Cientistas denunciam distorção de dados em relatório climático do governo americano

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O relatório descreve os argumentos que levaram o governo do presidente Donald Trump a reverter esta semana uma decisão de 2009 que regulava as emissões de gases do efeito estufa Foto: REUTERS/Kent Nishimura

Cientistas indicaram nesta quinta-feira (31) à AFP que alguns de seus estudos foram citados indevidamente em um relatório do Departamento de Energia dos Estados Unidos para minimizar o papel da atividade humana no aquecimento global.

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O relatório, publicado em 29 de julho, descreve os argumentos que levaram o governo do presidente Donald Trump a reverter esta semana uma decisão de 2009 que regulava as emissões de gases do efeito estufa, minando ainda mais a luta contra a mudança climática nos Estados Unidos.

O documento foi escrito por um grupo de trabalho que inclui John Christy e Judith Curry, antes vinculados ao Heartland Institute, um grupo que frequentemente se opõe ao consenso científico sobre a mudança climática.

O relatório “distorce completamente o meu trabalho”, declarou à AFP Benjamin Santer, cientista climático e professor honorário da Universidade de East Anglia no Reino Unido.

Santer afirmou que uma seção do relatório sobre o “esfriamento estratosférico” contradizia suas conclusões.

A AFP e outros meios de comunicação, entre eles o site americano NOTUS, encontraram citações imprecisas, análises erradas e erros editoriais no relatório.

Esta é a terceira vez desde janeiro, quando Trump assumiu a presidência, que cientistas declaram à AFP que uma agência governamental distorceu trabalhos acadêmicos para respaldar suas políticas.

Em maio, a Casa Branca teve que modificar um relatório sobre doenças que afetam jovens americanos, inicialmente baseado em estudos científicos inexistentes.

“Me preocupa que uma agência governamental tenha publicado um relatório destinado a informar o público e orientar políticas sem se submeter a um rigoroso processo de revisão por pares, ao mesmo tempo que mal interpreta numerosos estudos que sim o fizeram”, declarou à AFP Bor-Ting Jong, professora adjunta da Universidade Livre de Amsterdã.

Jong afirmou que o artigo contém afirmações falsas sobre o modelo climático que sua equipe examinou e utiliza uma terminologia diferente, o que levou a uma análise errada de seus resultados.

James Rae, pesquisador sobre o clima da Universidade de St. Andrews na Escócia, declarou à AFP que a mudança na forma como o Departamento de Energia utiliza a pesquisa científica “é realmente alarmante”.

“O Departamento de Energia esteve na vanguarda da ciência durante décadas. Este relatório parece um exercício de estudante de graduação destinado a distorcer a ciência do clima”, afirmou.

Procurado pela AFP, um porta-voz do Departamento de Energia assegurou que o relatório foi revisado internamente por cientistas e especialistas em políticas públicas.

O público terá agora a possibilidade de formular comentários sobre o documento antes de sua publicação final no registro federal.