meus amigos para ir no banheiro, e na fila tinha um homem de uns 30 anos. Não o conhecia, e ele não usava símbolos de extrema direita. Era um rapaz ‘normal’, não falou de política”, disse o pesquisador à ANSA, falando sobre um de seus agressores.   

“Ele me pediu para entregar a camiseta, e eu me recusei.   

Afastei-me para evitar que a provocação degenerasse”, acrescentou. Neste momento, no entanto, outros dois homens se aproximaram, e o grupo agrediu Francesco quando ele voltava para o show. “Acho que não deveria ser perigoso vestir uma camiseta”, afirmou. Segundo o pesquisador, o modus operandi foi semelhante ao ataque de Roma, quando os agressores “acusaram” as vítimas de “antifascismo”.   

História – A associação foi fundada em 2012, quando um grupo de estudantes da periferia de Roma decidiu ocupar o edifício do histórico “Cinema America”, em Trastevere, que estava sob ameaça de demolição para dar lugar a estacionamentos e prédios residenciais.   

Os jovens reestruturaram o imóvel e, com apoio dos moradores do bairro, passaram a oferecer sessões de cinema gratuitas e debates que tiveram a presença de diretores como Nanni Moretti e Paolo Sorrentino.   

A ocupação durou até 2014, quando os proprietários pediram a reintegração de posse do cinema. Os estudantes, no entanto, conseguiram arrumar um novo espaço e, em outubro de 2018, formalizaram um contrato de concessão para revitalizar outro cinema, o Troisi.   

Enquanto isso, passaram a oferecer sessões a céu aberto em uma praça de Trastevere. Em nenhum momento a associação levantou bandeiras contra o fascismo, apenas em defesa da liberdade, da cultura e da vida em comunidade.   

O líder do Partido Democrático (PD) e governador do Lazio, Nicola Zingaretti, de centro-esquerda, afirmou que as agressões se devem à postura do ministro do Interior e vice-premier da Itália, Matteo Salvini, que “dissemina o ódio”. “Devemos contrapor à aliança do ódio uma aliança das pessoas boas e que acreditam em um futuro de desenvolvimento e solidariedade”, declarou.   

Salvini ainda não comentou a nova agressão contra o “Cinema America”. Em junho passado, no entanto, após os primeiros ataques, ele havia defendido “tolerância zero para os violentos”.(ANSA)